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São Paulo, sexta-feira, 01 de agosto de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

Aposentadoria integral ou contribuição de inativos?




WALDECK ORNÉLAS

Em debate no Congresso Nacional, a proposta de emenda constitucional que institui a segunda reforma da Previdência enfrenta resistências e desinteligências. O governo acertou o foco, centrando as atenções apenas no setor público, para corrigir distorções em relação às quais a emenda 20 não conseguiu o apoio da maioria necessária.
Reconheça-se, por uma questão de justiça, que não está havendo quebra de compromissos por parte do atual presidente da República, que, durante a campanha, enquanto candidato, anunciou que promoveria a unificação dos regimes previdenciários, entendendo-se aqui, como tal, a homogeneização dos critérios aplicados a todos os trabalhadores. A proposta segue esse rumo e, nesse sentido, está correta.
Em relação aos futuros servidores, adota o princípio do benefício básico limitado ao valor do teto do INSS, com fundo de pensão para o que ultrapassar, o que na prática repete a regra constante da emenda 20 com o projeto de lei complementar nš 9, que a regulava.
Estranha é a proposta de reduzir as pensões das viúvas a até 70% do benefício básico. Injusta e perigosa porque, por isonomia, poderá depois ser estendida aos trabalhadores do setor privado...
Na verdade, o êxito ou fracasso dessa segunda reforma da Previdência estará na regra de transição que vier a vigorar, ou seja, na forma como o futuro modelo venha a ser aplicado aos atuais servidores.
A proposta, nesse particular, preferiu criar um critério intermediário, que revoga as regras da Constituição de 88, mas não aplica a integralidade do novo modelo aos atuais servidores ativos. O caminho escolhido enfrenta e equaciona a questão estrutural de substituir as normas da aposentadoria pela última remuneração (integralidade) e da vinculação dos inativos aos ativos (paridade), impondo, adicionalmente, a contribuição ao passar para a inatividade.
É justamente na regra de transição que o debate se concentra, repetindo e demonstrando, ainda uma vez, a mobilização corporativa dos servidores públicos em suas diversas categorias.
Parece-me, contudo, não haver dúvida de que o governo pesou a mão na proposta em relação aos atuais servidores. É que a contribuição dos inativos somente se justifica para ir buscar a contribuição daqueles que se beneficiam da integralidade e da paridade sem haverem contribuído para isso. Na proposta apresentada no governo Fernando Henrique Cardoso, não se modificavam os critérios de aposentadoria da Constituição de 88 para os atuais servidores. Por isso fazia sentido.
Na medida em que a nova regra de aposentadoria para os atuais servidores passa a considerar a média das contribuições vertidas para o sistema previdenciário e o beneficio passa a ser atualizado tendo como referência a preservação do poder de compra -o que é correto-, deixa de se justificar que venham, cumulativamente, a arcar com o ônus da contribuição quando passarem à inatividade.
Nesse caso, a contribuição dos inativos deve ficar restrita apenas àquele contingente de servidores públicos federais, estaduais e municipais que se aposentaram ou geraram pensão sob o regime da Carta de 88, ou seja, até a promulgação da emenda resultante da proposta ora em tramitação.
Vê-se, no entanto, que, diante da greve dos servidores e da manifestação sindical da magistratura, o governo abre as portas para uma negociação que envolveria a preservação dos princípios equivocados e atuarialmente insustentáveis -mesmo com contribuição de 11% ao longo de toda a vida laboral- estabelecidos na Constituição de 88, que é a fonte do problema previdenciário do setor público.
É um caminho equivocado para o entendimento em torno da reforma. O correto é excluir os atuais servidores ativos da contribuição de inativos; do mesmo modo que seria equivocada a elevação do limite de isenção para os atuais servidores inativos, da faixa do Imposto de Renda (R$ 1.058,00) para o equivalente ao valor do novo teto do INSS.
A dúvida que fica é se a negociação ora esboçada envolve o compromisso da contribuição ao passar para a inatividade. O que não pode é deixar de revogar os princípios da integralidade/paridade e depois ficar sem a contribuição dos inativos. Nesse caso não se precisaria de uma nova emenda constitucional. Bastaria ter aprovado o projeto de lei complementar nš 9, ganhando tempo na aplicação de uma regra para os futuros servidores, sem desgaste político, embora também sem resultados fiscais imediatos.
Aliás, além de perda de tempo, maiores custos no presente e no futuro, na medida em que tanto os Estados e municípios como a própria União continuam realizando concursos e incorporando pessoal novo sob as inadequadas regras da Constituição de 88.

Waldeck Ornélas, 58, consultor, foi ministro da Previdência e Assistência Social (1998-2001).

E-mail -
waldeckornelas@uol.com.br

Hoje, excepcionalmente, Luiz Carlos Mendonça de Barros não escreve nesta coluna.


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