|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
ANÁLISE
Cenário de beleza, Rio mantém a saga de ser a síntese do país
UPPs VIERAM COMO
ALTERNATIVA AO
TRÁFICO E FORAM
ACOLHIDAS PELOS
MORADORES. ATÉ
QUE INCOMODADOS
RESOLVERAM DAR A
RESPOSTA
|
ALBA ZALUAR
ESPECIAL PARA A FOLHA
O Rio de Janeiro é uma cidade de belos cenários, mas
vulnerável por causa dos
seus portos e aeroportos, onde contrabandistas, militares
e policiais corruptos fazem a
festa dos traficantes sempre
em guerra entre si ou com a
polícia. Armas, munições e
drogas entram muito facilmente na cidade.
Há também o cenário de
nenhuma beleza que a natureza não criou. Já virou lugar-comum dizer que bairros e favelas onde moram pessoas
de estratos sociais marcados
pela baixa renda, baixa escolaridade, famílias chefiadas
por mulheres, com altas taxas de gravidez na adolescência, são bairros onde se
encontram os jovens vulneráveis às atrações do tráfico.
E este há muito tempo virou
sinônimo guerra.
Nesse cenário sem beleza
social, a lógica da guerra foi
se expandindo entre os jovens vulneráveis, que passaram a andar armados para
evitar ser vítimas dos pares
igualmente armados e para
gozar do prestígio adquirido
pelas armas.
Com o agrave de que, na
guerra, sentem-se na obrigação de ajudar quando as quadrilhas e seus comandos forem ameaçados.
Dessa ajuda depende
o conceito ou a consideração
que terão com os "donos
do morro" e o orgulho de serem capazes de destruir fisicamente todo e qualquer rival encarado como inimigo
mortal.
Antes, a guerra principal
era entre os comandos de tráfico, hoje, há um inimigo comum, que é a policia e sua
nova política de segurança.
Para piorar a situação dos
traficantes na cidade, cada
vez é maior o número de favelas dominadas por milícias, nome genérico que pode se referir a simples vizinhos vigilantes ou a quadrilhas organizadas de policiais, militares, bombeiros,
alguns ex, que passaram a se
oferecer como mantenedores
da segurança nos locais
cheios de vulnerabilidades
sociais e falhas do poder
público.
As UPPs vieram a ser apresentadas como uma alternativa para os comandos do tráfico e as milícias nas mil favelas hoje existentes. E foram
acolhidas pelos moradores e
o seu entorno.
O preço dos imóveis aumentou, as pessoas tinham o
seu ir e vir assegurado, não
se viam mais jovens armados
de fuzis e metralhadoras, não
se ouvia mais tiro.
Até que os incomodados,
que se mudaram para outras
favelas e cidades, resolveram
dar uma resposta a essa grave ameaça aos seus domínios. E começaram a aterrorizar os moradores de toda a cidade dos cenários maravilhosos e dos contextos sociais horripilantes.
Assim, o Rio continua a
sua saga de ser a síntese deste pais, também abençoado
pela natureza, mas com muito a dever aos seus habitantes. Até quando?
ALBA ZALUAR, antropóloga, é
coordenadora do Núcleo de Pesquisa em
Violências da Uerj (Universidade do Estado
do Rio de Janeiro)
Texto Anterior: Setor de turismo teme perda a médio prazo Próximo Texto: Pasquale Cipro Neto: Perfeito e imperfeito Índice | Comunicar Erros
|