São Paulo, quarta-feira, 31 de outubro de 2007 |
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GILBERTO DIMENSTEIN Triângulo amoroso em São Paulo
ENTARDECIA EM SÃO PAULO . Irado, Heitor discute, pelo telefone, com a namorada. Desliga e se desespera. Às pressas, pega o carro para encontrá-la: quer evitar o fim da relação e sente que não tem um segundo a perder. Mas fica preso num gigantesco congestionamento. Enquanto espera, viaja pelo tempo. Com suas crianças de rua, mendigos e executivos agitados, a paisagem paulistana desfila pelo vidro de seu carro. Por trás das telas desse filme em que Heitor (Marcos Ricca) é o personagem principal de "A Via Láctea", há uma outra digressão -e uma tumultuada história de amor. No filme, a briga entre o casal ocorre por causa da suspeita de traição. A outra ponta do triângulo, entretanto, não é uma pessoa, mas a própria cidade, que se transforma num personagem. "São Paulo é, para mim, um útero", compara Lina Chamie, diretora do filme, o que significa uma fonte de inspiração.
Lina nasceu no Bexiga, naquela época epicentro da boêmia paulistana,
onde, quando adolescente, se encantou com o teatro. Com os bicos
que fez -trabalhava com aparelhagem de som-, comprou uma pequena motocicleta, que a levava ao colégio Equipe, então uma espécie de incubadora de talentos artísticos paulistanos, entre os quais, o cineasta
Cao Hamburguer, candidato ao Oscar com "O Ano em que Meus Pais
Saíram de Férias".
Lina não se dá muito bem com a natureza. "Na praia, me queimo rápido, tenho pele fina. No campo, os bichos me picam e fico inchada. Gosto
mesmo é do asfalto." Sentir a cidade
significa caminhar a pé ou fluir pelo
trânsito, montada numa moto, zanzando entre os outros. Seus pais se
mudaram do Bexiga e foram morar
em Moema -o que a obrigava a ir
até o Equipe fazendo um longo trajeto e encarando a avenida Santo
Amaro, "a rua mais feia do mundo".
Aquele corpo-a-corpo com a cidade,
feito pela moto ou pelas caminhadas, foi levado para a tela, contando
o prazer e a dor de morar em São
Paulo. O filme estréia na próxima
sexta, Dia de Finados, quando São
Paulo não é bem São Paulo: as pessoas viajam e as ruas ficam vazias,
apenas com a lembrança daquele
trânsito exibido em "A Via Láctea".
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