São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

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Mercado eleva pressão contra juros subsidiados

Argumento é que taxas inferiores à Selic diluem a ação do BC contra a inflação

Defensores de taxas menores do BNDES e para agricultores afirmam que elas estimulam investimentos, aumentam a oferta e seguram preços

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Com a elevação da taxa básica de juros, aumentaram também as pressões no mercado de crédito para subirem as taxas das linhas subsidiadas para investimentos, como o crédito rural, a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) do BNDES e até o juro do financiamento imobiliário pelo SFH (Sistema Financeiro da Habitação).
Enquanto os juros do Banco Central subiram de 11,25% para 13% ao ano só em 2008, as taxas para o setor rural permanecem congeladas desde junho do ano passado em 6,75%. A TJLP, em 6,25%, já embute um juro real negativo -não cobre a inflação de 6,58% prevista para o IPCA este ano. E o setor imobiliário trabalha com taxas máximas de 12% mais a TR, o menor juro disponível para pessoa física.
Todas essas linhas de crédito têm uma fonte de captação de dinheiro barato, cujas regras foram estabelecidas nos anos 60. O dinheiro emprestado ao setor agrícola, destinado em sua maioria aos pequenos produtores, vem de 25% dos depósitos à vista das contas correntes, que não têm nenhuma remuneração nem para repor a inflação -se os bancos não emprestam, viram depósito compulsório. "É um subsídio bancado pelo sistema. O setor agrícola tem subsídio de 50% nos juros", diz Ademiro Vian, diretor da Febraban.
Os recursos para o SFH são originários de 65% das cadernetas de poupança, que são remuneradas em 0,5% ao mês mais a TR. Já o dinheiro do BNDES vem de 40% do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), com custo de captação de 6,25% da TJLP.

Críticas
Contra os juros abaixo do mercado, o principal argumento dos críticos é o custo cada vez maior assumido por governo, bancos e correntistas. O segundo é que o BC tem um poder de fogo limitado para combater a inflação. Isso porque a política monetária só atinge 70% do crédito brasileiro -o restante é subsidiado.
Só o BNDES empresta R$ 174,3 bilhões com taxas que variam de 4,5% a 9,25% -TJLP mais um "spread" pelo risco do cliente (que pode ser negativo) e uma taxa de administração.
"Se todo o crédito fosse livre, o BC teria mais efeito com sua política monetária. Mas não se espera que o governo diminua isso para ajudar o BC. No caso do BNDES, o máximo que o BC poderia pleitear é um aumento da TJLP", diz Sérgio Vale, economista da MB Associados.
Defensor da TJLP baixa, o ex-presidente do BNDES Carlos Lessa afirma que o direcionamento dos juros para setores estratégicos, como os intensivos em mão-de-obra e ao pequeno agricultor, atacam a inflação pelo aumento da oferta.
"O argumento é que eles [o BC] são obrigados a aumentar muito o juro porque eles não controlam tudo. O que eles querem dizer é que o juro de longo prazo determina o de curto prazo. É o contrário. Se ele empurra a Selic para cima, acaba produzindo uma elevação das taxas de longo prazo. Nunca são as taxas de longo prazo que constroem as de curto prazo no custo do crédito."
Para Domingos Pandeló, professor do Ibmec-SP, a ação do BC tem por objetivo conter o crédito ao consumo, que é mais sensível ao aumento dos juros. "Essas linhas subsidiadas são importantes para o investimento, e não o consumo."
Para o economista Bruno Rocha, da Tendências, o direcionamento dos juros gera distorções na política monetária. "O sistema financeiro mudou muito, e as condições de financiamento, também. É o momento para discutir isso."
"Poderia discutir se fosse para aperfeiçoar essas políticas e torná-las mais efetivas, o que não é o que normalmente esperam os que pedem a revisão. Os juros da TJLP devem ser mantidos ou mesmo reduzidos. É preciso limitar o efeito danoso que o BC exerce sobre a produção e o emprego. Preservar alguma sanidade na política econômica brasileira", diz o economista Fernando Cardim, professor da UFRJ.
Osmar Roncolato, superintendente de financiamentos do Bradesco, ressalta a função indutora de desenvolvimento que o financiamento rural tem desde os anos 60. "As premissas continuam válidas. O Brasil tem uma vocação agropecuária e tem de ter um mecanismo para isso. Há uma parcela importante dos produtores, especialmente os menores, que se utiliza disso. O crédito imobiliário ajudou a construção civil no período de juros altos. Uma hora isso tudo vai ter de ser repensado, mas não sabemos quando ainda", disse.


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