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CASO AMBEV
Ministro da Justiça é contra a criação de agência no lugar do Cade, defendida por Gesner Oliveira
Fusão da cerveja gera intriga no Planalto
da Sucursal de Brasília
O suposto suborno no processo
de fusão das cervejarias Brahma e
Antarctica acentuou o confronto
que já existia havia alguns meses
entre o ministro da Justiça, José
Carlos Dias, e o presidente do Cade (Conselho Administrativo de
Defesa Econômica), Gesner Oliveira. Além disso, revelou as fragilidades do atual modelo brasileiro
de defesa da concorrência.
O confronto existe devido a
uma disputa de poder pelo controle de decisões bilionárias. Tornou-se público no caso da fusão
Brahma-Antarctica. O negócio, se
aprovado, deve gerar a maior empresa privada brasileira, a AmBev, com faturamento anual acima de R$ 8 bilhões.
Segundo a Folha apurou, interessa a José Carlos Dias aproveitar
o término dos mandatos de quatro dos sete conselheiros do Cade
neste primeiro semestre para nomear pessoas de sua confiança
para o órgão. Um dos quatro conselheiros do Cade que está saindo
é o próprio Gesner Oliveira.
Agência independente
O objetivo de Gesner é convencer o governo de que seria melhor
criar um novo sistema de defesa
da concorrência, com uma agência independente. Isso poderia
permitir ao atual presidente do
Cade permanecer na área, eventualmente presidindo o novo órgão.
O ministro da Justiça é favorável
à criação de uma agência independente, mas não gostaria que o
órgão fosse dirigido por Oliveira.
Por isso, resiste à adoção da mudança neste momento.
No Palácio do Planalto, o presidente Fernando Henrique Cardoso ainda não tomou uma decisão
sobre qual seria a melhor solução
para essa disputa. Na dúvida, prefere manter-se distante da confusão.
O recente caso de suposta tentativa de suborno no Cade ampliou
as divergências entre Dias e Oliveira. O ministro irritou-se porque a informação sobre o assunto
demorou para chegar a seu gabinete.
O advogado e ex-deputado federal do PT paulista Airton Soares
levou a informação do suposto
suborno ao próprio Cade em novembro passado. Disse que não tinha provas, mas que clientes seus
teriam dito ser possível comprar
decisões no Cade, até mesmo no
processo da AmBev.
A informação foi passada para a
conselheira Hebe Romano, do
Cade. Gesner considerou o fato irrelevante, pois Airton Soares recusou-se a dar os nomes de seus
informantes, alegando sigilo profissional. "Não poderia tumultuar
um processo com informações
genéricas e rumores", disse Oliveira.
O caso acabou chegando ao ministro da Justiça. Na semana passada, a Polícia Federal decidiu
abrir um inquérito. Além disso,
recomendou a paralisação da tramitação do processo da AmBev
dentro do Cade.
A Polícia Federal vai ouvir o depoimento dos conselheiros do
Cade, advogados da Brahma e da
Antarctica e de Soares, nesta semana.
O Cade decide na quarta, a pedido do ministro, se é conveniente
continuar com o processo da AmBev, enquanto a PF investiga o
possível suborno.
Processo
Para entender a disputa pelas
decisões sobre defesa da concorrência é importante conhecer o
intrincado sistema brasileiro.
Quando uma ou mais empresas
se fundem e passam a deter 20%
ou mais de um determinado mercado, ou se registram um faturamento acima de um valor estipulado em lei, devem comunicar o
fato ao governo.
A partir daí, o processo passa
por três órgãos distintos até ser
aprovado. O caminho é o seguinte:
1) Seae (Secretaria de Acompanhamento Econômico) do Ministério da Fazenda. Esse órgão é o
primeiro a dar um parecer técnico
analisando os aspectos econômicos da operação. No caso da AmBev, a sugestão foi vender uma
das empresas -a Skol;
2) SDE (Secretaria de Direito
Econômico) do Ministério da Justiça - dá instruções no processo
sobre aspectos jurídicos. Para a
AmBev, sugere que seja vendida
uma das marcas de cerveja, não
especificando qual;
3) Cade - é uma autarquia independente, mas ligada ao Ministério da Justiça. Funciona fisicamente dentro do ministério e dá a
palavra final sobre os processos.
Embora esses três órgãos decidam sobre questões envolvendo
bilhões de reais, contam com uma
estrutura frágil.
Um exemplo da indisposição
entre o ministro da Justiça e o presidente do Cade foi quando o governo brasileiro assinou um acordo de cooperação com o órgão de
defesa da concorrência dos Estados Unidos.
A negociação para esse acordo
foi feita inteiramente por Gesner
Oliveira. Quando a assinatura estava para acontecer, o então ministro da Justiça, Renan Calheiros, foi demitido.
Com a chegada de José Carlos
Dias no ano passado, uma nova
data foi marcada para a assinatura
do acordo em Washington.
Quando marcou sua viagem, o
ministro da Justiça deixou Gesner
Oliveira no Brasil e resolveu levar
consigo apenas o titular da SDE,
Paulo de Tarso Ribeiro, uma pessoa de sua confiança.
(FERNANDO RODRIGUES, MARTA SALOMON E ANDRÉ SOLIANI)
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