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Bichos

SÍLVIA CORRÊA correa-silvia@uol.com.br

O preço da vida

Transplante de medula óssea é realidade para cães e gatos nos EUA, mas custa US$ 25 mil

O diagnóstico veio há dois anos: Tina, uma chow chow então com dez anos, estava com linfoma. O prognóstico era sombrio. O câncer linfático, comum em animais mais velhos, pode ser tratado com quimioterapia, mas o tumor com muita frequência reaparece dentro de um ano, de maneira fatal.

A boa notícia é que os donos de Tina tiveram uma segunda opção. Depois de sessões de quimioterapia, decidiram levá-la a um hospital universitário, onde ela foi um dos primeiros cães a receber um transplante de medula óssea. Tina voltou para casa livre do câncer.

A má notícia é que o hospital em questão pertence à Universidade Estadual da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, completamente inacessível às nossas Belinhas, Jujubas e Filós que lutam contra o linfoma.

A história de Tina está na edição da última quinta-feira do "New York Times" e expõe o enorme abismo entre o que está disponível para o atendimento à saúde de cães e gatos dos dois lados do Equador.

Nos Estados Unidos, os animais têm se beneficiado dos avanços da medicina veterinária, que tornam tratáveis doenças que até bem pouco tempo eram sinônimo de sofrimento ou de eutanásia.

Segundo o NYT, a Universidade da Carolina do Norte já fez 65 transplantes de medula óssea e tem dez animais na fila. Não está sozinha. No ano passado, o Centro Médico de Animais, em Manhattan, implantou stents (próteses) em 630 cães e gatos com fluxo urinário obstruído.

Mas tratamentos como esses têm preço -emocional e financeiro. Os donos de Tina afirmam ao NYT que se questionaram se não estavam sendo egoístas e se gostariam de passar por tudo aquilo se fossem uma cadela de dez anos. Decidiram ir adiante e gastaram US$ 25 mil entre as sessões de quimioterapia e o transplante de medula.

A cifra evidencia que o abismo não é só tecnológico. É cultural. É social. Aparelhos de tomografia computadorizada e ressonância magnética já chegaram por aqui, mas muitos proprietários ainda relutam em utilizá-los como forma de auxiliar no diagnóstico das doenças de seus animais. Os exames custam cerca de R$ 800. Alguns acham desembolso demais. Outros, de fato, não têm de onde tirar.

Também na quinta, um homem de cerca de 50 anos chorou boa parte da tarde ao lado da maca de sua vira-latinha, num dos melhores hospitais veterinários do Brasil.

Idosa, ela teria de começar o terceiro protocolo de combate a um linfoma. O impasse é de fácil compreensão. Ele perde o dia de serviço a cada sessão de quimioterapia. Deixa de ganhar e ainda gasta para chegar ao hospital. Fora as drogas contra o câncer, a cachorrinha ainda precisa de remédios contra o glaucoma e a diabetes. A conta já não cabe no salário mínimo que o dono recebe por mês.

O hospital se dispôs a isentá-lo dos custos do combate ao linfoma. E ele ficou de usar o feriado para pensar em como resolver o resto.

Dói admitir, mas o preço da vida varia de acordo com o grau de desenvolvimento social de cada país.

AMANHÃ EM COTIDIANO
Jairo Marques

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