São Paulo, quinta-feira, 01 de abril de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Serra e Dilma, em "rebolation"


Os dois principais candidatos a presidente saem dos cargos procurando acertar os passos do ritmo da marquetagem

OS COMENTARISTAS de futebol costumam dizer que "o time é ótimo, mas por enquanto só no papel" com o propósito de observar que uma equipe tem bons nomes, mas não tem entrosamento ou variações táticas. No papel, as candidaturas de José Serra e de Dilma Rousseff parecem bastante boas. Ou melhor, trata-se de bons nomes.
Se comparados às figuras da geração que pode sucedê-los na política brasileira, Serra e Dilma parecem excelentes, ainda mais se consideradas as personalidades intelectual e politicamente vazias, medíocres ou mesmo chucras dos quarentões e cinquentões que ora estão na fila.
Mas candidaturas não se fazem de nomes apenas. É o que temos, por ora. Ontem foi o dia em que Serra e Dilma se despediram de seus cargos.
Na prática, tratava-se de um dia de lançamento semioficial de suas campanhas à Presidência. O que se viu e ouviu, porém, foi a conversa diversionista de personagens à procura de maquiagem marqueteira. Dilma deu mais uns passos na tentativa de aprender a arte do "rebolation" emotivo-popularesco de Lula.
Fez cara de choro, falou de criancinhas pobres etc. Tudo a fim de desconstruir em público a própria personalidade de política determinada e opinionada, ou autoritária, como dizem inimigos, muitos machistas.
Serra mais uma vez procurou anular sua identidade de político e intelectual incisivos a fim de vender aquilo que, parece, será uma das mensagens centrais de sua campanha. Ou seja, a neutra ideia de que o tucano é governante "testado e aprovado", administrador experiente, "que faz", com a qual vai se contrapor à novata ungida por Lula. Como tem feito, Serra esteriliza seu discurso até matar o último micróbio de teor político e programático.
Pouco sabemos dos grupos de assessores políticos e intelectuais dos candidatos. Seus partidos não têm plataformas. O PT aprovou diretrizes das quais Dilma parece querer distância. A do PSDB inexiste desde que seu grupo intelectual dominante foi ganhar a vida na finança.
Dilma pode ao menos dizer que é a candidata do continuísmo, embora o centro da sua propaganda até agora seja a crítica de um governo findo em 2002. Serra teme dizer que vai "descontinuar" o governo Lula, para recorrer ao eufemismo anglófilo tolo da linguagem de relações públicas. Serra não ousa nem mesmo dizer seu nome, ou seja, repetir o que sempre pensou sobre políticas públicas, em especial econômicas.
O governo Lula quase inteiro foi de paralisia nos aperfeiçoamentos institucionais. O que farão os candidatos a respeito? E de Banco Central, câmbio, educação tétrica, carência de cientistas? Da devastação ambiental somada à inércia burocrática devida a ambientalistas? O que farão de impostos sobre exportações e trabalho? Qual é o limite para o aumento do gasto público, resposta que implica decisões sobre INSS, vinculações orçamentárias ou funcionalismo, e que tem reflexos sobre o crescente deficit externo?
Não se trata de esperar o papelucho anódino que mais tarde será lançado com o nome de "programa".
Ninguém pode se candidatar a presidente sem ter ideias fundamentais sobre temas assim. Mas, até agora, vemos apenas os passos marcados e tolos da "rebolation" marqueteira.

vinit@uol.com.br


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