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GILBERTO DIMENSTEIN
São Paulo cria centenas de milhares de empregos
Pressionados pela competição, executivos de empresas
de telecomunicação instaladas no
Brasil reclamam da dificuldade
de recrutar trabalhadores. Na disputa pela mão-de-obra, que é escassa, os empregadores são obrigados a melhorar as ofertas salariais e a pagar taxas de intermediação para os caçadores de talentos.
Beneficiados pela onda, engenheiros recém-formados já conseguem obter rendimento mensal
superior a R$ 10 mil.
Empresas como a Motorola e a
Lucent procuram faculdades de
engenharia, oferecendo-lhes apetitosos patrocínios para cursos
que formem especialistas em telecomunicações.
"Estamos suando para encontrar gente", comenta Dante Iacovone, principal executivo da BCP,
empresa de telefonia celular. Ele
não consegue preencher 12 vagas,
de ótimos salários, em posições estratégicas na empresa.
Segundo Iacovone, apenas no
Estado de São Paulo há uma carência de 40 mil trabalhadores
para o segmento de telecomunicações. Procura-se desde o instalador de uma linha de banda larga ou o operador de marketing
até quem maneje programas de
computador.
A saborosa angústia desses executivos faz com que o título desta
coluna não seja uma manifestação ridícula de otimismo, mas
apenas um fato incontestável.
Estatísticas divulgadas na semana passada pela Fundação
Seade e pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística
e Estudos Socioeconômicos) informam que, no ano passado, foram criados, somente na região
metropolitana de São Paulo, 280
mil novos postos -145 mil deles
na capital.
Se mantido o passo do crescimento econômico, o mercado de
trabalho vai abrir pelo menos
mais 300 mil novos empregos este
ano, pagando, em média, um salário próximo de R$ 900,00.
As vagas oferecidas em telecomunicação reforçam uma tendência: alimentam o segmento
econômico mais próspero e deixam para para trás -e bem para
trás- o da indústria e o do comércio. Quem emprega cada vez
mais é o setor de serviços, que
congrega do camelô ao consultor
em mecatrônica.
Dos 7,4 milhões de pessoas ocupadas na região metropolitana de
São Paulo, 4 milhões estão na
área de serviços, apenas 1,4 milhão está na indústria e 1,1 milhão, no comércio.
Se a indústria gerou, no ano
passado, mais 78 mil novas vagas,
invertendo uma tendência de redução, os serviços lançaram mais
170 mil novas ocupações.
A modificação não chegou a alterar substancialmente o nível de
desemprego, que continua alto,
gerando miséria e desolação por
todos os lados. O subemprego é
disseminado, e os salários são
baixos.
A angústia dos executivos de telecomunicação, no entanto, dá o
sinal de uma brutal reviravolta
no mercado de trabalho e delimita a fronteira entre os incluídos e
os excluídos.
Pode-se medir o impacto puramente econômico. O estoque previsto de novas vagas para este ano
significa mais 300 mil pessoas fazendo compras na região metropolitana. Uma bolada de R$ 3,24
bilhões no ano, levando-se em
conta o salário médio previsto de
R$ 900,00.
Num prazo de dois anos, do começo de 2000 até o final deste
ano, são quase 580 mil novos contracheques, 60% deles na cidade
de São Paulo.
A leitura dos dados divulgados
pela Fundação Seade e pelo Dieese oferece combustível para uma
visão otimista. Há tempos não se
comemoravam indicadores semelhantes, capazes de gerar um círculo virtuoso: mais gente trabalhando, mais consumo, mais consumo, mais empregos.
O foguetório é amenizado com
a análise dos dados estatísticos e
da pesquisa, que apontam para
perspectivas sociais terríveis: o
mercado está expulsando impiedosamente as pessoas de baixa escolaridade.
É o que explica, entre outras razões, por que 80% dos desempregados moram na periferia -e
por que existe pleno emprego entre os detentores de diploma universitário.
As novas demandas de uma sociedade tecnológica, voltada ao
serviço, geram mais e melhores
oportunidades para os incluídos,
aqueles que cursam boas escolas.
Na cidade de São Paulo, por
exemplo, 44% dos trabalhadores
concluíram o ensino médio ou superior. A Folha publicou quinta-feira passada reportagem que
mostrava que empresas de motoboys, esses contínuos contemporâneos, exigem diploma de segundo grau; alguns motoqueiros têm
diploma universitário.
As novas demandas jogam ainda mais para longe os excluídos.
Não há tempo nem dinheiro para
reintegrar as centenas de milhares de adolescentes sem qualificação, formando a mais grave armadilha social.
Essa armadilha é o que produz a
convivência tão próxima da sofisticação tecnológica, para a qual
falta gente, com a barbárie das
prisões superlotadas, nas quais há
excesso de gente.
PS- O pragmatismo das empresas de telecomunicação, bancando a melhoria do ensino superior, deveria inspirar a relação
entre a universidade e o poder
econômico.
Quanto mais as universidades
se abrirem para esse tipo de parceria e quanto mais as empresas
ajudarem a formar profissionais,
mais rápido será o crescimento
econômico e melhor será o nível
educacional.
Bom exemplo: em meio à carência acadêmica, setores da USP
(Faculdade de Economia e Administração, por exemplo) estão
rompendo a inércia e conseguindo recursos para desenvolver pesquisas e treinamento para a iniciativa privada.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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