São Paulo, domingo, 29 de junho de 2008

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Jovem sofre como adulto em delegacia

Pesquisa do governo federal mostra que delegacias para crianças e adolescentes têm mesmos problemas do sistema prisional

Unidades contam com infra-estrutura precária e assistem a avanço da população feminina, como nos presídios para adultos

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Levantamento da Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública) nas delegacias especializadas em crianças e adolescentes do país revela que essas unidades possuem características comuns ao sistema penitenciário, como precariedade de infra-estrutura e avanço da população feminina.
Das 75 delegacias do país, 56 responderam ao questionário enviado pelo governo. Dessas, 29 (51,8%) possuem carceragem, com um total de 287 meninas e 983 meninos.
Chama a atenção o avanço da população feminina nessas unidades -510% a mais entre 2004 e 2006, contra 121% dos homens. A mesma tendência é vista no sistema prisional. Entre 2005 e 2007, o número de mulheres encarceradas cresceu 27%, contra 16% dos homens.
O levantamento recém-concluído pela Senasp obtido pela Folha, com dados de dezembro de 2006, levou em conta tanto as delegacias nas quais as crianças e adolescentes são tratados apenas como vítimas (23,2%) quanto aquelas em que entram como infratores (35,7%) ou nas duas situações (21,4%).
Em geral, o quadro é precário. Por exemplo: apenas 53,6% possuem sala de atendimento especial às vítimas de violência, 42,9% têm sala de espera para os pais e 21,8% têm brinquedoteca (veja quadro nesta página).
"O que a gente não conseguiu sensibilizar em termos de política é a questão da carceragem, que, na verdade, nem deveria existir, ou existir o mínimo possível. Mas, já que existe, deveria ter um pouco mais de consideração", afirma Marcelo Durante, coordenador de pesquisas da Senasp.
"As carceragens dão indicativos de graves violações de crianças e adolescentes. O Estatuto [da Criança e do Adolescente] deixa claro, muito claro, que a privação de liberdade não significa privação de direitos", diz Carmen Silveira de Oliveira, subsecretária de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência e presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.
O governo federal, que em casos de segurança pública costuma atribuir a responsabilidade aos Estados, também admite sua parcela histórica de culpa, em especial no direcionamento de recursos a esses governos. No caso das delegacias, a idéia da Senasp é influir na reestruturação das unidades e propor um modelo ideal.
O levantamento da Senasp mostra que, em relação a 2004, há uma pequena evolução em alguns itens, como sala de atendimento especial (de 41% para 53,6%) e brinquedoteca (12,2% para 21,8%). "Há uma ligeira melhora, mas ainda muito aquém. É chocante que 90% dos adolescentes acautelados não podem ter banho de sol. É impressionante", afirma Carmen de Oliveira, numa referência ao fato de que apenas 10,3% das delegacias com carceragem têm espaço e disponibilidade para o banho de sol.


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