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URBANIDADE
Rodando a bolsa na rua
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
A atriz Adriana Bruno estava no limite do desespero.
Além de uma crise no casamento, os projetos teatrais não saíam
do papel e faltava-lhe dinheiro
para pagar as contas. Até que
ouviu um alto-falante, instalado
num Fusquinha caindo aos pedaços que passava na frente de
sua casa, anunciando pamonha.
Teve a idéia, então, de sair vendendo, dentro de um automóvel,
as bolsas de panos que vinha
aprendendo a fazer. O problema
é que seu Fusquinha fora roubado dois meses antes. Foi salva,
então, pelos restos de seu sonho
de teatro mambembe: um pequeno ônibus que conduzia o
grupo de atores, agora enferrujado e sem uso. "Pensei que fora da
vida de atriz seria profundamente infeliz", conta Adriana.
Por ser filha de militar, Adriana mudava sempre de cidade.
Veio para São Paulo, onde estudou artes cênicas, na USP. Continuou em movimento, desta vez
fazendo das ruas seus cenários
como atriz do grupo Farândola.
Mas, no final do ano passado, os
projetos não prosperavam e, sem
alternativa, lançou mão provisoriamente de sua habilidade de
desenhar figurinos. A mãe lhe
emprestou R$ 100 para comprar
panos na 25 de Março. "Com esses R$ 100 ganhei R$ 300." Sua
clientela era limitada às amigas
e às amigas das amigas. "Precisava ir mais longe."
Quando estava em busca de
uma solução, passou o Fusca
vendendo pamonha -"logo fiquei triste com a lembrança do
meu fusca roubado"-, mas, ao
mesmo tempo, lembrou-se do
pequeno ônibus, herança do
"Farândola", e decidiu transformá-lo numa loja mambembe,
transparente e repleta de cores.
Faltava um detalhe. "Não tinha
carta para dirigir ônibus e meu
projeto ficou esperando." Amigos aconselhavam Adriana a tomar muito cuidado e lembravam todas as burocracias de um
negócio. "Alguma solução tem
de existir", respondia, insegura,
mas sem alternativa.
Neste ano, ela, literalmente, pisou no acelerador e saiu dirigindo pelas ruas, parando em pontos movimentados, como a praça Benedito Calixto. Muita gente
entra na loja, batizada de Maria
Berenice, apenas atraída pelo
exotismo do veículo. Mas o marketing motorizado funcionou.
"Comecei a ser procurada por lojistas que queriam minhas bolsas." Há alguns dias, Adriana recebeu sinais de que a sua ousadia estava dando resultados.
Não tinha mais produtos e estava à procura de uma funcionária para ajudá-la na confecção
das bolsas -esse empreendedorismo a faz um personagem sintético da cidade de São Paulo,
que hoje completa 452 anos, feita
de migrantes e imigrantes.
@ - gdimen@uol.com.br
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