São Paulo, quarta-feira, 05 de maio de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

COMÉRCIO EXTERIOR

Aumento nas exportações agrícolas do bloco sul-americano não seria desprezível, avalia negociador brasileiro

UE acena com mais US$ 1,7 bi ao Mercosul

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA, EM BRUXELAS

A oferta agrícola da União Européia ao Mercosul, nem toda ela colocada no papel, permitiria que o bloco do Sul aumentasse suas exportações em US$ 1,7 bilhão por ano, conforme cálculos da CNA (Confederação Nacional da Agricultura) e do Ministério da Agricultura.
É pouco ou muito? "É pouco, mas não é desprezível", responde Antonio Donizeti Beraldo (CNA), em frase que, posta no contexto, talvez seja o melhor instantâneo da negociação.
Beraldo é o mais agressivo representante do setor agrícola nas negociações comerciais, cobrando abertura dos parceiros do Brasil, mas cobrando também do Itamaraty que faça concessões em outras áreas (investimentos, serviços e compras governamentais), para obter em troca ofertas mais suculentas tanto da União Européia como dos EUA.
É, portanto, do instinto de Beraldo achar sempre que o outro lado está oferecendo "pouco", mas, para chegar a dizer que a oferta européia não é "desprezível", é porque se trata de fato da única das três negociações em que o Brasil está envolvido em que há avanços e perspectivas reais de um acordo no prazo originalmente acertado (outubro). É um ponto de vista parecido com a da porta-voz para comércio da UE, Arancha González: "A negociação avança, mas lentamente".
Reforça-a, por fim, Marcos Sawaya Jank, responsável pelo Icone (Instituto para o Estudo de Negociações Comerciais), o mais autorizado centro de pesquisas sobre a negociação agrícola, consultor contratado pelo Ministério da Agricultura: "Acho que ou não vai haver consenso ou vão simplesmente fechar um acordo tímido. Mas, ainda que tímido, o acordo União Européia-Mercosul interessa ao Brasil porque é um primeiro passo para um acordo abrangente mais adiante".
Os números também autorizam a avaliação de "pouco", mas não "desprezível": o bloco europeu comprou, só do Brasil, US$ 2,9 bilhões em produtos do agronegócio no primeiro trimestre deste ano, o que dá, portanto, a média de quase US$ 1 bilhão por mês.
Aumentar as exportações em US$ 1,7 bilhão, ainda que dividindo esse extra com os parceiros do Mercosul, seria um avanço pequeno, mas não desprezível.
A divisão do bolo adicional por produtos é esta: carne (a chamada cota Hilton, de carnes nobres), mais US$ 650 milhões; etanol (US$ 281 milhões); frango (US$ 116 milhões); milho (US$ 75 milhões); banana (US$ 8,5 milhões); lácteos, o que abrange leite, manteiga e queijos (US$ 70 milhões).
A conta total, incluindo produtos com valores bem menores, dá US$ 1,267 bilhão, computando apenas o ganho com cotas maiores para a produção do Mercosul.
O restante, para completar o US$ 1,7 bilhão, virá da redução de tarifas ou do que o jargão comercial batiza de "preferências fixas". No caso, se a tarifa de importação européia de um produto "x" é, por exemplo, de 10%, o mesmo produto, vindo do Mercosul, pagaria 5%
Mas a oferta européia poderá ficar ainda menos desprezível hoje, quando deverá ser apresentada a proposta de abertura para os PAPs (Produtos Agrícolas Processados), naturalmente de maior valor agregado.
Por enquanto, os europeus anunciaram apenas o arcabouço de suas concessões: 75% dos PAPs provenientes do Mercosul teriam suas tarifas reduzidas em um prazo de zero a dez anos, ao passo que os 25% ganhariam cotas ou preferências tarifárias. Haveria ainda espaço para reservar indefinidamente áreas consideradas "sensíveis".
De todo modo, não será na reunião, iniciada segunda-feira, do CNB (Comitê de Negociações Birregionais, principal instância técnica da negociação) que os europeus apresentarão sua oferta completa. O mais provável é que ela seja enviada por e-mail para os negociadores do Mercosul apenas no dia 20.
O Mercosul decidiu não esperar todos os papéis europeus para dar um passo adiante na negociação: a partir de hoje, vai solicitar, como é de praxe nas negociações comerciais, que os europeus melhorem as suas propostas.


Texto Anterior: Reajuste: Proposta de Dirceu sofre oposição
Próximo Texto: Panorâmica - Nova estratégia: Petrobras compra ações da Triunfo e volta a ter controle de petroquímica
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.