São Paulo, terça-feira, 04 de outubro de 2005

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OPINIÃO ECONÔMICA

Estão fazendo o certo?

BENJAMIN STEINBRUCH

Em uma palestra em Washington, na semana passada, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, falava sobre o sucesso da política brasileira de combate à inflação quando, ao mostrar tabelas e gráficos, sinalizou que a meta de inflação para 2005 seria de 4,5%.
Os brasileiros da platéia não entenderam nada. Ora, 4,5% era a meta original para o IPCA, havia muito ajustada para 5,1%. Imediatamente, o mercado financeiro começou a perguntar: mudou a meta de inflação para o ano?
A resposta veio nos dias seguintes. Ao divulgar o relatório trimestral de inflação, na quinta-feira, o Banco Central confirmou a meta de 5,1%, índice que será atingido com folga. As próprias projeções do BC indicam que o ano terminará com inflação de 5,0%. Nada que seja feito neste último trimestre poderá alterar essa trajetória de inflação -mesmo que haja uma abrupta e improvável redução dos juros. As projeções do BC também mostram que, mantidas as taxas atuais de juros e câmbio, a inflação de 2006 cairia para 3,5%, um ponto percentual abaixo da meta de 4,5%.
Ufa! Finalmente o Banco Central dá a entender que existe espaço para redução dos juros. Mas essa não é a única leitura que se pode fazer desses fatos. Pode-se entender também que o BC exagerou na dosagem dos juros. Ao manter um ciclo de alta da taxa desde setembro do ano passado, contra os clamores até das correntes mais ortodoxas, o BC direcionou a trajetória da inflação para um nível desnecessariamente inferior ao programado. Ou seja, houve excesso de ortodoxia.
Quanto custou essa irresponsabilidade ao país? As perdas totais são incalculáveis. Pode-se ter uma idéia aproximada de um custo direto ao examinar os números da dívida líquida do setor público, cujo total se aproxima de R$ 1 trilhão. Nos primeiros oito meses de 2005, o setor público pagou juros de R$ 105 bilhões. Nos 12 meses até agosto, pagou R$ 150 bilhões. Dezenas de bilhões de reais foram literalmente torrados nesse período. Dinheiro que poderia ter sido usado pelo setor público em finalidades mais nobres, como saúde, educação, saneamento e obras de infra-estrutura.
Mas esse não é o único custo. O juro alto segura o crescimento dos investimentos do setor privado e da produção como um todo. Acresça-se a isso o fato de que o Conselho Monetário Nacional vem mantendo a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) em 9,75% desde abril do ano passado, a despeito da queda forte da inflação e do risco Brasil, o que resulta em custos absurdos para os investimentos no país.
Enquanto os demais países emergentes aproveitam a boa fase da economia internacional e devem crescer em média 6,5% neste ano, o Brasil se contenta com a metade desse índice. Quantos milhões de empregos teriam sido perdidos por esse comportamento da autoridade monetária?
Por fim, os juros excessivos tiveram efeito desastroso na taxa de câmbio. O dólar caiu ao nível mais baixo em quatro anos. Apesar disso, as exportações gerais continuam crescendo -alguns setores, como o de calçados, têxteis, brinquedos etc., foram gravemente prejudicados-, mas poderiam ter crescido muito mais. Quanto isso custou e quanto ainda vai custar para a balança comercial?
A discussão, portanto, deve ir além da questão puramente técnica e entrar pelo campo das responsabilidades. Quem responde pelos prejuízos desse desvio? É óbvio que não se pode cobrar exatidão milimétrica em política monetária. Mas, conhecidas as graves seqüelas do aperto monetário, é perfeitamente razoável supor que a autoridade tenha sensibilidade para conduzir a política de forma que, em caso de desvio, ele seja a favor, e não contra, o crescimento da economia.
O sempre-ministro Delfim Netto, em entrevista ao "Valor", na semana passada, lembrou que está sendo repetido o mesmo erro de 1998, quando o BC derrubou a inflação, mas o câmbio foi supervalorizado e fulminou as exportações. "Estão fazendo uma porcaria", diz Delfim.


Benjamin Steinbruch, 52, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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