São Paulo, sexta-feira, 05 de outubro de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Fidelidade ao descaramento


Tucanos e "demos" também incharam sob FHC, com dieta fisiológica. Diferença é que o PT terceiriza a vergonheira

TUCANOS E Democratas, os demos, ex-pefelistas, tornaram-se campeões da fidelidade partidária, agora que a pimenta do troca-troca parlamentar arde nos seus olhos. Querem cassar os parlamentares que mudaram de partido, em geral para comer na mão do governo -ou para mordê-la. Dizem que estão com a lei, devido a uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral, em parte ratificada pelo Supremo. Quanta fidelidade. A idéias? A programas? Fidelidade à cara-de-pau.
A diferença entre os conglomerados tucano-demo e o petista-lulista é de método, apenas. O PT terceirizou o inchaço do governismo por meio de partidinhos de aluguel e outros negócios, evidenciados no mensalão. No primeiro governo FHC, a "base aliada", esse nome ridículo para coalizão governista, contratava parlamentares diretamente. PSDB e PFL embarcavam adesistas e negocistas nas próprias legendas.
Na época se dizia que o PSDB se tornava um partido "omnibus", como o sociólogo Fernando Henrique Cardoso denominara o balaio oposicionista do MDB nos anos 70. "Omnibus", em latim, "de todos" ou "para todos", como FHC explicaria em suas memórias, fazendo troça da tradução escangalhada que a palavra receberia durante seu primeiro mandato, "partido-ônibus".
O PSDB inflou sua bancada de deputados federais em mais de 50% entre a eleição de 1994 e as vésperas do prazo de filiação para a eleição de 1998; o PFL, o segundinho da coalizão, mais modesto, engordou 25%.
Mas agora tucanos e demos batem-se pela lei, no caso a tal decisão do TSE. A lei, ora a nossa lei. A lei, as decisões judiciais e as cortes supremas, nas quais ministros se acusam em público de não terem moral para dizer isso ou aquilo. Os tribunais eleitorais, que levam anos para condenar fraudes eleitorais. O TSE, que tumultuou a eleição de 2006 com ações confusas de seu presidente.
A decisão do TSE mereceu dezenas de argumentos jurídicos tanto a seu favor como contra, a depender do gosto político ou técnico do freguês. Outra decisão confusa e tumultuária neste país de chicanas, jeitinhos e de entulhos legais -o governo FHC quis usar a Lei de Segurança Nacional da ditadura militar contra o MST. Dada a balbúrdia jurídica, quem sabe ainda vigorem partes das Ordenações Filipinas ou do Código Comercial de Pedro 2º.
É evidente que o troca-troca de partidos é uma vergonheira, com raras exceções. Mas qual moralidade ou fundamento político se pretende restaurar com esse apostolado farisaico da fidelidade partidária?
Fidelidade a quê? À turma do "chinelinho" de Renan Calheiros? Aos chefes de quadrilha do mensalão, ainda por aí a mandar e a extorquir cargos? Como funcionaria o tribunal da cassação de mandatos? O pessoal do PSOL achou que estava num PT, o qual porém faleceu com a eleição de Lula e com o mensalão. Saíram do PT. Casos assim acarretariam perda de mandato? Vai haver uma Mesa de Consciência Ideológica? Mais provável é que se criem federações informais de partes de partidos diferentes, acordos ainda mais escusos, sublegendas da fisiologia. O nome dessa balbúrdia jurídico-político-eleitoral é oportunismo, só. Reforma séria, prudente e progressiva? Neca.

vinit@uol.com.br


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