São Paulo, Quarta-feira, 03 de Fevereiro de 1999
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PERFIL
Novo presidente do Banco Central é bem visto por analistas por sua passagem pela área externa da instituição
Fraga administrou desvalorização em 91

Juca Varella/Folha Imagem
O novo presidente do Banco Central, Armírio Fraga Neto, que já foi diretor da área externa do banco


CHICO SANTOS
da Sucursal do Rio

Esta não é a primeira conjuntura de desvalorização cambial que o carioca Armínio Fraga Neto, 41, vive como dirigente do Banco Central. Em novembro de 1991, na condição de diretor da área externa do banco, ele administrou uma desvalorização de aproximadamente 15%.
Administrou bem, segundo a visão de analistas daquele momento, a começar pelo então ministro da Economia, Marcílio Marques Moreira. Segundo o ex-ministro, a gestão de Fraga permitiu que o dólar paralelo caísse de um ágio (sobrepreço) de 100% sobre o oficial para um deságio de 5%.
Na época, o governo elevou a taxa de juros real (acima da inflação) para cerca de 40% ao ano e conseguiu evitar que a inflação, já na casa dos 20% ao mês, escapasse completamente do controle.
De acordo com Moreira, a condução de Fraga permitiu que o Brasil tivesse sete meses seguidos de fluxo cambial positivo em US$ 2 bilhões ao mês, formando um "colchão" que deu ao país tranquilidade para atravessar a turbulência do processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello (1992).
Teria sido também esse "colchão", segundo Moreira, a base para que o Brasil formasse as reservas necessárias para criar o Plano Real lastreado em uma âncora cambial que sobreviveu até 13 de janeiro.
A boa condução de Fraga é também ratificada pelo ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas, que não foi contemporâneo do novo presidente na instituição.
Freitas considera Fraga um emérito operador e avalia que ele repetirá agora seu sucesso do passado, especialmente colocando os juros em um patamar definitivo, que dê segurança ao mercado em relação à política monetária do governo.
Lauro Vieira de Faria, editor da revista "Conjuntura Econômica", da FGV (Fundação Getúlio Vargas), não despreza o mérito de Fraga na mididesvalorização de 91, mas ressalta: "Naquela época era mais fácil. Foi só elevar um pouco o patamar da inflação e seguir em frente."
Além de gestor da mídi de 91, Fraga é lembrado na sua passagem pelo BC como o homem que intensificou o processo de desregulamentação dos fluxos de capitais estrangeiros no país e como uma das três pernas do triunvirato que conduziu a bem-sucedida renegociação da dívida externa brasileira.
As outras duas eram o atual ministro da Fazenda, Pedro Malan, e o embaixador Jório Dauster, um dos nomes que foram cotados para assumir o recém-criado Ministério do Desenvolvimento.
O reencontro de Fraga com Malan é particularmente feliz para o ministro, na avaliação do banqueiro Luiz César Fernandes, do banco Pactual.
As idéias liberais de Malan ganham o reforço importante do homem que, por exemplo, criou o chamado anexo 4, que facilitou o ingresso de capital estrangeiro no mercado de capitais brasileiro.
O que é mérito para alguns é mau sinal para a economista e ex-deputada federal pelo PT Maria da Conceição Tavares. Em repouso de uma recente operação, ela disparou no seu estilo cáustico: "Entregaram o galinheiro à raposa".
A crítica é tanto pela atuação liberalizante ao capital estrangeiro de Fraga como por sua última colocação no mercado, nada menos que administrador de um fundo de investimentos de George Soros, o megainvestidor húngaro naturalizado norte-americano.
Como operador de Soros, Fraga teria atuado em mercados que vieram sucessivamente sucumbindo a ataques especulativos, como o México, a Tailândia, a Coréia do Sul, a Indonésia, a Rússia e, muito provavelmente, o Brasil.
Para o economista José Márcio Camargo, que colaborou na formulação de programas do PT, essa analogia com a história da raposa e do galinheiro "é uma visão inocente e desprovida de qualquer sentido". Na sua opinião, é melhor ter ao lado alguém que já trabalhou para o inimigo e que sabe como agir em relação a ele.
Camargo, que foi professor de Fraga na PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) no início dos anos 80, ressalva que Soros não é necessariamente um inimigo do Brasil.
Foi também na PUC-RJ que Fraga teve aulas de economia com Francisco Lopes, o homem a quem agora substitui no BC.
Segundo a economista Elena Landau, amiga do novo presidente do BC desde os tempos do Colégio Santo Inácio, em Botafogo (zona sul do Rio), ambos eram admiradores fervorosos de Lopes.
Landau chegou a ser assistente do ex-presidente do BC na empresa Macrométrica.
Vindo de uma família tradicional de médicos -o pai, Francisco Fraga, foi um dos dermatologistas mais conceituados do Rio-, Fraga sempre quis ser economista e até convenceu a amiga Landau a abraçar a carreira, quando ela pensava em estudar matemática.
Considerado um aluno brilhante, Fraga já assistia a algumas cadeiras de mestrado quando ainda fazia seu bacharelado na PUC.
O doutorado foi feito na universidade de Princeton (EUA), onde sofreu influência do economista William Branson e se dedicou especialmente ao estudo de economia internacional.
O novo presidente do Banco Central é casado e tem dois filhos. É cunhado de outra recente aquisição do governo brasileiro, o economista José Carlos Osório, que acaba de assumir a diretoria da área de privatizações do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
No campo profissional, Fraga e Osório ostentam em comum o fato de terem passado pelo Banco Garantia, recentemente comprado pelo Crédit Suisse First Boston.
Osório, especialista em investimentos, é considerado o organizador do escritório do Garantia em Nova York, onde Fraga se estabeleceu trabalhando para Soros.
Entre os amigos, Fraga é considerado uma boa companhia, exímio contador de piadas. Torce pelo Fluminense, mas o futebol não é seu forte nos esportes. Quem o conhece de perto nos EUA afirma que é um exímio jogador de golfe.
Colaborou Toni Sciarretta, da Sucursal do Rio.


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