|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Resgate à Grécia é apenas o começo
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
Momentos de desespero requerem medidas desesperadas.
Depois de meses de dispendiosa postergação, a zona do euro
fechou um enorme pacote de
apoio à Grécia. Ao envolver o
FMI, a pedido da Alemanha, os
países europeus conseguiram
alguns recursos adicionais e
um programa melhor. Mas será
que vai funcionar? Infelizmente, tenho sérias dúvidas.
Duas características do que
foi decidido merecem menção.
Primeiro, não haverá reestruturação da dívida; segundo, será suspenso o requisito de uma
classificação mínima de crédito
para os ativos garantidos pelo
governo grego utilizados nas
operações de liquidez, o que
oferece alguma assistência aos
vulneráveis bancos locais.
Assim, será que o programa é
sensato, quer para a Grécia,
quer para a zona do euro? Sim e
não, em ambos os casos.
Comecemos pela Grécia. O
país já perdeu o acesso aos mercados. Assim, a alternativa a
aceitar esse pacote seria decretar uma moratória.
O país nesse caso deixaria de
pagar os juros sobre suas dívidas, mas teria de reduzir seu
deficit fiscal primário (ou seja,
anterior aos pagamentos de juros) para 9% a 10% do PIB imediatamente. Isso resultaria em
um aperto muito mais brutal
do que aquele que a Grécia aceitou como parte do pacote.
Além disso, uma moratória
traria o colapso do sistema bancário. A Grécia está certa em
prometer mundos e fundos, a
fim de ganhar tempo e eliminar
de maneira mais suave o seu
deficit primário.
Mas é difícil acreditar que a
Grécia venha a ser capaz de evitar uma reestruturação da dívida. Primeiro, presumamos que
tudo corra de acordo com o plano. E que a taxa média de juros
sobre a dívida grega de longo
prazo fique em apenas 5%.
O país precisaria, com isso,
manter um superavit primário
da ordem de 4,5% e dedicar o
equivalente a 7,5% do PIB de
sua arrecadação tributária para
manter o serviço da dívida.
O público grego será capaz de
suportar esse fardo ano após
ano, sem descanso?
A Grécia está sendo solicitada a fazer o que a América Latina fez nos anos 80. Isso resultou em uma década perdida, da
qual os únicos beneficiários foram os credores estrangeiros.
Além disso, já que os credores agora estão sendo pagos para escapar, quem os substituirá? O pacote certamente fracassará em seu objetivo de devolver a Grécia aos mercados,
em termos administráveis,
dentro de poucos anos.
Para a zona do euro, duas lições são claras: primeiro, a escolha é ou permitir moratórias
de dívidas soberanas, por mais
complicadas que sejam, ou
criar uma união fiscal, com forte disciplina e fundos suficientes para permitir o amparo a
economias devastadas.
Segundo, os ajustes na zona
do euro não funcionarão sem
que os países mais importantes
realizem ajustes compensatórios. Se a zona do euro estiver
disposta a viver próxima da estagnação em sua demanda geral, ela se tornará uma arena
para medidas agressivas de desinflação competitiva e dependerá mais dos mercados mundiais como destino para seus
excedentes de produção.
A crise que está em curso
confirma a sabedoria daqueles
que viam o euro como uma empreitada de alto risco. No entanto, agora que a zona do euro
foi criada, é preciso fazer com
que ela funcione. A tentativa de
resgate à Grécia é só o começo
da história. Há muito mais que
precisa ser feito, em termos de
resposta imediata à crise e de
reforma da zona do euro, em
futuro não muito distante.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Texto Anterior: Temor sobre a Grécia se alastra e Bolsas despencam Próximo Texto: Bolsa de SP recua 3,35% com tensão sobre Europa Índice
|