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São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2003

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Entidade concorda em financiar projetos do governo, mas critica a participação nas privatizações de teles

Fundos não querem mais riscos, diz Petros


Se analisarmos os investimentos [feitos nas privatizações das teles] na data de hoje, não foi bom negócio. A Petros teria prejuízo se vendesse as ações agora



O levantamento inicial indica que poderíamos aplicar de R$ 2 bilhões a R$ 3 bilhões em projetos [para infra-estrutrura] para retorno financeiro em dez anos


ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

Os fundos de pensão ligados às estatais concordam em financiar projetos de interesse do governo como a transposição de rios e a construção de estradas em regiões que não comportam a cobrança de pedágio. Mas condicionam essa participação à garantia de uma remuneração compatível com as metas de rentabilidade patrimonial de seus planos atuariais.
O presidente da Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, Wagner Pinheiro de Oliveira, 41, calcula que a entidade, que tem patrimônio de R$ 19,4 bilhões, poderá investir até R$ 3 bilhões em empreendimentos com prazo de retorno de dez anos. Ele diz que as fundações podem participar como financiadoras, mas não correrão riscos.
Oliveira critica a forma como os fundos entraram nas privatizações das empresas de telefonia no governo anterior. Diz que as fundações pagaram ágio de controle na compra de ações da Brasil Telecom e da Telemar, mas foram afastadas do conselho de administração da Telemar porque a legislação só permite ao acionista participar do controle de uma tele.
Na avaliação de Oliveira, os fundos são juridicamente responsáveis por seus atos, mas, politicamente, a responsabilidade é do governo como um todo. ""A sociedade não desvincula os fundos de pensão de estatais do governo."
A seguir, os principais trechos da entrevista.
 
Folha - Em que condições os fundos de pensão ligados às estatais poderão financiar projetos indicados pelo governo?
Wagner Pinheiro de Oliveira -
Os fundos têm que cumprir as metas de desempenho estabelecidas nos planos atuariais e garantir o pagamento dos benefícios no futuro. Essa é a nossa primeira prioridade e também a do governo em relação ao setor. Podemos investir em projetos de interesse social, desde que sejam aprovados por nossa avaliação técnica e dêem uma rentabilidade superior à exigida nos planos atuariais. No caso da Petros, a meta atuarial é a variação do IPCA, mais 6% ao ano.
Há alternativas de engenharia financeira que viabilizam a participação de fundos de pensão em projetos de interesse social, como a construção de rodovias em lugares que não comportem a cobrança de pedágio.
O governo pode usar recursos orçamentários para remunerar o investimento ou para equalizar taxas de juros. O construtor ou concessionário receberia o financiamento para construir a obra de acordo com as taxas de juros de longo prazo praticadas pelo BNDES. Os fundos de pensão atuariam como financiadores, mas seriam remunerados de acordo com as metas atuariais, acrescidas de um prêmio. A diferença entre uma ponta e outra seria coberta com recursos definidos no Orçamento da União. Com isso, o governo pode ter projetos que requerem grande volume de investimentos, com um desembolso relativamente pequeno.

Folha - De quanto a Petros dispõe para investir nessas obras?
Oliveira -
Estamos avaliando nossa disponibilidade, mas o levantamento inicial indica que poderíamos aplicar de R$ 2 bilhões a R$ 3 bilhões em projetos para retorno financeiro em dez anos.

Folha - O cálculo pressupõe a venda de investimentos já existentes?
Oliveira -
Não. O objetivo é aplicar o dinheiro que entrar em caixa com o resgate normal de títulos financeiros públicos e privados.

Folha - Os fundos vão comprar debêntures das empresas de energia para ajudar a capitalizá-las?
Oliveira -
Ainda não fomos procurados para avaliar esse projeto. Se a debênture tiver garantia e se a remuneração for adequada, não haverá problema. Energia elétrica é um investimento adequado ao nosso perfil. O Brasil teve problemas sérios por conta do apagão, mas vislumbramos uma melhoria significativa do setor.

Folha - Os fundos também financiarão projetos de transposição de rios, tal como previsto no estudo do BNDES?
Oliveira -
A Petrobras entrou em vários projetos de termelétrica e captou recursos na Petros. Ela criou título semelhante a uma debênture que nos garante remuneração pelo IGP-M, mais um prêmio de 13% ano.
Se o financiamento do projeto de transposição do rio for comandado pelo BNDES e ele desenhar condições de investimentos com garantia firme de remuneração adequada, podemos participar como financiadores, como se estivéssemos adquirindo um título federal.

Folha - Como o sr. avalia a participação dos fundos de pensão nas privatizações realizadas no governo Fernando Henrique Cardoso?
Oliveira -
Se analisarmos os investimentos na data de hoje, não foi bom negócio. A Petros teria prejuízo se vendesse as ações agora. Isso se deve às condições macroeconômicas, mas também aos modelos inadequados adotados para os setores elétrico e de telecomunicações. Na minha avaliação, as fundações não poderiam ter adquirido participação acionária em mais de uma empresa de telefonia fixa porque a legislação só permite ao acionista participar do controle de uma tele. A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) afastou os fundos de pensão do conselho de administração da Telemar porque eles também são acionistas da Brasil Telecom. Ou seja, os fundos pagaram o ágio de controle no leilão de privatização, mas são tratados como acionistas minoritários. Além disso, há conflitos em algumas empresas privatizadas que desvalorizam nosso ativo.

Folha - De quem é a responsabilidade por tal situação?
Oliveira -
Juridicamente, a responsabilidade é dos fundos, mas a responsabilidade política acaba sendo do governo como um todo. Embora as fundações sejam entidades de direito privado, sem vínculo jurídico com o governo, a sociedade não desvincula o fundo de pensão de estatal do governo.

Folha - É por isso que muitos temem que o PT use os fundos de pensão de estatais para viabilizar seus projetos no governo.
Oliveira -
Tenho certeza de que o governo não usará nenhum meio para impor investimentos a fundos de pensão. Tenho convicção total a esse respeito. Podemos participar de investimentos que forem apresentados pelo governo à sociedade, se considerarmos que eles valem a pena.

Folha - Quais são os interlocutores dos fundos no governo Lula?
Oliveira -
Se temos alguma coisa a tratar com o governo, a discussão é encaminhada pela Petrobras. Se vamos conversar sobre projetos de investimento, tratamos com o Ministério de Minas e Energia. Cada fundo se relaciona com o ministério ao qual sua patrocinadora está vinculada.



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