São Paulo, sábado, 27 de julho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para delegado, tráfico matou sambista

Marco Antonio Rezende/Folha Imagem
Amigos cantam e choram durante o enterro do sambista Macarrão


DA SUCURSAL DO RIO

O delegado Juber Baesso, que investiga o assassinato do diretor de bateria da escola de samba Império Serrano, Antônio Carlos Soares de Araújo, o Macarrão, disse ontem "não ter mais dúvidas" de que o crime foi praticado por traficantes do morro da Serrinha, em Madureira (zona norte do Rio de Janeiro).
Macarrão foi capturado e morto a tiros na noite de quarta-feira na Serrinha, quando tinha acabado de sair de uma reunião na associação de moradores, da qual era vice-presidente. Os assassinos obrigaram um motorista de táxi a transportar o corpo para fora da favela. Ele tinha 47 anos.
Segundo o delegado, as investigações iniciais indicam que Macarrão estava "batendo de frente" com traficantes ligados a Irapuan David Lopes, o Gangan, chefe do tráfico na favela. Dono também das bocas-de-fumo dos morros da Coroa e de São Carlos (zona central), Gangan é apontado como um dos principais integrantes do TC (Terceiro Comando).
Baesso disse ter recebido a informação de que Macarrão teria proibido os traficantes de esconderem drogas na associação. Ele disse ainda que o sambista foi contra a ocupação pelos traficantes da casa de uma das fundadoras da Império Serrano, Eulália de Oliveira, 90, a tia Eulália, que deixou o morro por estar com dificuldades de locomoção. Mesmo assim, o tráfico ocupou a casa.
Outro fato que reforça a suspeita de que o sambista foi morto por traficantes é o afastamento de, pelo menos, cem integrantes da bateria da escola desde 1999. Macarrão, nomeado diretor de bateria naquele ano, teria afastado os ritmistas por desconfiar que eles tinham ligação com traficantes.
A presidente da escola, Neide Domiciana Coimbra, afirmou que Macarrão "moralizou a bateria", expulsando todos os que consumiam drogas.
A presidente da Associação de Moradores do Morro da Serrinha, Kátia Simplício, entregou o cargo anteontem. Segundo amigos, ela disse que a entidade é um "barril de pólvora". Com medo de ser morta, Kátia deixou a associação.
Procurada pela Folha no enterro, ela não quis dar entrevista.
De acordo com o delegado, Kátia esteve com Macarrão minutos antes dele morrer. O delegado apura se ela viu quando o sambista foi capturado pelos traficantes.
Não é a primeira vez que um líder comunitário é assassinado por ordem do tráfico. Levantamento da Comissão de Impunidade da Assembléia Legislativa do Rio informa que, nos últimos dez anos, 130 líderes foram mortos por traficantes, 400 expulsos da comunidade e 500 acabaram cooptados pelos criminosos.

Enterro
Macarrão foi enterrado ontem no cemitério do Irajá (zona norte). Apesar do ambiente de tristeza e revolta, não houve manifestações. Durante o cortejo, acompanhado por cerca de cem companheiros da Império Serrano e parentes do sambista, foram cantados o hino e sambas da escola.
(MHM)


Texto Anterior: Idosas são sequestradas em Perdizes
Próximo Texto: PM do Rio é exonerado após não enviar equipe a morro
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.