São Paulo, terça-feira, 04 de novembro de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Mirando Washington


Se não houver clamorosa surpresa nas urnas, Obama será eleito e terá a missão de pilotar o resgate da América

HOJE PODE ser um dia histórico para os Estados Unidos.
Se as pesquisas se confirmarem, a mais rica nação do mundo elegerá pela primeira vez um presidente negro.
O perfil do provável presidente Barack Hussein Obama parece enredo de cinema. Nasceu em Honolulu, no Havaí, filho de um economista queniano e de uma antropóloga americana. Seu pai se separou de sua mãe quando Obama tinha apenas dois anos e, depois disso, morando no Quênia, voltou a ver o filho só uma vez antes de morrer em acidente de automóvel, em 1982.
O menino Barack morou e estudou em Jacarta dos seis aos dez anos, porque a mãe dele se casou com um indonésio. De volta aos EUA, estudou na Universidade de Colúmbia e em Harvard. Formou-se em direito e é casado com uma advogada, também de Harvard. Faz parte da elite americana.
Duas grandes tarefas pesarão sobre os ombros do novo presidente. A primeira será encerrar a participação americana em duas guerras, no Afeganistão e no Iraque, que já duram mais do que as guerras mundiais do século 20. Só no Iraque já morreram 4.000 americanos e outros 60 mil foram gravemente feridos. Como diz o próprio Obama em seu programa, os EUA devem gastar US$ 2,7 trilhões com a guerra do Iraque e suas conseqüências, mas, mesmo assim, estão menos seguros ao redor do mundo e mais divididos internamente.
Se cumprir as promessas de campanha, logo após a posse Obama vai chamar seu secretário de Defesa e pedir para acabar com a guerra. A remoção das tropas do Iraque será feita em 16 meses, de modo que, no verão de 2010, apenas uma força residual permaneça ali.
A segunda tarefa será recuperar a economia americana da pior crise desde 1929. Não se espere nenhuma benesse em matéria de liberalização comercial. Obama é tão protecionista quanto qualquer democrata americano e quer, inclusive, reformar o acordo de livre comércio com o México e o Canadá (Nafta).
Quem tiver o cuidado de consultar o site oficial do candidato verá uma extensa lista de promessas minuciosamente objetivas. Obama promete coisas como aliviar em US$ 1.000 anuais o Imposto de Renda da classe média; isentar de taxação aposentados com renda inferior a US$ 50 mil por ano; acabar com bilhões de dólares em deduções fiscais de empresas que mudam operações para o exterior; investir US$ 150 bilhões em biocombustíveis; indexar o salário mínimo à inflação; e até criar um banco nacional para financiar a recuperação da infra-estrutura com recursos federais de US$ 60 bilhões, numa espécie de PAC americano.
Na semana passada, o "Financial Times" lembrou que o presidente Ronald Reagan disse uma vez que "as nove palavras mais aterrorizantes da língua inglesa são: "I'm from the government and I'm here to help'" (Eu sou do governo e estou aqui para ajudar). Quando Reagan disse isso, já havia começado uma estrondosa onda conservadora que, nas décadas seguintes, iria reduzir temerariamente o papel do Estado até em setores básicos e estratégicos, endeusar o mercado e ajudar a conduzir a economia para o atual ciclo depressivo.
Se as urnas não pregarem uma clamorosa surpresa mundial, Obama será eleito e terá a missão de pilotar o resgate da América num período em que o Estado voltará a ser importante impulsionador e regulador da atividade econômica. Com esperança, o mundo olha hoje para Washington.


BENJAMIN STEINBRUCH , 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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