São Paulo, sábado, 04 de julho de 2009

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Mudança deveria vir por acordo, diz professor

NATÁLIA PAIVA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A redução da jornada legal de trabalho de 44 para 40 horas semanais nem deve criar vagas nem distribuir renda no país, diz o professor de relações do trabalho da USP José Pastore.
É que as empresas, quando têm seus custos elevados, partem para medidas compensatórias -como automatização ou alta de preços-, "anulando as intenções" de gerar emprego ou dividir com os trabalhadores os ganhos com produtividade. O caminho para a redução da quantidade de horas trabalhadas não está na lei, mas nas negociações setoriais entre patrões e empregados, afirma o professor, que presta consultoria para a CNI (Confederação Nacional da Indústria).

 

FOLHA - Sindicatos dizem que a redução da jornada estimulará empresas a contratarem. A CNI diz que ela criará obstáculos para isso, já que elevará os custos. Quem tem razão?
JOSÉ PASTORE
- Estamos falando da redução de jornada legal, não da negociada. A negociada pode criar emprego. Num setor, os empregados podem negociar com a empresa uma jornada baixa, porque ela tem alta tecnologia ou boa performance de mercado, por exemplo. Mas uma empresa pequena -em que a mão de obra pesa muito nos custos de produção- não tem condições de arcar com os custos adicionais da redução e vai perder mercado. Por isso, os países do mundo inteiro fixam uma jornada legal alta e jornadas negociadas baixas, por setor. Assim dá para gerar emprego. Mas numa imposição legal, para empresas de setores, regiões e tamanhos diferentes, não há evidência que mostre geração de emprego.

FOLHA - Em 88, com a redução de 48 para 44 horas, houve alta ou queda de emprego e produtividade?
PASTORE
- A lição de 1988 é muito boa. Não houve geração de emprego desesperada. A partir dos anos 1990, houve aumento do desemprego. Por que a conta aritmética não bate com a realidade? Do ponto de vista da aritmética, reduz-se de 44 para 40 horas, tem que contratar 2,2 milhões de empregados. Não bate porque as empresas, quando têm elevação de custo muito forte, como é o caso -vai aumentar em 10% o custo do trabalho e 50% o da hora extra-, as que podem ajustar até já ajustaram. As que não podem vão partir para medidas compensatórias: buscar mais automatização -portanto, não contratam-; reduzir a produção e se acomodar, que foi o que ocorreu em 1988 -e não contratam-; ou contratam, mas passam para o preço. Quando isso acontece, inflaciona e há capacidade menor na economia para gerar emprego. As empresas não são estáticas e anulam as intenções de gerar emprego por meio da redução.

FOLHA - Argumenta-se que a redução da jornada elevaria o salário-hora e, como houve ganho de produtividade nas empresas, nos últimos anos, elas poderiam pagar mais.
PASTORE
- Isso é uma tese geral. Mas você não consegue, por meio de medida legal, ajustar isso aos diferentes ganhos de produtividade que existem nas empresas. Você tem empresas que alocaram os ganhos em três pontos: aumentos reais aos trabalhadores -em vários casos, em muitos setores-; uma outra parte foi para o lucro das empresas, e foi com isso que puderam investir mais; outra parte foi para o consumidor -houve uma redução drástica de preços em cima da produtividade. Uma legislação imposta não tem condições de equalizar essa distribuição. O que é bonito na teoria, na prática, é pelo menos ambíguo.


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