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GILBERTO DIMENSTEIN
Lula vai ficar oito anos?
Se ainda é cedo para julgar a
gestão FHC, imagine para
analisar o governo Lula, a ser iniciado somente nesta semana.
Ainda não é um governo, mas já
merece ser avaliado favoravelmente -afinal, realizaram-se,
nesse curto período entre a vitória
na eleição e a posse, relevantes
conquistas.
Talvez pareça tão apropriado
avaliar o "governo" Lula agora
quanto comentar o desempenho
de um time pela atuação dos jogadores durante o aquecimento
em campo. Engano: na condição
apenas de presidente eleito, ele
administrou símbolos e assegurou um clima de normalidade.
Uma bobagem na área econômica e o dólar estaria em alta em
meio a suspeitas de calotes. Tais
suspeitas produziriam profecias
auto-realizáveis, provocando fuga de recursos. Some-se a isso o
fato de a inflação estar ascendente, com risco de indexações salariais, para que se tenha uma idéia
do pânico que, pelo menos até hoje, foi evitado.
Na véspera da posse, o ambiente é de moderado otimismo
-mesmo entre as elites. Não é
pouca coisa.
A eleição foi cercada de terrorismo econômico, justificado, em
larga medida, pela folha corrida
de baboseiras ideológicas do PT,
no geral, e, em particular, de Lula,
alguém que provoca receio menos
pela ausência de diplomas do que
por sua inexperiência administrativa e por sua vocação para generalidades.
Na campanha, as promessas feitas, se devidamente contabilizadas, se traduziriam, na prática,
em rombos no Orçamento, rompimento com contratos internacionais, inflação, explosão do dólar, risco de calote e por aí vai.
É compreensível a insegurança
de quem se guia mais pelos números e pelos fatos do que pela galeria de desejos manipulados em
palanques.
Lula venceu cercado de duas expectativas: a de que poderia fazer
muito mais coisas do que realmente pode um simples mortal e
a de que, inexperiente e voluntarista, desestabilizaria o país.
Diante dessas duas expectativas
-a de ser um salvador e a de ser
um demolidor-, Lula tinha de
descer rapidamente do palanque
e sair "governando" antes mesmo
de qualquer acesso ao "Diário
Oficial" da União.
Precisaria manter em alta a sensação de mudança, a razão de estar recebendo a faixa presidencial
de Fernando Henrique Cardoso.
Concluída na semana passada, a
composição ministerial mostrou
o velho jogo dos arranjos para
acomodar os amigos e os aliados,
além da fragmentação de políticas de governo, em especial na
área social.
Mas também exibiu nomes de
pessoas experientes, nacionalmente conhecidas pelo esforço
contra a exclusão -Cristovam
Buarque, Tarso Genro e Benedita
da Silva, por exemplo. São pessoas -a quem mesmo os mais
desconfiados podem conceder o
benefício da dúvida- capazes de
realizar uma política social com
alguma consistência.
Quem leu, na semana passada,
as manifestações de muitos dos
ministros escolhidos pode ter ficado com a impressão de que o novo
governo é um prosseguimento da
"era FHC". "É um privilégio dar
continuidade ao trabalho dos últimos anos", elogiou Cristovam
Buarque, ressalvando, é claro,
que haverá mudanças de foco, de
ritmo e de método. "O que é bom
deve ser mantido. Não vou mexer
no que está certo", disse Benedita
da Silva, futura ministra da Assistência e Promoção Social.
São sinais de bom senso, que
emitem a sensação -por enquanto, nada mais do que uma
sensação- de que o poder está
sendo ocupado por gente com a
disposição de manter a cabeça no
lugar.
Limitam-se a um grupo de desinformados ou de levianos (e
também de desinformados levianos) as reclamações contra a
orientação econômica de Lula. É
preciso não dispor de informação
ou apostar no pior para defender
o confronto com o mercado e com
o sistema financeiro internacional. Perder a batalha da estabilidade é perder a batalha de todo
um governo, é fazer a situação do
país beirar a da Venezuela ou a
da Argentina.
Na vaidade típica dos eleitos,
Lula deve estar se sentindo (como
FHC se sente) o marco zero de um
novo Brasil -e não faltarão bajuladores palacianos para estimular seu sentimento de orgulho.
Mas a verdade é que, se conseguir
manter o que já existe (a estabilidade), viabilizar o que quase não
existe (o crescimento) e tornar
mais eficientes os programas sociais, articulados nos níveis federal, estadual e municipal, com foco, embora talvez digam que apenas continuou o que FHC deixou,
Lula terá sido um grande presidente -e, possivelmente, com
um mandato de oito anos. Se fizer
muitas experiências, sentindo-se
reinventor do Brasil, terá dificuldade de ficar quatro anos.
PS - Para acomodar o amigo
Olívio Dutra, Lula perdeu a chance de entregar o Ministério das
Cidades -sinal de uma visão
correta para o Brasil urbano- a
alguém que soubesse enfrentar,
com idéias originais, as bombas
das regiões metropolitanas. Não
existe política social sem política
urbana. Pensar o país através das
suas regiões metropolitanas exige
uma visão de vanguarda -é o
ponto a que todas as políticas sociais deveriam, articuladamente,
convergir.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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