|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PAULO RABELLO DE CASTRO
O galo, a águia e a galinha
O Brasil, que tudo tinha para ser águia, virou galinha, cacarejando no seu próprio quintal, à espera da panela
AS PENOSAS continuam tendo
grande influência em nossas
vidas.
2006 é, certamente, o ano do galo.
O "quadrado mágico" do nosso futebol de fancaria foi trucidado pelo galo francês, no sábado passado. Os vibrantes jogadores da França foram
verdadeiros galos de briga diante da
apatia incompreensível dos celebrados papagaios verde-amarelos. Perder, em si, não foi tão mal quanto a
falta de atitude e de garra do nosso
time.
2007, provavelmente, será o ano
da águia, trazendo desafio complicado para nós. A águia da economia
norte-americana ainda está voando
alto em 2006, num ritmo anualizado de mais de 5%. Porém o nível do
juro básico, lá praticado, não vai parar em 5,25%, o que já seria suficiente para promover um ajuste na sua
demanda interna. O juro norte-americano subirá mais, fazendo a
águia baixar e, eventualmente, pousar. O Fed (banco central dos Estados Unidos) precisa aplicar um freio
ao duplo déficit dos Estados Unidos,
o fiscal e o externo, para uma posição sustentável a longo prazo.
E a galinha? Esta somos nós desde
2001, pelo vôo da galinha do pífio
crescimento brasileiro dos últimos
anos. Aliás, a administração Lula,
em matéria econômica, quer dar de
galo, sempre embalada no discurso
político do presidente, repetindo a
ilusão do melhor futebol do mundo,
dos melhores talentos, das maiores
realizações, que não encontram cotejo nem semelhança com a realidade de galinha do desempenho brasileiro.
Nada, porém, é mais danoso do
que nossa falta de rumo em relação
aos desafios da realidade, tanto na
economia como no futebol, permeada pela apatia e pela falta de compromisso de suar a camisa e verdadeiramente jogar com o time para a
vitória. Os dirigentes brasileiros da
política e do futebol só jogam para a
platéia, com os olhos voltados ao
merchandising televisivo, como se
estivessem permanentemente vendendo uma marca de bebida ou a
abertura de conta em banco.
Na semana passada, ao ouvir o
oportuno pronunciamento do senador Jefferson Peres, no Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social, referia-se ele ao Brasil, econômica e psicologicamente, como sendo um "país sem rumo", sem adequadas referências e diretrizes a
mostrar e balizar seu caminho coletivo. De fato, como dizia o senador
Peres -ao arrematar seu argumento, duro mas verdadeiro-, "dos anos
70 para cá, quando então se comparava a Coréia a um besouro, por não
ter chance de voar, enquanto o Brasil seria uma águia, pronta a desfechar um vôo econômico extraordinário, o que aconteceu foi justamente o contrário do previsto". O besouro coreano virou um condor, alçando um vôo imenso e alto, enquanto o
Brasil, que tudo tinha para ser águia,
virou galinha, cacarejando e ciscando no seu próprio quintal, à espera
da panela.
Passamos as décadas, aqui no Brasil, entretidos com sandices econômicas, como os planos intervencionistas dos anos 80, cujo DNA de controlismo ainda está presente entre
nós, até hoje, por meio da política de
juros altos, contida nas metas de inflação. Praticamos juros de Terceiro
Mundo para tentar manter inflação
de Primeiro.
Cada vez menos, países "sem rumo" poderão almejar alcançar qualquer resultado positivo, que ultrapasse o umbral da mediocridade,
sem haver rejeitado, previamente,
as fórmulas feitas, de qualquer origem, para buscar investigar, em profundidade, as razões principais do
seu atraso crônico e de sua apatia. E,
quando a mediocridade de resultados vem casada com o ufanismo sem
juízo e a propaganda enganosa, a
distância entre a fama e a infâmia se
encurta.
Como na fábula da seleção brasileira de Parreira, vimos a atual administração anunciar o fim da fome
no início do jogo, para terminar com
uma crise agrícola sem precedentes.
A rentabilidade do exportador industrial foi para o chão, mas a renda
dos juros nunca foi tão gorda. Os pobres estão, em média, menos pobres,
porque a classe média se somou a
eles. O país ficou mais igual, porque
classificado e nivelado por baixo. A
galinha que seria águia, depenada,
está indo para a panela.
PAULO RABELLO DE CASTRO , 57, doutor em economia
pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do
Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora
de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria
econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da
Fecomercio/SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias,
nesta coluna.
@ - rabellodecastro uol.com.br
Texto Anterior: Saiba mais: Sem veto, medida custa R$ 7 bilhões Próximo Texto: Lula defende ajuda a menores do Mercosul Índice
|