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INCULTA & BELA
Sem vírgula é mais caro
PASQUALE CIPRO NETO
Colunista da Folha
Conhece aquela piada do
dentista? O cartaz anunciava:
"Com dor, R$ 40,00; sem dor,
R$ 20,00". O cliente, é óbvio, escolhe o tratamento sem dor,
mais barato. O dentista começa a trabalhar sem aplicar
anestesia. A vítima urra de
dor. Impávido, o tira-dentes
sentencia: "Não pode gritar.
Com dor é mais caro".
Pois o texto publicitário de
uma máquina fotográfica anda pelo mesmo caminho:
"Com XX é fácil fotografar. E
pagar mais ainda". É claro que
se deduz o sentido pretendido,
mas nada impede que se entenda que: a) com a máquina
XX é fácil fotografar; b) pagar
mais ainda também é fácil.
Uma vírgula (quem diria?!)
simplesmente muda tudo. Veja: "Com XX é fácil fotografar.
E pagar, mais ainda". Temos
aí a vírgula que marca a elipse
do verbo. No caso, o que se subentende é a forma verbal "é":
"E pagar é mais fácil ainda". A
orientação é simples: no lugar
do verbo, a vírgula.
Essa vírgula, no caso, é obrigatória, já que evita a indesejável ambiguidade. Nos casos em
que não há o risco do duplo
sentido, não há consenso entre
os gramáticos quanto à obrigatoriedade da vírgula. O professor Celso Luft, por exemplo, em
seu "A Vírgula", chega a ironizar Celso Cunha e Rocha Lima,
que dão essa vírgula como
obrigatória. Ele, Luft, diz que a
vírgula só é "obrigatória em
casos de ambiguidade". Apesar
de todo o respeito que o grande
Celso Luft merece, não penso
que Celso Cunha e Rocha Lima
mereçam a desfeita.
Luft dá como igualmente
boas as seguintes pontuações:
"O pai se chamava Rodrigo
Bastos; a mãe, Ana da Silva";
"O pai se chamava Rodrigo
Bastos, a mãe Ana da Silva".
Em termos estatísticos, no
entanto, Luft está com a minoria. O que mais se cita, com os
devidos exemplos tirados do
universo culto da língua, é que
essa vírgula que substitui o verbo implícito é de lei.
Um aspecto sobre o qual não
há discordância e que merece
ser citado é o do ponto-e-vírgula que separa as orações, considerado obrigatório quando se
emprega a vírgula que marca a
elipse do verbo: "Sou gremista;
eles, colorados"; "Nós preferimos cinema; eles, teatro".
No lugar do ponto-e-vírgula,
também se pode usar o ponto
final: "Eu trabalho com fatos.
Você, com hipóteses". É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail: inculta@uol.com.br
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