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SAÚDE
2,5 milhões podem descobrir diabetes
AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Cerca de 2,5 milhões de brasileiros terão um motivo importante
para não esquecer estas semanas
de março. Ao longo deste mês,
eles receberam ou estarão recebendo a notícia, ainda preliminar,
de que são diabéticos. Estima-se
que metade desse contingente
nem desconfiasse que era portador da doença.
Passado o susto da má notícia, a
maioria vai constatar que seria
muito pior se não tivesse feito o
teste e não fosse informado do resultado. Diagnosticado no início e
devidamente tratado, o diabetes
pode ser controlado. No caso contrário, a doença fará estragos graves quando aparecer, podendo
provocar derrames, amputações,
cegueira e problemas cardíacos.
Furo no dedo
Reduzir os danos dessa "doença
silenciosa" é o propósito da campanha do Ministério da Saúde iniciada no último dia 6 e que se encerra na próxima sexta-feira.
Os números, por enquanto, são
apenas estimativas. Ao planejar a
campanha, estendida às cerca de
30 mil unidades de saúde do país,
o ministério estimou que 30 milhões de brasileiros fariam o exame de glicemia capilar. Desses, estimava-se, 2,5 milhões irão descobrir que estão com a doença ou
confirmarão um diagnóstico já
feito anteriormente.
Os números dessa fase devem
ser consolidados dentro de 15
dias. Nos próximos dois meses, os
que tiveram a glicemia alterada
no teste capilar -uma gota de
sangue retirada do dedo- serão
submetidos a exames de sangue
confirmatórios.
Duas Campinas
O novo desafio estará então começando. As unidades básicas de
saúde deverão estar preparadas
para receber esse novo contigente
de diabéticos, equivalente a mais
de duas vezes e meia a população
de Campinas, em São Paulo.
Ana Luiza Vilasboas, coordenadora da Campanha Nacional de
Diabetes, diz que o SUS tem infra-estrutura para esse atendimento.
Segundo ela, medicação e insumos -como fitas e aplicadores
de insulina- já estão previstos
no orçamento. Além das 30 mil
unidades de saúde -que receberão aparelhos glicosímetros para
medir a glicose no sangue-, cerca de 38 milhões de pessoas já estão sendo acompanhadas pelo
Programa de Saúde da Família.
Ainda falta um treinamento
adequado dos profissionais, que
também está sendo anunciado
como parte da campanha. Segundo o ministério, 5.500 multiplicadores municipais estão sendo
treinados para atualizar cerca de
40 mil profissionais da rede básica
em todo o país.
Lei paulista
Na prática, a realidade não é tão
animadora. "O SUS não coloca à
disposição todos os tipos de insulina e muitas cidades não recebem
nenhum dos tipos", diz Lilian
Fanny de Castilho, diretora-executiva da Anad, Associação Nacional de Assistência ao Diabético. Com uma rede de pacientes
em todo o Estado de São Paulo e
contatos com associações de muitas regiões, a Anad é um dos muitos "olhos" das entidades de pacientes diabéticos.
Foi uma dessas entidades, a
ADJ, Associação de Diabetes Juvenil, que mais batalhou para a
aprovação de uma lei na Assembléia Legislativa de São Paulo que
garantisse atendimento, medicamentos e insumos aos diabéticos.
A lei 10.782-01, cujo projeto é de
autoria do deputado Roberto
Gouveia (PT), foi sancionado pelo
governador Geraldo Alckmin
(PSDB) no último dia 9.
Pela lei, o SUS deve garantir medicamentos e insumos para o autocontrole -glicosímetros e fitas- e auto-aplicadores de insulina. Significa que cada paciente
dependente de insulina terá direito a um aparelho medidor de glicose (custo entre R$ 100 e R$ 200)
e fitas para os testes, que consomem cerca de R$ 60 a R$ 90 por
mês. Um grupo a ser coordenado
pela Secretaria de Estado da Saúde, com participação de entidades
e usuários, deverá detalhar a lei
numa "norma técnica". Amanhã,
membros da ADJ se reúnem com
representantes da secretaria para
a criação do grupo de trabalho.
"Oferecer condições para que o
paciente e sua família tenham autonomia no controle e tratamento
do diabetes é a forma mais barata
de evitar os altíssimos custos da
doença", diz Gouveia.
Em 1999, o SUS gastou R$ 33
milhões com internações decorrentes de complicações com o
diabetes. Só no Estado de São
Paulo, a ADJ estima que 6.000 diabéticos em diálise consumam
quase R$ 1.000 por mês, cada um,
apenas no processo de filtragem
do sangue. É apenas a ponta do
iceberg. Os Estados Unidos estimam em US$ 130 bilhões por ano
as perdas com tratamento e custos indiretos dessa doença.
A etapa de atenção integral ao
diabético, que além de medicamentos e equipamentos exige
profissional de saúde preparado,
só está começando agora. É a que
deve exigir mais empenho e cooperação entre municípios, Estados, ministérios e entidades. Os
coordenadores da campanha estimam que 65% dos "novos" diabéticos serão acompanhados pela
rede de atenção básica, 30% em
ambulatórios especializados e 5%
em serviços de alta complexidade.
Diagnóstico e tratamento
O consenso de que "pouco
adianta diagnosticar sem tratar" é
defendido por todas as associações envolvidas com a questão.
Essa tem sido uma das bandeiras
do médico Fadlo Fraige Filho, que
comanda a Federação Nacional
das Associações de Diabéticos.
Também tem sido o pensamento da Sociedade Brasileira de Diabetes (SDB), dirigida pela médica
Adriana Costa e Forti, e pelas sociedades de Hipertensão Arterial,
Cardiologia e Nefrologia.
"O diagnóstico ainda não é levado a sério, nem por pacientes nem
por médicos", diz Jorge Gross,
professor titular de endocrinologia da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul e ex-presidente
da SDB. Segundo ele, foi na sua
gestão, e com a participação de
uma dezena de entidades, que se
iniciou a preparação da campanha agora em andamento.
"Confirmado o diagnóstico, o
paciente terá de ser acompanhado por profissionais treinados, do
contrário todos vamos pagar caro
por isso", afirma Gross. "O grande nó na luta contra o diabetes está no atendimento pós-diagnóstico. Tem médico que diz, "é apenas
uma glicosisinha elevada". Pois
essa glicosisinha é como cupins,
que vão atacando por dentro."
Pelos números internacionais,
confirmados por um censo ainda
de 1989, cerca de 7,6% dos brasileiros entre 30 e 69 anos são portadores de diabetes. Somariam quase 6 milhões, que devem saltar para 11,6 milhões em 2025.
Desses totais, 10% correspondem ao diabetes juvenil, ou do tipo 1, que exige uso de insulina
desde o início. Os outros são do tipo 2, ou Mellitus, que costuma
aparecer depois dos 40 anos e decorre muitas vezes da obesidade e
do sedentarismo. Por ano, os dois
tipos de diabetes matam cerca de
25 mil brasileiros.
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