São Paulo, Quinta-feira, 25 de Novembro de 1999


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INCULTA & BELA

Sem vírgula é mais caro

PASQUALE CIPRO NETO
Colunista da Folha

Conhece aquela piada do dentista? O cartaz anunciava: "Com dor, R$ 40,00; sem dor, R$ 20,00". O cliente, é óbvio, escolhe o tratamento sem dor, mais barato. O dentista começa a trabalhar sem aplicar anestesia. A vítima urra de dor. Impávido, o tira-dentes sentencia: "Não pode gritar. Com dor é mais caro". Pois o texto publicitário de uma máquina fotográfica anda pelo mesmo caminho: "Com XX é fácil fotografar. E pagar mais ainda". É claro que se deduz o sentido pretendido, mas nada impede que se entenda que: a) com a máquina XX é fácil fotografar; b) pagar mais ainda também é fácil. Uma vírgula (quem diria?!) simplesmente muda tudo. Veja: "Com XX é fácil fotografar. E pagar, mais ainda". Temos aí a vírgula que marca a elipse do verbo. No caso, o que se subentende é a forma verbal "é": "E pagar é mais fácil ainda". A orientação é simples: no lugar do verbo, a vírgula. Essa vírgula, no caso, é obrigatória, já que evita a indesejável ambiguidade. Nos casos em que não há o risco do duplo sentido, não há consenso entre os gramáticos quanto à obrigatoriedade da vírgula. O professor Celso Luft, por exemplo, em seu "A Vírgula", chega a ironizar Celso Cunha e Rocha Lima, que dão essa vírgula como obrigatória. Ele, Luft, diz que a vírgula só é "obrigatória em casos de ambiguidade". Apesar de todo o respeito que o grande Celso Luft merece, não penso que Celso Cunha e Rocha Lima mereçam a desfeita. Luft dá como igualmente boas as seguintes pontuações: "O pai se chamava Rodrigo Bastos; a mãe, Ana da Silva"; "O pai se chamava Rodrigo Bastos, a mãe Ana da Silva". Em termos estatísticos, no entanto, Luft está com a minoria. O que mais se cita, com os devidos exemplos tirados do universo culto da língua, é que essa vírgula que substitui o verbo implícito é de lei. Um aspecto sobre o qual não há discordância e que merece ser citado é o do ponto-e-vírgula que separa as orações, considerado obrigatório quando se emprega a vírgula que marca a elipse do verbo: "Sou gremista; eles, colorados"; "Nós preferimos cinema; eles, teatro". No lugar do ponto-e-vírgula, também se pode usar o ponto final: "Eu trabalho com fatos. Você, com hipóteses". É isso.


Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail: inculta@uol.com.br


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