São Paulo, domingo, 01 de abril de 2001

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LIVRE COMÉRCIO
Ofensiva de empresariado americano para implantação é mais forte que a do próprio governo; Brasil é contra
Indústria norte-americana pressiona por bloco em 2004

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

O empresariado norte-americano está em plena ofensiva, muito mais firme que a de seu próprio governo, para implantar a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) o mais cedo possível.
É o que transparece, com nitidez, dos documentos que as entidades empresariais dos EUA estão apresentando para o Fórum Empresarial das Américas, marcado para 5 e 6 de abril, em Buenos Aires. O encontro empresarial coincidirá com as negociações finais para a Cúpula das Américas, entre funcionários governamentais e, depois, ministros de Comércio e de Relações Exteriores dos 34 países que comporão a Alca. A Cúpula das Américas, por sua vez, se dará em Québec, no Canadá, entre os dias 20 e 22, e é tida como o ponto decisivo para a implantação da Alca.
A NAPM (sigla em inglês para Associação Nacional de Indústrias Manufatureiras), por exemplo, cobra o fim das negociações para criar a Alca em 2003, com "implementação de fato a partir de 31 de dezembro de 2004".
No máximo, a NAPM aceita que setores sensíveis possam ter um período mais longo para zerar suas tarifas de importação.
Outro documento que prova a pressa foi apresentado por uma série de entidades empresariais, coordenadas pela Associação de Câmaras Americanas de Comércio na América Latina.
Pede um acordo rápido (até 2002) para a área de compras governamentais (as concorrências públicas para aquisição de bens e serviços pelos governos).
As posições do empresariado americano colidem com as de seus pares brasileiros. Diz o texto para o encontro de Buenos Aires preparado pela Coalizão Empresarial Brasileira, um conglomerado de cerca de 70 entidades representativas de vários setores: "A circulação de propostas de aceleração das negociações com vistas à antecipação dos prazos para a entrada em vigor do acordo preocupa o empresariado brasileiro".
Mais: "O cronograma original da Alca afigura-se adequado e constitui uma salvaguarda contra propostas que tendem a gerar incerteza entre os participantes do processo negociador".
As duas posições do empresariado (a pressa dos norte-americanos e a cautela dos brasileiros) estão representadas quase à perfeição nas negociações entre os funcionários governamentais.
A proposta do Brasil (encampada pelos seus três parceiros do Mercosul) deixa em aberto o prazo para o término das negociações. Diz apenas que a Alca "deveria entrar em vigor um ano após o término das negociações".
A segunda proposta é do Chile, mas coincide com as ambições do empresariado americano. Prevê o início da Alca para 1º de janeiro de 2005. Na prática, significa encerrar as negociações em 2003, pois há consenso entre os negociadores que será preciso reservar um ano inteiro para que os Parlamentos nacionais ratifiquem o que for decidido pelos Executivos.
Para a Alca começar em 2005, como propõe o Chile, a negociação precisa terminar em 2003, para deixar 2004 para o processo de ratificação parlamentar.
Acontece que o Chile já mudou de posição. Comunicou formalmente ao governo brasileiro que, embora prefira ver a Alca implementada rapidamente, compreende e respeita as restrições brasileiras. Se a proposta chilena for retirada em Buenos Aires, é razoável supor que prevalecerá a posição brasileira.
É uma solução que convém em princípio ao governo americano, que, embora demonstre de público certa pressa, não pode acelerar as negociações por falta da TPA (Trade Promotion Authority). É o novo nome para "fast track", mecanismo pelo qual o Congresso dá poderes ao Executivo para negociar acordos que, depois, o Parlamento apenas rejeita ou aprova em bloco, mas não emenda.
Sem TPA, as negociações não avançam. "Os EUA podem falar um bocado sem TPA, mas não haverá negociações sérias", diz, por exemplo, Gary Hufbauer, ex-funcionário do Tesouro norte-americano e um dos maiores especialistas em comércio internacional, membro do Instituto para Economia Internacional.
De todo modo, o encontro de Buenos Aires deverá consolidar o cronograma negociador já mais ou menos esboçado pelos técnicos dos 34 países-membros.
No que diz respeito à redução das tarifas de importação, sempre o aspecto de mais impacto em qualquer zona de livre comércio, o cronograma prevê que, até novembro, continuarão as discussões sobre os critérios para a derrubada de barreiras tarifárias.
É uma parte mais técnico-burocrática, que "não prejulga a substância das negociações", como diz o embaixador brasileiro em Washington, Rubens Barbosa.
Só no primeiro trimestre de 2002 é que começariam as negociações sobre redução das tarifas.



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