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VISÃO DE FORA
Do conselho à linha de montagem
MERTON MILLER
²
Neste texto, analisaremos a
forma pela qual o comando corporativo de empresas, em seu
sentido mais amplo, se traduz
em eficiência administrativa no
sentido mais estrito -como ir da
sala do conselho à linha de montagem.
A sala do conselho de uma empresa jamais pode ser negligenciada; eficiência administrativa
não é algo que surja de forma espontânea. Alguém precisa estar
no comando. Alguém precisa dizer que as pessoas que dirigem
uma determinada operação estão tendo um mau desempenho e
devem ser substituídas por executivos melhores. Ou, com um
pouco mais de otimismo, que um
grupo específico de executivos está se saindo tão bem que deveria
receber recursos e responsabilidades maiores.
O mesmo se aplica, evidentemente, ao próprio conselho. No
sistema de comando corporativo
adotado nos EUA e na Inglaterra
as respostas são dadas pelos mercados de ações. A mensagem
transmitida pelas mudanças nos
preços das ações de uma companhia é em parte uma questão do
setor a que a empresa pertence.
Quando há um boom de construção, os preços das ações das
companhias que produzem cimento provavelmente estarão
em alta. É assim que o mercado
sinaliza que mais recursos deveriam ser dirigidos à produção de
cimento. Mas, se todas as ações
de companhias produtoras de cimento, exceto uma, estiverem
subindo, o mercado sinaliza que
a administração daquela companhia deixa a desejar quanto à
realização do pleno potencial da
empresa.
Esse julgamento pode ser pronunciado por acionistas ultrajados ou assumir a forma de uma
tomada hostil de controle acionário por empresas ou investidores externos. De qualquer maneira, o ponto é que, nesse sistema,
tudo, até mesmo o conselho diretivo, tem de enfrentar o teste do
mercado. Há um mercado de comando corporativo, assim como
os há para todas as mercadorias.
Ao enfatizar o sistema anglo-
americano, não quero sugerir
que sua principal alternativa, o
sistema alemão-japonês, dominado pelos bancos, não tem como fazer o julgamento necessário a respeito da eficiência com
que uma empresa esteja sendo
dirigida. Se os bancos são bons e
eficientes, esse sistema pode funcionar razoavelmente bem. Banqueiros treinados e experientes,
afinal, têm certa capacidade de
avaliar oportunidades de negócios e executivos de empresas.
Mas, e se não tiverem? Como
saber se os banqueiros estão trabalhando direito? Não há como:
eles constituem um grupo fechado, que seleciona seus membros e
cerra fileiras quando um erro se
torna público. Os recentes escândalos corporativos na Alemanha
e no Japão, bem como o desempenho relativamente estagnado
de ambas as economias ao longo
dos últimos anos, demonstrou
que esse sistema certamente não
é receita automática de sucesso
industrial.
Mas, embora o sistema anglo-
americano, orientado pelos mercados de ações, seja claramente
melhor, na minha opinião continua em questão como estender
essas vantagens da sala do conselho aos recessos mais profundos de uma organização. Como
podemos dizer se mais recursos
deveriam ser colocados à disposição de uma unidade ou divisão
específica? E como decidir se devemos fechar uma unidade ou
substituir seus executivos? Frequentemente, não há leitura de
preços de ações que oriente decisões nem sobre as divisões importantes, para não falar de subunidades menores. É por isso,
eu poderia acrescentar, que muitos grandes conglomerados norte-americanos vêm deliberadamente estabelecendo divisões inteiras como companhias independentes, que o mercado é mais
capaz de julgar e avaliar. Isso
também ajuda a eliminar uma
das maiores fontes de desperdício nas sociedades industriais, os
chamados "subsídios cruzados";
ou seja, a transferência de fundos dos setores lucrativos de uma
empresa para setores não-lucrativos que tenham poderosos defensores.
