São Paulo, sábado, 28 de outubro de 2006

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Lei livra 16 mil de suspensão da carteira

Essa é a projeção dos veículos que, num único mês em SP, deixaram de ser punidos com multa de R$ 574 por excesso de velocidade

Abrandamento das penas provoca queda de infrações gravíssimas, que passaram a representar só 0,16% do total em rodovias paulistas


ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

A lei que abrandou a punição dos infratores por excesso de velocidade reduziu a patamares mínimos a quantidade de multas de R$ 574 consideradas gravíssimas e que levam à suspensão automática da carteira.
Com as novas regras, que passaram a valer há três meses, somente 0,16% dos motoristas que excederam a velocidade nas rodovias de São Paulo e 1,16% nas vias da capital paulista ficaram sujeitos a essa penalidade mais dura do Código de Trânsito Brasileiro, de 1998.
Antes, esses indicadores eram de 7,4% e de 12,6%, respectivamente. Na prática, a queda dos punidos por infração gravíssima superou 90%, livrando, num único mês e só estradas do Estado e vias da capital, conforme projeções estatísticas, mais de 16 mil condutores da suspensão do direito de dirigir independentemente de atingir os 20 pontos e da multa de R$ 574 -"economia" de R$ 447 em relação à multa grave.
A lei que abrandou as penalidades por excesso de velocidade é de autoria do deputado federal Beto Albuquerque (PSB-RS) e foi sancionada por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para vigorar a partir de 26 de julho, às vésperas das eleições, sem consulta ao Denatran, órgão de trânsito do governo federal, ligada ao Ministério das Cidades.
Ela fixou que a ultrapassagem do limite em até 20% é infração média (R$ 85 e quatro pontos na carteira), e não mais grave (R$ 127 e cinco pontos).
De 20% a 50%, é grave. Nas vias de trânsito rápido, eram antes gravíssimas, classificação dada hoje em dia só à velocidade acima de 50% do permitido.
Albuquerque alega que a mudança tornou a penalidade "mais justa e proporcional" à falha cometida pelo infrator.
Os críticos temem os impactos no comportamento do motorista a médio e longo prazo e na segurança do trânsito, além de citar eventuais distorções.
Com a nova lei, um motorista que está numa rodovia com limite de 120 km/h só passou a receber a punição máxima e ter a habilitação suspensa se flagrado a partir de 193 km/h -já que existe uma tolerância mínima obrigatória. Antes, recebia essa punição a 155 km/h.
"Quem está a 180 km/h é um assassino potencial", afirma Horácio Augusto Figueira, que é engenheiro de trânsito.
"Houve uma distorção na regra para as velocidades mais altas", afirma Adauto Martinez, diretor de operações da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) de São Paulo, citando como exemplo a pista expressa das marginais Pinheiros e Tietê, onde as placas permitem andar a 90 km/h, mas só passou a receber multa gravíssima quem está a 145 km/h -e não a 116 km/h, como era possível antes.

Categoria mais branda
Com as novas normas para quem excede a velocidade, a infração média -categoria mais branda que não existia até então para esse tipo de infração- passou a ser aplicada em 9 de cada 10 motoristas multados.
Na prática, esse afrouxamento, num único mês e só em São Paulo, favoreceu mais de 177 mil motoristas, que escaparam da multa grave, de R$ 127.
Alguns especialistas também condenam essa mudança por ser um incentivo a "pequenas transgressões", mas Martinez, da CET, avalia que esses infratores não são a grande preocupação para a segurança viária, e sim os "voadores" que passaram a escapar da gravíssima.
Nos dois primeiros meses de vigência da nova lei, tanto os técnicos da CET como os do DER (Departamento de Estradas de Rodagem) dizem não ter verificado alteração no comportamento dos motoristas que resultasse em maior desrespeito. A quantidade de multas ficou próxima da média.
"Os efeitos não ocorrem num prazo tão curto", avalia Jaime Waisman, especialista da USP (Universidade de São Paulo).
Ele também teme as conseqüências do abrandamento, mas considera ser preciso verificá-las estudando, no futuro, a variação dos acidentes. "Sempre que algo envolve vidas, pecar pelo excesso de segurança é melhor. Mas, por enquanto, há somente conjecturas", afirma.
"Os que andam a altas velocidades são poucos e também não ficam impunes. Se não for punido pela gravíssima, é punido pela grave. Fazer Justiça não significa ter que arrancar os olhos do cara", defende Beto Albuquerque, deputado autor da lei que abrandou as punições por excesso de velocidade.


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