São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 2001

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SAÚDE

Pesquisa do HC aponta crise no sexo

KATIA STRINGUETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Mais exposição e menos desempenho. A população fala mais sobre sexo, mas a disposição para o ato e a qualidade da vida sexual estão em xeque.
Essas são as conclusões de um levantamento realizado pelo Projeto Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo.
A pesquisa revelou também que os homens são, de longe, os mais preocupados em resolver suas dificuldades. As mulheres começam a se desinibir, mas ainda falta muito para virarem o jogo.
Informações de 2.000 pacientes que foram atendidos nos sete anos de funcionamento do serviço (de 1993 a 2000) foram analisadas. Desses, 70,2% são homens e 29,8%, mulheres.
No aspecto positivo, o que mais chama a atenção é o aumento no número de mulheres que procuram o ProSex para resolver suas dificuldades na cama.
No início do projeto, eram atendidos seis homens para cada mulher. Hoje esse índice é de dois homens por mulher. "Elas não aceitam mais transar sem sentir prazer", diz a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do ProSex.
Essa reação é vital, já que especialistas acreditam que as mulheres estão mais vulneráveis a problemas sexuais do que os homens.
Três motivos são apontados: o hormônio feminino estrógeno é menos potente do que o masculino (andrógeno) e despertaria menos o desejo; culturalmente elas não foram educadas para serem eróticas; e, fisicamente, têm maior dificuldade de se estimularem.
Outra mudança indicada na pesquisa se refere à queixa masculina. Hoje a principal angústia dos homens é a disfunção erétil (também chamada de impotência). Cerca de 40% dos homens apresentam o problema. Em 1993, a ejaculação precoce era a campeã de consultas: 43,9%, contra 41,1% por disfunção erétil.
Mas a ejaculação precoce não deixou de incomodar. Segundo Carmita, a reviravolta coincide com o aparecimento das pílulas contra a disfunção erétil (Viagra, Vasomax, Regitina), em meados de 1998. "Com a eclosão do medicamento oral, uma solução prática, e a grande divulgação sobre o tema da impotência, muitos homens que mantinham o problema escondido começaram a procurar tratamento."

Ajuda
O surgimento das pílulas contribuiu para que os homens buscassem ajuda mais cedo. Pelo menos no ProSex. Em média, levava aproximadamente quatro anos para um homem se considerar impotente e buscar ajuda. Atualmente, procuram o médico após alguns meses, segundo Carmita.
A realidade é um pouco diferente no Instituto H. Ellis de Sexualidade, também em São Paulo, que atende as classes média e alta. Os pacientes continuam levando quatro anos para procurar atendimento. A disfunção erétil é a recordista de consultas.
O urologista Sidney Glina explica que a dificuldade de ereção é a via final de uma série de problemas. Por isso acaba sendo a principal queixa. "Uma pessoa que convive bem com a ejaculação precoce pode começar a ficar ansiosa se encontra uma mulher que cobra uma relação mais lenta. A ansiedade pode fazê-lo perder a ereção e daí ele acha que está impotente e procura o médico."
No item das diferenças entre os sexos, o ProSex confirmou: o homem está sempre atento a qualquer alteração de performance, independentemente de seu estado civil. Já entre as mulheres, as casadas são maioria na hora de buscar ajuda especializada.
O mesmo ocorre em outro serviço público, o ambulatório de sexologia do Caisme (Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Ter um parceiro fixo parece pesar na hora de decidir ir ao médico. "Boa parte das pacientes têm medo de perder o casamento", afirma Nilva Ferreira Pereira, coordenadora do ambulatório.
O fato de 30% das frequentadoras do ProSex serem donas-de-casa também permite outra interpretação. "Elas têm mais tempo para frequentar o projeto do que as que trabalham fora, e valorizam muito a função sexual, porque é o que elas têm a oferecer para os maridos", disse Carmita.

Orgasmo difícil
No universo feminino, as principais queixas não mudaram. Ainda se sofre muito para atingir o êxtase. A falta de desejo e a dificuldade para chegar ao orgasmo angustiam 70% das pacientes.
Em média, elas procuram atendimento numa faixa etária inferior à dos homens: dos 21 aos 40 anos. Eles costumam buscar ajuda dos 31 aos 40 anos, quando começa a surgir a impotência.
O mais surpreendente é o índice de mulheres que não sente mais disposição para o sexo. Uma pesquisa feita pelo ProSex em parceria com o ambulatório de ginecologia do HC apontou que 12,5% das pacientes entre 40 e 45 anos sentem dor durante a relação.
Isso acontece não por causa de secura vaginal -sintoma que dificulta a penetração-, mas porque a mulher vive problemas conjugais e já desistiu de ter uma vida sexualmente ativa.

Média mundial
Com uma média de 20 pacientes novos por semana -em 1993 eram dez por semana-, o ProSex contabiliza o quanto se está querendo viver bem o sexo. Mas o projeto também revela o quanto está difícil alcançar esse objetivo.
Em comparação com números mundiais, os indicadores apurados revelam que a sexualidade dos paulistanos está na média. "Fala-se muito, expõe-se muito o corpo, mas, na verdade, o exercício da sexualidade tem se tornado uma atividade quase heróica em todo o mundo", diz Carmita.


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