Mesmo uma empresa que funcione bem como independente,
porém, por mais disposta que esteja a enfrentar o teste do mercado, deve de alguma maneira
converter o preceito geral em regras específicas para orientar e
avaliar seus executivos nos níveis inferiores. Como fazê-lo
quando não há mercado de
ações que se aplique a esses níveis? A resposta é abordar o problema da maneira como um
mercado de ações avaliaria a
operação se existisse naquele nível.
Obviamente, não há um conjunto simples e geral de receitas a
implementar para realizar essa
tarefa. Mas é surpreendente como basta começar a pensar em
termos de simular o procedimento de um mercado de ações para
que as empresas comecem a ver
(e, portanto, a evitar) grandes
fontes de ineficiência em suas organizações em todo o mundo, como o entendimento incorreto de
objetivos.
Mencionarei dois de meus
exemplos favoritos desse problema generalizado, que gosto de
chamar de "função de critério
imprópria nas decisões delegadas". Alguns anos atrás, caiu o
prédio da prefeitura na cidade
de Smolensk, na antiga União
Soviética. A investigação mostrou que o colapso foi causado
pela instalação de um imenso
candelabro decorativo, que era
muito pesado. E por que era pesado demais? Porque as metas de
produção da fábrica de candelabros que o produziu eram definidas em termos de toneladas de
candelabros ao ano. O gerente
da fábrica tinha todo o estímulo
para fazer cada candelabro tão
pesado quanto possível -o que
ele fez, com os inevitáveis e infelizes resultados descritos.
Exemplos desse tipo eram encontrados em toda parte na antiga URSS, é claro; metas administrativas expressas em termos de
número de unidades produzidas
eram a norma por lá. Mas problemas essencialmente semelhantes quanto a metas impróprias podem surgir para empresas que trabalhem em economias
de mercado.
Um banco em Chicago exigia
que todos os seus supervisores de
agências apresentassem um relatório sempre que os funcionários
precisassem fazer horas extras
(recebendo um adicional de
50%, sob a lei norte-americana)
para eliminar trabalho burocrático atrasado. Executivos espertos, porém, rapidamente aprenderam a evitar esses relatórios e
as críticas que eles provocavam
por parte de seus superiores: eles
contratavam mais funcionários
e, assim, horas extras nunca
eram necessárias. É verdade que
a solução era perdulária e ineficiente. Os executivos apenas pagavam por horas ociosas, em lugar de pagar pelas extras. Mas
horas ociosas não deixam marcas.
Estabelecer metas em termos
físicos pode às vezes fazer sentido
para os operários em uma fábrica, mas jamais para executivos
ou pessoas com poder de decisão.
Mas, apresso-me a acrescentar,
os incentivos perversos e as regras de remuneração vinculadas
a um desempenho malconduzido não estão limitados aos setores de produção. Os imensos desastres relacionados a maus empréstimos que afligiram o sistema bancário japonês podem ser
vinculados, em última análise, à
política das instituições de remunerar os executivos com base no
número de empréstimos realizados, com pouca atenção à probabilidade de pagamento correto
do dinheiro devido.
Casos de incentivos distorcidos
como esses, temo, não são raros
ou excepcionais no mundo dos
negócios. Será que podem ser
completamente eliminados? Provavelmente, não; mas podem ser
conservados sob melhor controle
se forem reproduzidos em miniatura na organização os mesmos
princípios e pressões que as Bolsas aplicam sobre os principais
executivos e o conselho da empresa.
A remuneração e a promoção
não devem depender só de mensurações físicas de desempenho,
mas de quanto valor econômico
está sendo adicionado à companhia. Porque é isso, essencialmente, que as mudanças nos preços das ações causam: alterações
no presente valor de uma empresa com respeito ao seu futuro valor adicionado.
²
Tradução de
Paulo Migliacci
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²
Quem é
MERTON H. MILLER
²
norte-americano, 75 anos, doutor em economia pela Universidade Johns Hopkins, é
professor emérito de finanças da Graduate
School of Business da Universidade de Chicago (EUA).
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