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JOSÉ MÁRCIO CAMARGO
Os custos sociais da Previdência
Mudar a contabilidade da Previdência sem atacar os
problemas de fundo é varrer a sujeira para debaixo do tapete
A DECISÃO de compensar o
INSS pelas desonerações fiscais realizadas por meio da
Previdência é correta, do ponto de
vista contábil, na medida em que
torna as contas públicas mais claras
e transparentes. Entretanto não resolve o problema da Previdência e
assistência social brasileira, que é
uma das mais caras e generosas do
mundo.
O Brasil gasta 12% do PIB com
Previdência e assistência social, tendo 6% de sua população com mais de
65 anos. Países que têm essa proporção de idosos na população gastam,
em média, 6% do PIB com essa função. Além de serem excessivamente
elevados, os gastos com aposentadorias e pensões estão crescendo a taxas insustentáveis. Entre 2000 e
2006, os gastos do INSS aumentaram 150%, enquanto os gastos com a
aposentadorias do setor público aumentaram 99%.
Os elevados gastos com Previdência e assistência social são um problema de justiça distributiva, aumentam a informalidade e inviabilizam taxas de crescimento mais elevadas da economia. Do ponto de vista da justiça distributiva, os idosos se
apropriam de uma parcela duas vezes maior do PIB (12%) do que sua
participação na população do país
(6%). Por outro lado, do total da receita do governo federal com impostos e contribuições, mais de 50% se
destinam a pagar a aposentadorias e
pensões.
O caráter injusto dos gastos previdenciários fica ainda mais claro
quando constatamos que o setor público brasileiro gasta 15 vezes mais
per capita com Previdência e assistência social do que com a educação
fundamental e média, que é o mecanismo mais eficiente de melhorar o
bem-estar de nossas crianças e jovens no futuro.
Esse ponto nos leva à questão do
crescimento da economia. Como
gastamos muito com Previdência e
assistência social, sobra pouco dinheiro para investimentos em infra-estrutura e na educação de nossas
crianças e jovens. Por essa razão, a
qualidade da infra-estrutura e do
sistema educacional brasileiro é baixa, o custo do investimento é elevado e o nível educacional médio da
população continua entre os mais
baixos do mundo. O resultado é que
os ganhos de produtividade são
muito baixos, reduzindo o crescimento da economia.
Outro problema importante é a
generosidade de nosso sistema de
assistência social. Por esse sistema,
todo cidadão brasileiro tem direito a
uma pensão de um salário mínimo
ao atingir 65 anos de idade, desde
que não tenha renda familiar per capita maior que um quarto do salário
mínimo. Em outras palavras, um cidadão que trabalhou na informalidade toda a vida, não contribuiu
com a Previdência Social e decide
parar de trabalhar aos 65 anos -tendo, portanto, renda zero a partir
daí- tem direito à pensão.
Por outro lado, um cidadão que teve um trabalho formal durante toda
a vida, pagando diretamente 10%
desse salário para a Previdência e,
indiretamente, por meio da contribuição da empresa, mais 20% (pois
uma parte -provavelmente toda-
dessa contribuição é efetivamente
paga pelo trabalhador por meio da
redução de seu salário), também terá direito a uma aposentaria de um
salário mínimo.
Se o trabalhador ganha próximo
do salário mínimo, que é a maior
parte da população, o incentivo desse arranjo é claro: ter um emprego
informal, negociar a contribuição da
empresa e incorporá-la ao salário
mensal, não pagar à Previdência e,
aos 65 anos, passar a receber a pensão do sistema de assistência social.
Em outras palavras, aumenta o incentivo à não-contribuição e, dessa
forma, torna o sistema de Previdência Social muito caro para quem
contribui.
Com Previdência Social muito cara e assistência social muito generosa, trabalhadores e empresas têm incentivos para permanecer na informalidade. Por essa razão, mais de
50% da força do trabalho no Brasil é
informal, o que reduz a taxa de crescimento da produtividade e, portanto, da economia.
Mudar a contabilidade do sistema
o torna mais claro e transparente, o
que é um avanço institucional. Entretanto não vai resolver seus problemas fundamentais, quais sejam,
o Brasil gasta uma proporção excessivamente elevada de seu PIB com
aposentadorias e pensões e a Previdência Social é extremamente cara,
em relação à generosidade do sistema de assistência social, o que gera
incentivos à informalidade e à não-contribuição para a Previdência.
O resultado é menos justiça distributiva e menor crescimento econômico. Mudar a contabilidade sem
atacar os problemas de fundo do sistema é varrer a sujeira para debaixo
do tapete.
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO é professor do Departamento
de Economia da PUC-RJ e sócio da Tendências Consultoria
Integrada.
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