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São Paulo, domingo, 01 de junho de 2003

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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS

Construção de "outro mundo" é possível e necessária

GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA

Economistas e mesmo autoridades de governo têm insistido, há pelo menos duas décadas, na impossibilidade de uma outra política econômica. A tal ponto essa doutrina impregnou corações e mentes que os descontentes com a globalização, reunidos em Porto Alegre (www.portoalegre2003.org), resumiram suas demandas numa frase direta: um outro mundo é possível.
Ao longo de praticamente todo esse período, semanalmente, tenho feito um esforço para resumir, interpretar, criticar e antecipar tendências. Muitas vezes, vislumbrando essa possibilidade de uma alternativa. Mais frequentemente alertando para obstáculos impostos pela instabilidade global -a começar pelo fracasso do neoliberalismo, resumido na impotência dos Estados para lidar com a incerteza.
Neste momento em que me despeço temporariamente, aproveito para fazer um balanço das tendências apontadas na coluna, especialmente no "curto prazo" (os últimos cinco anos).
Duas merecem destaque. Uma é a emergência da "nova economia", em que a sociedade da informação prenuncia uma economia do conhecimento. Outra é o retorno global da busca por nova "arquitetura financeira".
Há uma razão, em especial, para que o tema da reforma financeira global continue sobre a mesa. É que a onda de hiperliberalização e desregulamentação dos mercados financeiros gerou uma tal volatilidade nas moedas e instabilidade nos fluxos de capitais que, na prática, a capacidade de calcular riscos, sobretudo nos países desenvolvidos, foi praticamente inviabilizada.
Até os indicadores mais puramente contábeis, como os critérios de adequação de capital das instituições financeiras, perderam sentido. A razão de fundo é simples: nesse quadro de incerteza, não há confiança nas medidas de riscos, porque é o risco sistêmico que aumenta de modo imprevisível e irreversível.
Diante do lixo financeiro que se acumula, não resta alternativa aos governos de todo o mundo senão buscar, gradualmente, a reforma de um sistema que simplesmente não tem mais lógica.
Convivem duas tendências aparentemente contraditórias. De um lado, a expansão das redes cria a perspectiva de uma inteligência coletiva, de um salto da humanidade rumo a um estágio de racionalidade, consciência e construtivismo social.
De outro, o campo onde mais se desenvolveu a racionalidade e o cálculo, o sistema financeiro, parece cada vez mais irracional, imprevisível e destrutivo.
A contradição se resolverá porque a incerteza absoluta obriga até mesmo (ou principalmente) os mais sinceros liberais a dedicar esforços e criatividade para criar alguma ordem. É inevitável a reforma dos mercados e a criação de novas bases para a racionalidade financeira.
Simultaneamente, a própria rede de informação global que serviu de terreno para a desregulamentação pode agora servir também como ponto de partida para a identificação de novas práticas de avaliação de riscos e oportunidades econômicas.
É um cenário favorável para a pesquisa e a criação de soluções inovadoras nos dois campos que, como diretor acadêmico do projeto Cidade do Conhecimento, no Instituto de Estudos Avançados da USP (www.cidade.usp.br), vou explorar.
Novas políticas financeiras são possíveis para a construção de um outro mundo. Os leitores interessados em participar desse mergulho no estudo e na reflexão econômica e política sobre as tendências internacionais estão convidados a visitar o site ou mandar um e-mail (schwartz@usp.br).


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