São Paulo, sábado, 03 de março de 2007

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NELSON MACHADO

Previdência justa e sustentável

O Fórum Nacional da Previdência Social terá a rara oportunidade de discutir o tema sem pressões

O PRESIDENTE Luiz Inácio Lula da Silva, por meio do decreto nš 6.019, de 22/01/07, criou o Fórum Nacional da Previdência Social, a fim de promover o debate entre trabalhadores, empregadores e governo federal sobre o aperfeiçoamento e a sustentabilidade dos regimes de Previdência Social e sua coordenação com as políticas de assistência social. Trata-se de avaliar o presente e desenhar o futuro da Previdência.
Os obstáculos com que nos defrontamos são enormes. Refirimo-nos, por exemplo, à dinâmica das relações de trabalho, às transformações da atividade econômica, à mudança na estrutura das famílias, aos novos papéis da mulher na sociedade e no trabalho, além de passar pelas transformações demográficas, de forte redução das taxas de natalidade e gradativo envelhecimento futuro da população brasileira.
Esses fenômenos têm ocorrido não apenas no Brasil. Eles alteram o que se convencionou chamar de "pacto de gerações" -o grande acordo social entre as gerações viventes e futuras que dá base a qualquer sistema previdenciário.
O Fórum Nacional da Previdência Social deve ter ampla liberdade para discutir esses e outros temas do longo prazo. Impõe-se, no entanto, destacar alguns pressupostos.
Primeiro, não aceitamos a hipótese de privatizar a Previdência brasileira. A verdade é que não surgiu nada, ainda, no mundo previdenciário, que seja mais flexível e estável do que a divisão de tarefas público-privadas que o Brasil adota hoje: Previdência pública básica, obrigatória, em regime de repartição, com solidariedade, suplementada por previdência complementar privada, voluntária, em regime de capitalização. Esse desenho permite, simultaneamente, gerar uma rede de proteção social ampla e includente e fortalecer o investimento de longo prazo para o desenvolvimento econômico.
Segundo, é preciso reafirmar que, no curto prazo, nos próximos três ou quatro anos, a situação fiscal da Previdência brasileira não fugirá do controle. Há um amplo repertório de medidas de gestão já adotadas e por adotar, que permitirão essa trajetória. O Fórum Nacional da Previdência Social não tem por objeto discutir essas medidas, para as quais entendemos já existir o Conselho Nacional de Previdência Social como instância de diálogo social, que tem nos propiciado, acredito, uma abordagem consistente sobre a gestão.
Terceiro, qualquer proposta deverá respeitar o direito adquirido, isto é, situações em que já se completaram as condições para certo benefício. Além disso, deve-se propor uma transição longa para a implementação de modificações que afetam os atuais trabalhadores.
Estamos convictos de que esses pressupostos conformam o melhor cenário para obtermos uma reforma da Previdência Social que garanta a sua sustentabilidade no futuro. Temos afirmado aos aposentados e aos atuais trabalhadores que podem enfrentar a discussão sem medo, que não é necessário correr para a aposentadoria. A par disso, o debate, sem restrições, do diagnóstico das transformações pelas quais passará a sociedade brasileira nas próximas décadas terá a força, acreditamos, de nos convencer a todos da necessidade de um novo pacto entre as gerações.
Na primeira reunião do Fórum Nacional da Previdência Social, a realizar-se no próximo dia 7, em Brasília, iremos propor que os seus seis meses de trabalhos sejam realizados em três etapas: inicialmente, um diagnóstico; a segunda, para aprofundar grandes temas; e a terceira, para formular propostas.
Dessa forma, o Fórum Nacional da Previdência Social terá a rara oportunidade de discutir as questões previdenciárias sem pressões, com amplo assessoramento de renomados especialistas e em um ambiente em que o interesse coletivo deverá prevalecer na busca de soluções.
Pressões de grupos de interesse por privilégios ou tratamentos diferenciados historicamente caracterizaram a Previdência na América Latina e ajudaram a tornar o gasto social injusto nos modelos de desenvolvimento passados. É preciso construir uma Previdência mais justa e mais sustentável. Nenhuma das duas dimensões pode ser desconsiderada: nem justiça social sem sustentabilidade, nem sustentabilidade sem justiça social. Ao desenhar a Previdência do futuro, há que cuidar de ambas. O Fórum Nacional da Previdência Social é uma oportunidade histórica para discutir como fazê-lo.


NELSON MACHADO,59, é o ministro da Previdência Social.

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