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MAPA DA VIOLÊNCIA
Líder de morte no trânsito tem buracos de 2m
Atravessada pela rodovia Régis Bittencourt, Barra do Turvo, em SP, tem a maior taxa de mortes por transporte do país
Não há controle de velocidade e placas estão cobertas por mato; 10% dos óbitos são moradores, o resto são motoristas de todo o país
ALENCAR IZIDORO
ENVIADO ESPECIAL A BARRA DO TURVO
(SP)
À primeira vista, seria difícil
imaginar na liderança do ranking de acidentes de transporte
no Brasil um município com
65% de sua população rural e
economia baseada na agricultura de subsistência. Mas a explicação para Barra do Turvo (a
375 km de SP) ocupar esse posto é simples: ela é atravessada
por sinuosos 45 km da Régis
Bittencourt, principal ligação
de São Paulo à região Sul.
E não é só a geometria que
agrava as condições dessa rodovia. Apesar de seguidos tombamentos, capotamentos e colisões de veículos nos últimos
anos, a pista segue com infra-estrutura deficiente: buracos
de até dois metros tomam conta do asfalto, acostamentos e
placas de sinalização em pontos estratégicos estão encobertos pelo mato e não havia ontem nenhum radar de controle
da velocidade em funcionamento nesse trecho.
Barra do Turvo tem a mais alta taxa de mortes em acidentes
com transporte do país: 273,4
por 100 mil habitantes -Peixoto de Azevedo (MT) vem em segundo (203,2), e Barbalha (CE),
em terceiro (183,4).
Essas condições que se repetem desde a última década já
trouxeram fama ao município:
paraíso dos guincheiros. A área
abriga quase uma dezena de bases que atendem principalmente carretas acidentadas ou
quebradas. O sistema é sofisticado. Eles ficam de ouvido grudado no rádio amador que monitora a comunicação dos caminhoneiros. Não é à toa que
são quase sempre os primeiros
a chegar, antes da ambulância
ou da Polícia Rodoviária Federal. Muitas vezes, junto com os
saqueadores de cargas tombadas, comuns nas imediações.
A rapidez com que chegam
após um acidente é motivo de
orgulho. A última moda é fotografar os carros envolvidos.
Edicléio José Viera, 31, acumula seis painéis com fotos das
tragédias dos últimos cinco
meses. "Ainda tenho um monte
para revelar", conta. Há também os que guardam as imagens no celular, como Luiz Fernando de Moura, 27, que mostrava ontem os vídeos de acidentes que acompanhou.
Esses socorristas do mercado
paralelo -que cobram a partir
de R$ 250- já provocou polêmica. O apresentador Carlos
Massa, o Ratinho, sofreu um
acidente em 2004 na Régis Bittencourt, próximo a Barra do
Turvo, em que morreu seu motorista, após colidir com um caminhão. São freqüentes os comentários de que os guincheiros derramariam óleo na pista
para causar acidentes, roubar
motoristas e saquear as cargas.
Mas eles negam, assim como a
Polícia Rodoviária Federal.
"As acusações nunca foram
comprovadas. E essa questão
do saque das cargas é uma característica de vários lugares",
afirma Juarez Barbosa Ferreira
Cardoso, inspetor da PRF.
Alvoroço
Se nas imediações da Régis os
moradores -geralmente de
áreas invadidas do parque estadual de Jacupiranga- já se
acostumaram com os acidentes, os habitantes urbanos de
Barra do Turvo convivem em
ruas vazias com muitas bicicletas e até alguns cavalos. São
poucos os carros -a população
nem sequer atinge 10 mil, é pobre e tem um dos IDHs (índice
de desenvolvimento humano)
mais baixos do Estado.
O acidente que mais deixou
os moradores perplexos, conforme relatos colhidos ontem,
foi no semestre passado, quando dois jovens alcoolizados capotaram na via que leva a Iporanga. "É um fato que vai ficar
marcado durante anos por
aqui", afirma Carlos Alberto
Roesler, secretário de administração de Barra do Turvo -ele
mesmo vítima, há duas semanas, dos problemas da Régis,
quando sua Veraneio teve o eixo quebrado em um buraco.
Já os acidentes na rodovia
não chegam mais a provocar
tanto alvoroço no município.
Segundo a prefeitura, só 10%
das certidões de óbito registradas em Barra do Turvo são de
habitantes da região. Os demais
são motoristas de todo o país
acidentados na estrada.
Outro lado
O inspetor Juarez Barbosa
Ferreira Cardoso, da PRF, diz
que as curvas da Régis Bittencourt são um agravante de acidentes no trecho de Barra do
Turvo, mas defende que a razão
principal ainda está ligada à imprudência ou à desatenção dos
motoristas. Os radares que deveriam fiscalizar a velocidade
na região, segundo ele, estão
passando por revisão, mas devem voltar no Carnaval.
Ricardo Madalena, superintendente do Dnit (Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes) em São
Paulo, diz que a manutenção da
Régis esteve abandonada durante os últimos meses de 2007
devido ao processo de concessão da rodovia à iniciativa privada -que pode ser concluído
no mês que vem.
Mas afirma que acabou retomando os trabalhos há um mês,
desde que assumiu esse posto.
"Não foi possível dar conta de
tudo nesse prazo. Mas pedi
prioridade, já colocamos mais
placas e tapamos mais buracos.
Está melhor do que antes."
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