São Paulo, domingo, 26 de julho de 1998

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REMÉDIOS FALSOS
Informado em janeiro, órgão federal chegou a avisar secretaria estadual sobre Androcur falso só em julho
Vigilância perde meses para divulgar fraude

RANIER BRAGON
em Belo Horizonte


A Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde demorou meses para comunicar alguns Estados de que havia um lote falso do remédio Androcur sendo vendido em larga escala no país.
Por conta disso, a localização e apreensão de frascos falsificados foi adiada, enquanto doentes de câncer na próstata tomavam medicamento que, em lugar do princípio ativo, trazia apenas um composto de farinha. Há suspeita de que pelo menos oito pacientes tiveram sua morte acelerada pelo uso de comprimidos inócuos.
Em alguns casos, como o do Rio, não há registro de que o alerta sobre a falsificação tenha sequer sido feito pelo governo federal. No Amazonas, só este mês chegou comunicado sobre a falsificação -o que demonstra que os problemas da Vigilância Sanitária vão além da dupla função exercida por funcionários, que gerou a substituição da secretária Marta Nóbrega.
O laboratório Schering do Brasil (não confundir com a Schering-Plough), que fabrica o Androcur, recebeu a primeira denúncia sobre falsificação do remédio em janeiro, vinda de um paciente do Rio. Constatou que os frascos falsos eram do lote 351, que nunca produziu, e que aqueles comprimidos não serviam para nada.
A empresa afirma que notificou a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária no dia 27 de janeiro.
Em Minas Gerais, a notícia só chegou em 16 de fevereiro e não por comunicado federal. Segundo o superintendente da Vigilância Sanitária de Minas Gerais, Júlio César Siqueira, o órgão ficou sabendo da falsificação graças a um alerta da Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul.
O governo gaúcho havia descoberto a fraude ao receber comunicado da Schering em 12 de fevereiro e constatar que, cinco dias antes, havia recebido 7.500 frascos fraudados, comprados da distribuidora Ação, de Belo Horizonte.
A Secretaria da Saúde gaúcha ainda se deu ao trabalho de informar a fraude ao ministério no dia seguinte, pedindo o número do registro do remédio. Segundo Marinon Porto, secretário da Saúde, a resposta desse ofício chegou após um mês -em 13 de março.
O Paraná também ficou sabendo do lote falso pela Schering, no dia 28 de fevereiro. A comunicação da Vigilância Sanitária nacional só chegou em março-a assessoria de imprensa da Secretaria da Saúde paranaense não soube precisar a data exata.
No Amazonas, a notícia sobre falsificação chegou primeiro pelos jornais. Só no dia 8 de julho a Susam (Superintendência de Saúde do Amazonas) recebeu da Coordenadoria de Controle de Qualidade do Ministério da Saúde uma lista de 65 produtos que vêm sendo falsificados no país. Entre eles estava o Androcur, segundo Castelo Branco, assessor da Susam.
A Vigilância Sanitária de Campo Grande (MS) recebeu a ordem de apreensão do lote falsificado mais de três meses depois (dia 8 de maio) de a Vigilância Sanitária federal ter sido informada do caso.
O chefe da Vigilância Sanitária municipal, Antônio Carlos Cardoso, disse que, a exemplo de outros casos do gênero, a ordem de apreensão foi enviada primeiro à Vigilância Sanitária da Secretaria de Estado de Saúde, que se encarrega de repassar o comunicado às prefeituras onde há Vigilância municipal em funcionamento.
Em São Paulo, a Schering avisou em 28 de janeiro a Vigilância estadual, que só tomou providências duas semanas depois.

Outro lado

A Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária e o Ministério da Saúde foram procurados de quarta a sexta-feira, mas não se pronunciaram sobre a demora na difusão da informação sobre o Androcur falso.


Colaboraram a Agência Folha, a Sucursal do Rio e a Reportagem Local



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