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OPINIÃO ECONÔMICA
Continuidade e continuísmo
STEFAN BOGDAN SALEJ
Definitivamente não é
uma prática política brasileira mudar muita coisa quando
mudam os governos. Durante o
processo eleitoral indicam-se
sempre novas atitudes e novos rumos, como base das promessas de
campanha. Em algumas áreas da
economia, no entanto, parece não
haver, por parte dos candidatos,
disposição ou clareza para promover transformações. Isso apesar de os vários segmentos econômicos e a população de modo geral deixarem claro o que querem e
o que não querem mudar.
Alguns temas estão em aberto.
Não estão claras, por exemplo, as
opiniões e propostas dos candidatos quanto às privatizações. Elas
foram boas para o país? Não foram? Como serão de agora para a
frente? E não está suficientemente
claro qual será o papel do Estado
na economia (não se confunda, a
propósito, com "papel do Governo" na economia). Dessa definição vai resultar maior ou menor
grau de privatizações ou mesmo a
revisão das realizadas.
Independentemente do processo ocorrido até agora, estamos
diante de um mundo novo, de situações novas, que precisam ser
consideradas. É o caso do que está
acontecendo com o petróleo e
seus derivados, com as telecomunicações, um setor em profunda
crise em âmbito mundial, com as
concessões nas áreas de transporte e energia. Não se trata de criticar o que se fez, mas de pensar na
necessidade de atualização dos
processos perante novos desafios.
Outro tema que pode ser considerado "batata quente" é a reforma universitária. Não há convergência de opiniões nessa área. Sobram divergências -provavelmente até mais do que no caso da
reforma tributária. Mas ninguém
se esforça para definir pontos comuns. Há muitas declarações e
pouca objetividade. É importante
lembrar que as reformas na área
da educação, neste governo, apenas começaram. Obtiveram algum sucesso, mas estamos longe
de resultados que se sustentem a
longo prazo. A continuidade das
ações nesse campo será fundamental.
Na área social também há pouco compromisso de continuidade. Pouca atenção se dá a alguns
programas sociais bem-sucedidos, por não contarem com organização e poder de pressão, como
há no setor econômico, em especial no financeiro. Quanto a algumas iniciativas, como as da bolsa-escola e médico de família, parece
que não serão interrompidas.
Mas como ficam dezenas de outros programas?
Tivemos um belo exemplo de
programa bem-sucedido, tanto
do ponto de vista social quanto do
econômico, que foi o programa
do leite, no governo Sarney. Acabou porque era do governo Sarney. O governo seguinte não foi
capaz de corrigir os erros eventuais e distorções operacionais do
programa e ter a humildade de
continuar com ele. Resultado: as
crianças carentes perderam um
alimento fundamental para sua
saúde, o setor leiteiro ficou enfraquecido, reduziram-se empregos
e renda no meio rural. Ganhou a
vaidade política.
Há em curso, no Brasil, um programa social que abrange quase
400 municípios, considerado no
exterior como o melhor programa social em execução no mundo, em áreas mais pobres. Trata-se do Projeto Alvorada. Os prefeitos dos municípios envolvidos,
em sua maioria, estão fazendo um
trabalho magnífico de mudança
cultural, com relação às formas de
tratar a questão da pobreza e do
desenvolvimento. O que se vai fazer com esse programa?
Vai virar um novo tíquete-leite?
Vai acabar só porque a maioria
dos eleitores não está nos grotões
beneficiados e não há pressão organizada do mercado financeiro
para que continue? E porque os
empresários que se dizem socialmente responsáveis também não
defendem esses grotões? Seria
uma pergunta bem-vinda nos
jantares fechados e uma oportunidade para muita gente mostrar
que não defende apenas seus cargos e salários.
Muitas outras questões se colocam na ordem da continuidade e
do continuísmo. Seria útil que os
candidatos a todos os cargos eletivos fizessem uma avaliação do
que deve continuar, com melhorias e correções, e do que deve ser
abandonado. Seria mais útil ainda
para o país que todos nós, eleitores, fizéssemos essa avaliação e a
repassássemos aos candidatos
-como já fizeram algumas pessoas e entidades empresariais.
Dar carta-branca ao continuísmo
é, com certeza, pior do que não
dar continuidade ao que se tem
feito de bom neste país.
Stefan Bogdan Salej, 58, é presidente
da Rede Brasileira de Cluster e Competitividade.
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