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URBANIDADE
O caçador da Nostalgia
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
A bordo de um bonde que
cruzava a avenida Paulista, com suas calçadas largas e
povoadas de ipês amarelos, o
adolescente Luiz Simões nunca
deixava de prestar atenção à
sensualidade ingênua -excitante para seus olhos juvenis-
das estátuas de duas ninfas,
nuas, que decoravam uma pérgola do parque Trianon. "Eu tinha vindo do interior, e estátua
de mulher pelada era novidade
para mim."
O adolescente ainda não sabia, mas apreciar as formas,
humanas e inumanas, serviria
mais do que satisfazer os apetites juvenis. Seria seu meio de
ganhar a vida. Depois de descobrir o talento para o desenho,
entrou para o mercado da criação publicitária. Hoje, aos 62
anos, dedica-se a colocar novamente juntas, no parque Trianon (Siqueira Campos), as
duas ninfas.
Uma delas, a Nostalgia, tinha
desaparecido. "Fui fazer uma
pesquisa e ninguém sabia onde
ela tinha sido jogada." Pediu
ajuda a amigos e acionou contatos pela internet. Até que recebeu uma pista de Neuza
Guerra -uma bióloga aposentada que, graças à sua mobilização pela internet, conseguiu
salvar uma imensa figueira na
rua Glete, onde funcionavam
alguns cursos da Universidade
de São Paulo.
No trabalho de detetive, Simões encontrou Nostalgia numa situação desoladora. Com
partes destruídas, outras sujas,
a ninfa está numa pequena
praça próxima ao Jockey Club,
cercada de uma paisagem que
nada faz lembrar a então aristocrática avenida Paulista, com
seus casarões, mulheres e homens trajados no estilo europeu
e flores coloridas esparramadas
pelo chão. A nudez ingênua da
ninfa está agora acompanhada
de prostitutas e travestis. "Por
que não devolvê-la a seu verdadeiro lugar?", pergunta Simões,
que, apoiado na habilidade de
mobilização pela internet de
Neuza -mais conhecida por
seus amigos como vovó Neuza-, está em busca de aliados.
Na sua solidão -nunca recebeu resposta de ninguém da
prefeitura-, Simões sonha
que, no próximo dia 3 de abril,
quando o parque completa 114
anos, alguém possa sensibilizar
e tentar levar Nostalgia de volta. "No fundo, é como se eu
mesmo pudesse voltar a ter
aquele olhar encantado do
adolescente."
@ - gdimen@uol.com.br
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