São Paulo, quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

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ARTIGO

Informação precisa igual a política eficaz

Um bom sistema de dados nacionais é absolutamente necessário para que se possa traçar medidas públicas corretas

ALBA ZALUAR
COLUNISTA DA FOLHA

O deleite da imprensa com pesquisas cheias de dados quantitativos é flagrante. Todos os veículos de informação divulgaram e comentaram os dados do Mapa da Violência que acaba de sair do forno. Os pesquisadores da área nem tanto. Senão vejamos:
1. Um bom sistema de informação nacional é absolutamente necessário para que se possa traçar políticas públicas corretas. Como os estudiosos do assunto sempre afirmaram, não há política certa baseada em dados errados. Portanto é preciso muita cautela, além do pleno acesso aos dados oficiais por todos os grupos de pesquisa, para que se possa criticar ou refinar esses dados.
Não cabe nem ao Ministério da Saúde nem ao ministro da Justiça criticar os dados sobre mortalidade no Brasil enviados pelas secretarias estaduais, mas sim avaliar a confiabilidade dos mesmos.
Pode-se confiar do mesmo modo nos dados enviados por municípios na vasta extensão do território nacional?
Há alguns anos, um terço dos municípios enviava dados inutilizáveis. Hoje já se pode confiar igualmente nos dados enviados dos mais afastados rincões e pequenos municípios do interior?
Os registros de ocorrência e os atestados de óbito que formam a base do sistema nacional de informações são preenchidos por pessoas igualmente treinadas e seguindo formulários comuns?
2. Há muito, pesquisadores brasileiros se batem para que se obtenha essa tão necessária uniformidade tanto no preenchimento dos dados quanto no acesso posterior aos mesmos, indispensável para a crítica que vai melhorá-los.
Uma luta interminável para romper com o padrão brasileiro de dados enviados com exclusividade para alguns órgãos, alguns pesquisadores ou mantidos ciumentamente pelos funcionários dos próprios institutos de pesquisa para escrever seus textos.
Os dados de que todos dispõem no momento terminam em 2005. Por que alguns conseguem com exclusividade os dados de 2006?
3. As taxas de homicídio são calculadas com base em cem mil habitantes, ou seja, divide-se o número de homicídios por cada 100 mil e obtém-se a taxa.
Ora, para municípios com menos de 100 mil moradores, que constam do Censo de 2000 e são projetos até 2006, essa taxa vai perdendo a confiabilidade à proporção que diminui a população residente.
Estatísticos cuidadosos utilizam métodos criteriosos para diminuir a distorção provocada na taxa obtida. Esses métodos não foram empregados na recentemente divulgada pesquisa Mapa da Violência.
4. Que interesse podem realmente ter essas intermináveis listas dos municípios mais violentos do Brasil? Diminuir o fluxo de turistas para alguns pequenos municípios apresentados com taxas absurdamente altas considerando o número de assassinatos ocorridos nelas? Aumentar o medo de vitimização dos seus moradores?
Em nenhum dos dois casos há quaisquer benefícios resultantes dessa exposição pública (nacional e internacional) das suas supostas mazelas na segurança pública.
5. Por fim, tampouco aumenta o nosso entendimento das complexas e variadas "causas" dos diferentes tipos de homicídio, das diferentes mortes violentas (homicídio, suicídio e acidentes). Para cada um desses diferentes padrões é preciso montar projetos de prevenção e repressão específicos.
Ainda temos muito chão para percorrer até chegarmos lá. E não será com pesquisas pouco cuidadosas que enxergaremos a luz no final do túnel.


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