São Paulo, domingo, 28 de agosto de 2005

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IMAGEM É TUDO

Nas ruas, nas escolas e na noite, quase ninguém está livre de ser fotografado em "flagrante" sem perceber

Celular com foto cria "geração paparazzi"

NINA LEMOS
COLUNISTA DA FOLHA

CONSTANÇA TATSCH
DA REDAÇÃO

Não é preciso ser uma pessoa famosa para ser alvo de paparazzis. Hoje, com a popularização dos telefones celulares, qualquer um pode ter seu dia de celebridade com privacidade invadida.
Se você for conhecido do produtor de moda Marcelo (nome fictício), 24, pode se preparar para ter seus passos guiados como se você fosse uma Daniela Cicarelli após terminar o romance com o atacante Ronaldinho.
"Tiro foto com meu celular o dia inteiro. Outro dia mesmo fotografei um cara de quem uma amiga minha é afim andando na rua e mandei a foto para ela por e-mail naquele momento." O menino, garante, não percebeu que estava sendo fotografado.
De tanto flagrar anônimos, Marcelo desenvolveu técnicas de paparazzi profissional - o termo surgiu quando fotófragos italianos que trabalhavam nas ruas se especializaram em expor segredos de astros de cinema. Depois, tanto o termo quanto a nova profissão ganharam o mundo. Agora, virou coisa também de amadores.
"Finjo que estou falando ao telefone e depois miro o celular como se fosse para um ponto perdido, mas é para a pessoa", diz. Entre seus objetos de fetiche preferidos estão "pessoas, roupas, cortes de cabelo". "Se vejo alguém interessante, fotografo e mando para os amigos por mensagem. O mais divertido é justamente fotografar sem as pessoas percebam."
A estudante de direito Michelle Martins, 23, também tem suas técnicas de papparazi. Mas na sua mira estão principalmente seus amigos. "Fotografo sem eles vejam." A brincadeira já quase acabou em briga. "Uma vez fotografei uns amigos se beijando na noite sem que eles percebessem. Contaram para a minha amiga. Ela me obrigou a apagar a foto na frente dela com medo de que eu colocasse em meu fotolog", conta. Em território livre, poucos costumam ter problemas ao fazer as vezes de paparazzi.

Na praia
Por isso, o publicitário Márcio (nome fictício), 40, escolheu a praia como seu principal território para brincar de fotógrafo-espião. Em sua mira estão homens e mulheres de biquíni, fotografados em suas partes mais íntimas. Márcio sempre faz esse tipo de foto, mas nunca teve problemas com seus modelos. "Faço disfarçadamente, mas acho que as pessoas sabem que estão sendo fotografadas. E gostam disso."
É claro que a maior parte das pessoas gosta de fotografar de forma tranqüila. "Não sou paparazzi. Toda foto eu mostro. Uma coisa é usar por diversão. Outra é querer flagrar alguma coisa", diz o estudante de administração, Diego Curbelo, 25.
Diego adquiriu o aparelho há três meses e já tirou cerca de 200 fotos. "O celular com câmera já está virando um item obrigatório. Hoje é uma febre, mas, com o passar do tempo, as pessoas vão incorporar ao cotidiano", diz.

Direito e privacidade
Mas, fotografar livremente e poder expor pessoas sem sua autorização, muitas vezes até por escrito, é uma atividade de risco. Se a pessoa se sentir ofendida, pode inclusive entrar na Justiça.
"Tudo o que estiver na rua, lugar do público por excelência, pode ser fotografado. Muda de figura se eu entro na sua casa e devasso sua intimidade, sem sua autorização, sem seu conhecimento", afirma o conselheiro federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e professor de dirteito penal da PUC Alberto Zacharias Toron. Essa invasão pode gerar danos morais para o ofendido, no plano de direito civil.
Já os casos em que alguém é fotografado nu ou tendo relações sexuais podem ser caracterizados como uma forma de atentado ao pudor, segundo Toron. "Mas não existe uma lei específica, seria o caso de se regular isso. Criminalmente, inclusive, para não permitir que as pessoas sejam invadidas", diz o especialista.


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