São Paulo, sábado, 29 de agosto de 2009

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WALTER CENEVIVA

Álcool no trânsito


O crime no trânsito é, em regra, considerado culposo e não doloso: o autor do delito não quer o resultado


HOUVE TEMPO, NO direito brasileiro, em que certos atos criminosos praticados sob influência do álcool eram até desculpados -ou punidos com penas brandas. A extraordinária evolução do uso de veículos a motor terminou criando, nos penalistas, a necessidade de regulamentar melhor a ofensa às leis do trânsito, quando agravadas pelo álcool. A lei 11.705/08 mudou, para esse efeito, o CTB (Código de Trânsito Brasileiro) nos artigos 166, 276 e 277.
O assunto interessa a todos, a cada pessoa individualmente considerada. Quem não dirige qualquer tipo de veículo nas vias públicas está livre da punição administrativa e da conduta criminosa. Ninguém, contudo, pode considerar-se isento de vir a sofrer, no tráfego, as consequências de um acidente com ferimentos pessoais.
O crime no trânsito é, em regra, considerado culposo e não doloso: o autor do delito não quer o resultado. Nesse caso, a lei permite -e os juízes tendem a aceitar- soluções nas quais a pena de prisão é substituída por outras. Isso é bom. Verdade é que muita gente se serve do favorecimento para abusos irresponsáveis em seus veículos. Abuso praticado até por autoridades ou figuras da política que provocaram acidentes com vítimas, com índices de álcool no sangue excedentes dos limites aceitáveis.
Se o leitor quiser meditar a respeito, a primeira questão está em saber se é bom ou não tratar, de modo mais leve, o crime de trânsito. Claro que, em certas situações excepcionalmente sérias, se compreende o agravamento da lei penal.
A norma no sentido da benevolência se explica, pois é raro usar veículo com intenção de matar ou ferir. Sob outro ângulo, a avaliação do abuso não despreza dificuldades do tráfego congestionado, dos pisos malconservados e das vias mal sinalizadas em favor de quem não age com dolo.
A culpa se caracteriza pela ação com imperícia, imprudência ou negligência. Quando a imprudência é excessiva, o responsável assume o risco do dano. Por isso a segunda questão se refere a ações dolosas ou equivalentes. Exemplo: o motorista, sabendo que dirigirá na via pública, bebe acima de sua capacidade, assumindo a possibilidade de causar dano. Sua conduta ofende por si mesma o direito dos ameaçados, mesmo antes de serem vitimados com danos físicos e morais, explicando as sanções administrativas incluídas no CTB.
Cabe pensar se devemos incluir, na avaliação, o condutor do veículo que não se previne contra o risco agravado. Não se acautela. O leitor, para definir sua posição, deve conhecer a chamada de transação penal, que está na lei e consiste na troca da pena detentiva por outra, como a prestação de serviços diversos à comunidade.
Quando o abuso é evidente, abandonados os cuidados normais, não cabe a transação penal que livra o responsável da prisão. Esta, por exceção, deve ser mantida quando a pena menos severa não basta. A suspensão do processo pode ser concedida sob a condição de que o envolvido cumpra o que prometeu, na transação autorizada pelo juiz.
Exatamente por serem poucas, as alternativas de irresponsabilidade grave do agente, se e quando constatadas, devem provocar o agravamento, ainda que não aplicada a prisão -só aceitável para tais delitos em casos excepcionais.


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