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Bichos - Sílvia Corrêa

correa-silvia@uol.com.br

Feliz 2012!

Camas importadas e roupas de seda podem até fazer a alegria do dono, mas não mudam a vida de seu animal

Quem cria cães e gatos como membros da família não pode negar que tem hábitos, no mínimo, atípicos. Eu, por exemplo, sou adepta do diálogo. Costumo deitar no chão, contar a eles como foi meu dia, perguntar se comeram, brincaram e disputaram a dentadas algum ossinho.

Quando era criança, sonhava com o dia em que pediria ao gênio da lâmpada que todos os bichos falassem e me dissessem em claro português o que gostam, o que querem e como se sentem bem. A dúvida sempre foi uma só: será que eles são felizes? Como o gênio nunca apareceu, decidi cursar medicina veterinária.

É verdade que, ao longo de mais de 5.000 horas de graduação, só 40 delas são dedicadas a uma disciplina batizada de "bem-estar animal", incluída na grade por pressão de organizações não governamentais. Não é o bastante, mas é um começo.

A questão ganhou importância quando os pesquisadores provaram o que os apaixonados por bichos já sabem há décadas: todos os vertebrados -e até alguns cefalópodes (polvos e lulas)- têm sentimentos e sensações de sofrimento e prazer.

A base dos postulados sobre bem-estar animal está na ideia de que não se deve ampliar para as outras espécies os conceitos que temos quando visamos a satisfação de nossos próprios desejos e necessidades. Fica fácil entender se pensarmos que cães e gatos não precisam tomar champanhe nem soltar fogos no Ano-Novo para se sentirem bem. Por outro lado, eles necessitam cheirar uns aos outros para se conhecerem e roer ossinhos para passar o tempo -o que, provavelmente, não daria prazer a você.

As conclusões apontam para o combate à crescente humanização dos animais domésticos. O que significa que comprar camas importadas, vestidos de seda e cobertores de matelassê movimenta o enorme mercado pet, gera empregos e pode fazer a alegria de sua mulher ou de sua filha, mas não mudará a vida de sua cachorrinha.

A base da promoção do bem-estar está na garantia de que o animal tem liberdade de expressar seu comportamento natural e está livre de fome, sede, medo, estresse, dor, doença e desconforto físico e térmico. Isso pode ser traduzido em medidas simples: água limpa à vontade, brinquedos, passeios, momentos em que se pode latir e miar sem restrições; na possibilidade de escolher entre se refrescar na garoa e se abrigar da tempestade; e na garantia de que um bicho que sofre da coluna, por exemplo, não terá que subir escadas nem se equilibrar sobre um caríssimo e deslizante piso de porcelanato.

Todas essas liberdades estão previstas no projeto de Declaração Universal de Bem-Estar Animal, texto que a WSPA (Sociedade Mundial de Proteção Animal) vem propondo aos líderes mundiais. Já são dezenas os países apoiadores -o Brasil, infelizmente, ainda não está entre eles.

Nosso desafio, portanto, é melhorar a vida de nossos animais considerando necessidades e desejos, mas sob o ponto de vista deles. É isso que os fará felizes em 2012 e até o apagar das luzes. Aos poucos, entendo que eles não precisam falar.

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Jairo Marques

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