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Palocci afirma que "ou você tem um Banco Central para combater a inflação ou um BC político"
Lula reclama dos juros e descarta bravata
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva voltou a demonstrar forte
desconforto com os juros elevados, durante conversas que manteve com seus companheiros de
vôo de São Paulo para Genebra,
de sexta-feira para sábado.
Desconforto tão grande que Jaques Wagner, ministro do Trabalho e um dos que estavam no vôo,
não se preocupou ontem em pedir a reserva de seu nome ("off the
records", no jargão jornalístico)
para resgatar a velha metáfora de
que a economia brasileira estava
na UTI quando o PT assumiu e, a
partir dela, afirmar:
"Há uma junta médica e uma
junta política. Se a junta médica
quiser estender o tratamento [os
juros altos], pode entrar em choque com a junta política".
Em geral, as lideranças petistas
e/ou do governo são cautelosas ao
falar de juros, exatamente para
preservar a imagem de que o Banco Central é independente e não
toma decisões motivadas por
pressão política.
O ministro do Trabalho rompeu essa praxe, ao conversar com
os jornalistas que acompanham a
viagem do presidente à Suíça, no
jardim da residência do embaixador em Genebra.
Deu claramente a entender que
há um prazo de prudência, além
do qual o "tratamento" causará
um desgaste político que o governo não estaria mais disposto a suportar.
"O nosso compromisso é com
desenvolvimento e geração de
emprego. Se não botar a economia para crescer, vamos frustrar
aquilo que é mais importante no
compromisso dele (do presidente). O compromisso dele não foi
só o de organizar a economia. Para mim, organizar a economia é
ferramenta. Não é objetivo", afirmou o ministro.
Mesmo um dos deputados que
compõem hoje a tropa de choque
do PT no Congresso, o paraense
Paulo Rocha, reconheceu que a
pressão política é cada vez mais
forte.
"Se entrarmos no segundo semestre [com os juros altos], pode
gerar alguma inquietude [política]", disse, enquanto esperava
Lula chegar à sede da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
O segundo semestre começa
dentro de menos de um mês. Significa que há apenas mais uma
reunião do Copom (Comitê de
Política Monetária) para baixar
eventualmente os juros antes do
prazo antevisto por Paulo Rocha.
O próprio Lula reconheceria depois, em improvisada entrevista à
porta da residência do embaixador, que conversa sobre juros "todo dia".
Bravata
Mas, fiel à idéia de que não pode
passar a imagem de que está pressionando o BC, afirmou: "Todos
nós no Brasil entendemos que é
preciso baixar os juros, mas você
não faz isso com bravata. Faz com
passos bem dados no momento
certo".
Depois engatou um rasgado
elogio ao ministro da Fazenda,
Antonio Palocci Filho, sobre o
qual caem as pressões para a queda dos juros. "Eu tenho um ministro da Fazenda em quem confio plenamente. É meu companheiro de muitos e muitos anos.
Muitas vezes tem mais bom senso
até do que eu, é mais equilibrado
do que eu".
O presidente repetiu depois, literalmente, o que dissera na sua
primeira entrevista a jornalistas
brasileiros no Brasil, na semana
passada: a queixa sobre os juros
mais elevados ainda para cheque
especial, cartão de crédito e capital de giro.
Repetiu mais uma vez que "nenhum país do mundo consegue se
desenvolver se as taxas de juros
oferecidas pelo sistema financeiro
ou pelo próprio governo são
maiores do que a taxa de lucro advinda da produção. Como nós
queremos que a produção seja a
razão de ser do nosso país, vamos
trabalhar para isso".
Palocci e pressão política
O ministro Palocci, por sua vez,
já se antecipou à pressão política,
ao dizer que "o Banco Central não
pode funcionar com critérios de
avaliação político-partidários. Ou
você tem um BC para combater a
inflação ou um BC político".
Palocci negou-se a antecipar
qualquer prazo para a redução
dos juros e contraditou os que,
como Jacques Wagner, mencionam a necessidade urgente de
crescimento. "Todos querem
crescimento, principalmente o
governo. O mundo todo quer
crescimento, mas é preciso encarar isso como um desafio, não como um Fla-Flu."
Mas, no sábado, o ministro havia admitido que o presidente fala, sim, sobre a taxa de juros, embora não tenha especificado se a
conversa fora a bordo do avião
que trouxera a comitiva de Brasília.
Segundo Palocci, a cobrança
não é apenas sobre os juros para
os títulos do governo (que balizam os demais) mas também sobre os juros de mercado e sobre o
"spread" bancário elevadíssimo
(a diferença entre o que um banco
cobra para emprestar dinheiro e o
que paga aos que nele aplicam).
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