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São Paulo, domingo, 05 de outubro de 2003

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POLÊMICA

Esse seria o ganho anual da Monsanto, dona da propriedade intelectual do gene RR, com a liberação definitiva do produto

Direito sobre transgênico chega a US$ 100 mi

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Há pelo menos US$ 100 milhões em jogo no debate sobre a liberação da soja transgênica no Brasil. O valor corresponde ao ganho estimado por ano de uma só empresa, a Monsanto. Ela tem os direitos de propriedade intelectual no Brasil sobre o gene RR (Roundup Ready), resistente ao herbicida também fabricado pela empresa.
Há argumentos pró e contra o uso de transgênicos no Brasil. Mas poucas vezes entra em cena no debate o impacto que a liberação teria para a saúde financeira de um grupo empresarial.
Todas as sementes de soja geneticamente modificada desenvolvidas nos últimos anos tanto pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), subordinada ao Ministério da Agricultura, como por empresas privadas são resultado de acordos assinados com a Monsanto, gigante multinacional do setor de biotecnologia. O pagamento de royalties (pelo uso da tecnologia patenteada) é garantido nesses acordos.
O preço da chamada "taxa tecnológica" não foi previamente definido nos contratos e será objeto de negociação entre a multinacional e as empresas responsáveis pela multiplicação das sementes e sua venda aos produtores de soja. Isso acontecerá assim que (e se) a soja transgênica for legalizada em território nacional.
Por enquanto, está liberado para apenas uma safra (a atual, que começa a ser plantada neste mês) o uso de sementes guardadas pelos produtores e cuja origem é ilegal. Para o futuro, o governo estuda um projeto de lei que pode liberar de vez o plantio e a comercialização de soja transgênica.
Mais uma rodada de conversas no governo sobre o destino da biotecnologia está marcada para amanhã, no Palácio do Planalto.
Para calcular o potencial de ganhos da Monsanto no Brasil, a Folha usou a cifra mais baixa de cobrança de royalties apontada pelas empresas produtoras de sementes -US$ 10 por hectare (10 mil metros quadrados). A estimativa leva em conta que os organismos geneticamente modificados poderão alcançar pouco mais da metade da área plantada de soja no país.
De acordo com cálculo divulgado no site da Monsanto, 20% da soja colhida no país é Roundup Ready e esse percentual poderia chegar rapidamente a metade da área plantada. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a safra 2002/2003 contou com 18,4 milhões de hectares de plantações.
Procurada pela Folha, a Monsanto tratou dos valores com os cuidados de segredo de Estado. O porta-voz da filial brasileira, Lúcio Mocsanyi, disse: "A filosofia da Monsanto é disponibilizar soluções de longo prazo para o agricultor de forma que ele detenha a maior parte do retorno".
O pagamento de royalties pode não anular as vantagens econômicas da produção de soja transgênica, mas vai mexer com os ganhos dos produtores -hoje um dos principais argumentos pró-biotecnologia.

Mais cara
No Rio Grande do Sul, por exemplo, onde o lobby dos produtores de soja forçou o governo a liberar a comercialização da safra de soja transgênica até dezembro de 2004, o gasto com as sementes geneticamente modificadas é de R$ 60 por hectare. Elas foram contrabandeadas da Argentina, país que integra, com os EUA e o Brasil, o time dos maiores produtores mundiais de soja. No país vizinho, a maioria das plantações usa transgênicos.
Caso a soja transgênica venha a ser legalizada no Brasil, o custo da semente dobrará, segundo estimativa dos próprios produtores gaúchos. Eles acreditam que a semente geneticamente modificada custará no mercado cerca de 50% a mais do que a semente convencional. Nos Estados Unidos, a semente transgênica custa 56% a mais do que a convencional. Parte da diferença paga a "taxa tecnológica" da Monsanto.
O valor estimado pela Folha para os pagamentos à Monsanto equivale a 20% do faturamento da empresa no Brasil. A multinacional possui no país duas fábricas do herbicida Roundup. Uma em São José dos Campos (SP) e outra em Camaçari (BA).
O herbicida é o carro-chefe da Monsanto, que faturou US$ 4,8 bilhões em 2002, em cerca de cem países. A matriz da empresa fica em St. Louis, cidade do Estado do Missouri, nos Estados Unidos.


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