São Paulo, quinta-feira, 04 de novembro de 2004

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OPINIÃO ECONÔMICA

O que faltou a Marta Suplicy?

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

No artigo da quinta-feira passada, escrito pouco antes do segundo turno, argumentei que as eleições municipais representavam um sinal amarelo para a reeleição de Lula em 2006. Essa conclusão, que já era evidente e até trivial, tornou-se ainda mais clara depois das derrotas do PT no segundo turno.
Nem todos os resultados foram desfavoráveis para o PT e para os demais partidos da base do governo federal. Longe disso. Mas há diversos sintomas preocupantes para os petistas. Por exemplo: o insucesso bastante generalizado do partido de Lula nas cidades maiores pode estar ligado ao fato de que, nos anos recentes, o aumento do desemprego e a queda dos salários têm sido mais acentuados nas regiões metropolitanas. A política econômica continuísta dos últimos dois anos não deu resposta satisfatória a esses problemas. E essa pode ser a avaliação de muitos eleitores que recusaram o seu voto a candidatos identificados com o governo federal.
Configura-se um cenário em que haverá provavelmente um conflito crescente entre a reeleição do presidente e a orientação da política econômica, especialmente da política monetária. A última ata do Copom, divulgada na quinta-feira passada, constitui uma homenagem fervorosa à insensatez e à insensibilidade típicas das tecnocracias financeiras que dominam o Banco Central do Brasil há muitos anos. Se houve alguma mudança no governo Lula, foi para pior. O radicalismo e a rigidez do BC são agora maiores do que no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. Para encontrar algo comparável, é preciso remontar ao primeiro mandato de FHC, quando um certo Napoleão de hospício comandava o BC.
Mas não é de 2006 ou do BC que pretendo falar (escrevi sobre esses temas em artigo publicado anteontem no site Agência Carta Maior, "Eleições municipais e política econômica", www.agenciacartamaior.com.br/, 2/11/ 2004). Prefiro tratar hoje da eleição na cidade de São Paulo, que me parece emblemática por mais de um motivo, e em especial por um aspecto negligenciado -as pistas que ela nos dá sobre a relação entre a classe política e o povo brasileiro.
A figura mais interessante da eleição paulistana era, sem dúvida, a prefeita Marta Suplicy, alvo preferido de atenções e polêmicas de todo tipo. Compreende-se. Marta é, há muito tempo, um fenômeno midiático e político -e a derrota não lhe retira essa condição. Na política brasileira, insucessos eleitorais nem sempre estigmatizam. Freqüentemente, tornam o derrotado mais conhecido e mais competitivo. A prefeita de São Paulo parece ser, neste momento, um dos nomes fortes para a disputa do governo do Estado em 2006.
Mesmo antes da sua gestão na prefeitura, que foi bem avaliada pela população, especialmente na periferia pobre do município, o carisma de Marta já era perceptível. Assim como duas outras figuras femininas emblemáticas do século 20, Evita Perón e Diana, princesa de Gales, Marta tem qualidades que lhe conferem apelo popular: beleza, elegância, estilo, coragem, espírito de luta. De outro lado, compartilha com elas problemas até certo ponto semelhantes: vida amorosa controvertida e uma relação bastante conturbada com os meios de comunicação.
Muitos políticos e observadores da política, inclusive partidários de Marta, recorrem a esses fatores estritamente pessoais para explicar sua derrota. Ora, a despeito de problemas pessoais semelhantes, Evita e Diana eram, e ainda são, admiradas e adoradas pelo povo, mesmo fora dos seus países de origem. Por que será que a prefeita de São Paulo, com todas as qualidades mencionadas, tendo implementado políticas sociais que são elogiadas até por seus adversários, não conseguiu suscitar adesão comparável? Se tivesse sido capaz disso, ela seria certamente imbatível em qualquer eleição.
O que faltou a Marta Suplicy?
Desconfio de que o problema tenha a ver com o modo como se faz política hoje. Mas o meu espaço acabou. Falei, falei e não cheguei ao que me parece essencial.
Tento de novo na semana que vem.


Paulo Nogueira Batista Jr., 49, economista e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net


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