São Paulo, quinta-feira, 05 de novembro de 2009

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Brasil vai propor que o G20 coordene controle cambial

Mantega ataca sistema cambial da China, na 1ª crítica brasileira ao modelo chinês

Ministro diz que taxação de capital externo em 2% está funcionando e que medida busca conter queda do dólar, não revertê-la

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

O governo brasileiro vai propor a seus pares do G20, na reunião deste fim de semana na Escócia, a discussão de mecanismos coordenados de controle dos desequilíbrios cambiais, que, na avaliação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, ameaçam provocar o surgimento de uma nova bolha.
O desequilíbrio, ao menos no âmbito do grupo das 20 maiores economias do mundo, está dado pela excessiva desvalorização do dólar norte-americano e do yuan chinês e pela excessiva valorização das moedas de Brasil, Austrália, Nova Zelândia e África do Sul, conforme os cálculos que Mantega expôs ontem à Folha.
Tais desequilíbrios geram "o deslocamento de capitais para países emergentes que estão mais fortes e que são exportadores de commodities", na medida em que aplicar recursos em dólares "não rende nada" por conta dos juros baixíssimos nos países ricos.
A análise de Mantega combina com várias outras que têm surgido nos últimos 30 ou 40 dias, a partir do momento em que a crise deu uma certa folga também na maioria dos países ricos, depois de ter sido bastante controlada nos emergentes.
No caso do Brasil, Mantega afirma que o país "passou pela crise a jato" e, por isso mesmo, "é objeto de desejo dos investidores".
Mas os motivos pelos quais o mundo conseguiu sair do buraco estão agora provocando efeitos colaterais indesejáveis, na forma de "um excesso de liquidez decorrente das medidas anticrise" (redução dos juros e pacotes imensos de estímulo).
Há, portanto, conclui o ministro, "uma massa de capitais que precisa de locais para aplicação".
Essa massa provocou o que Mantega considera um "overshooting", uma excessiva valorização do real, que, por sua vez, levou à imposição de um imposto de 2% sobre capital que entra no Brasil.
Mantega acha que está funcionando, embora considere que é cedo para avaliação definitiva. De todo modo, mostrou à Folha um gráfico que apresentará hoje aos executivos britânicos e europeus aos quais falará em seminário para "vender" o Brasil. Nele, tanto a valorização do real como a da Bovespa aparecem contidas, mas não revertidas. Mantega afirma que o objetivo não era reverter, mas conter.
A taxação de capitais será apresentada aos ministros da Economia e presidentes de bancos centrais que se reúnem na sexta-feira e no sábado na Escócia. É uma das fórmulas para enfrentar os desequilíbrios cambiais, mas Mantega admite que "não há resposta fácil" para essa situação.
De todo modo, diz que, "se houver um conjunto de países que adote providências, haveria mais eficácia, até porque ninguém está interessado na formação de uma nova bolha".
Ao citar o yuan chinês ao lado do dólar, o governo brasileiro está fazendo a primeira crítica à China desde que foi inventada a sigla Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). Mantega chega a citar estudo da firma financeira Goldman Sachs, já utilizado nesta Folha por Luiz Carlos Mendonça de Barros, para dizer que o real está sobrevalorizado em 50% em relação à moeda chinesa (e ao dólar, além de 45% em relação ao won sul-coreano).
A crítica é fechada com uma observação lógica: "É difícil viver em um mundo em que há câmbio flexível para alguns países e para outros não", em evidente alusão à China que controla o seu câmbio de forma a mantê-lo praticamente colado ao dólar. Cai o dólar, como vem caindo no mundo todo, cai também a moeda chinesa, com o que a usina de exportações da China revela um vigor extraordinário.
O ministro diz que não é possível esperar que o próprio mercado corrija os desequilíbrios, como lhe sugeriram economistas que chama de "liberais". Pode até acabar corrigindo em um dado prazo, "mas até lá acaba com a indústria brasileira".


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