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Brasil vai propor que o G20 coordene controle cambial
Mantega ataca sistema cambial da China, na 1ª crítica brasileira ao modelo chinês
Ministro diz que taxação
de capital externo em
2% está funcionando e que
medida busca conter queda
do dólar, não revertê-la
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES
O governo brasileiro vai propor a seus pares do G20, na reunião deste fim de semana na
Escócia, a discussão de mecanismos coordenados de controle dos desequilíbrios cambiais, que, na avaliação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, ameaçam provocar o surgimento de uma nova bolha.
O desequilíbrio, ao menos no
âmbito do grupo das 20 maiores economias do mundo, está
dado pela excessiva desvalorização do dólar norte-americano e do yuan chinês e pela excessiva valorização das moedas
de Brasil, Austrália, Nova Zelândia e África do Sul, conforme os cálculos que Mantega expôs ontem à Folha.
Tais desequilíbrios geram "o
deslocamento de capitais para
países emergentes que estão
mais fortes e que são exportadores de commodities", na medida em que aplicar recursos
em dólares "não rende nada"
por conta dos juros baixíssimos
nos países ricos.
A análise de Mantega combina com várias outras que têm
surgido nos últimos 30 ou 40
dias, a partir do momento em
que a crise deu uma certa folga
também na maioria dos países
ricos, depois de ter sido bastante controlada nos emergentes.
No caso do Brasil, Mantega
afirma que o país "passou pela
crise a jato" e, por isso mesmo,
"é objeto de desejo dos investidores".
Mas os motivos pelos quais o
mundo conseguiu sair do buraco estão agora provocando
efeitos colaterais indesejáveis,
na forma de "um excesso de liquidez decorrente das medidas
anticrise" (redução dos juros e
pacotes imensos de estímulo).
Há, portanto, conclui o ministro, "uma massa de capitais
que precisa de locais para aplicação".
Essa massa provocou o que
Mantega considera um "overshooting", uma excessiva valorização do real, que, por sua vez,
levou à imposição de um imposto de 2% sobre capital que
entra no Brasil.
Mantega acha que está funcionando, embora considere
que é cedo para avaliação definitiva. De todo modo, mostrou
à Folha um gráfico que apresentará hoje aos executivos
britânicos e europeus aos quais
falará em seminário para "vender" o Brasil. Nele, tanto a valorização do real como a da Bovespa aparecem contidas, mas
não revertidas. Mantega afirma
que o objetivo não era reverter,
mas conter.
A taxação de capitais será
apresentada aos ministros da
Economia e presidentes de
bancos centrais que se reúnem
na sexta-feira e no sábado na
Escócia. É uma das fórmulas
para enfrentar os desequilíbrios cambiais, mas Mantega
admite que "não há resposta fácil" para essa situação.
De todo modo, diz que, "se
houver um conjunto de países
que adote providências, haveria mais eficácia, até porque
ninguém está interessado na
formação de uma nova bolha".
Ao citar o yuan chinês ao lado do dólar, o governo brasileiro está fazendo a primeira crítica à China desde que foi inventada a sigla Bric (Brasil,
Rússia, Índia e China). Mantega chega a citar estudo da firma
financeira Goldman Sachs, já
utilizado nesta Folha por Luiz
Carlos Mendonça de Barros,
para dizer que o real está sobrevalorizado em 50% em relação à moeda chinesa (e ao dólar, além de 45% em relação ao
won sul-coreano).
A crítica é fechada com uma
observação lógica: "É difícil viver em um mundo em que há
câmbio flexível para alguns
países e para outros não", em
evidente alusão à China que
controla o seu câmbio de forma
a mantê-lo praticamente colado ao dólar. Cai o dólar, como
vem caindo no mundo todo, cai
também a moeda chinesa, com
o que a usina de exportações da
China revela um vigor extraordinário.
O ministro diz que não é possível esperar que o próprio
mercado corrija os desequilíbrios, como lhe sugeriram economistas que chama de "liberais". Pode até acabar corrigindo em um dado prazo, "mas até
lá acaba com a indústria brasileira".
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