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ANÁLISE
O desgaste das periferias
Dominique Faget - 30.dez.2009/France Presse
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O primeiro-ministro espanhol, José Zapatero, em foto obtida por meio de múltiplas exposições
FLOYD NORRIS
DO "NEW YORK TIMES"
Benjamin Franklin disse certa vez, sobre as colônias que viriam a formar os Estados Unidos, que, caso não se mantivessem unidas, seriam enforcadas
separadamente.
Os países que utilizam o euro
agora devem estar imaginando
se não estão diante de uma decisão semelhante. O núcleo
central do bloco de 16 países
-especialmente Alemanha e
França- parece sólido.
Mas alguns dos países na periferia da
zona do euro estão enfrentando profundos problemas financeiros, com alto desemprego,
deficit orçamentários claramente insustentáveis e economias que já não parecem competitivas diante de suas contrapartes europeias.
A maneira pela qual a Europa
escolherá enfrentar os problemas de seus países periféricos,
entre os quais Espanha, Grécia,
Portugal e Irlanda, pode determinar a política futura do continente e o futuro do euro.
Os mercados mundiais sofreram um abalo na quinta diante
de sinais de que os investidores
estavam hesitando em emprestar dinheiro a Portugal. O país
precisou reduzir seus planos
para captação em curto prazo,
algo que a Europa não está
acostumada a testemunhar.
Caso os investidores se afastem ou comecem a exigir taxas
de juros verdadeiramente
exorbitantes, isso colocaria
pressão sobre França, Alemanha e outros países da zona do
euro para que decidam o que fazer então. Resgatarão seus vizinhos encrencados? Ou permitirão moratórias, com fortes repercussões no mundo?
No cerne do problema está o
fato de que a Europa não estava
disposta, há pouco mais de uma
década, a escolher entre unificação e separação. Queria unificação econômica e independência política dos membros.
Em resumo, o continente
queria o melhor dos dois mundos, e por um breve período parecia ter conseguido. Resta
uma opinião generalizada de
que os países periféricos poderiam contar com seus vizinhos
mais prósperos para resgate,
caso fosse necessário.
Mas um resgate como esse,
caso seja empreendido, suscitaria uma questão quanto aos
termos. Até que ponto os países
resgatados se veriam forçados a
abrir mão de sua soberania política? Teriam de reduzir gastos
ou aumentar impostos?
Como
poderiam fazê-lo, ainda que o
desejassem, se os Legislativos
nacionais rejeitassem isso?
Talvez mais importante, como as economias que vêm enfrentando problemas reconquistarão sua competitividade
na Europa?
O Pacto de Crescimento e Estabilidade da Europa, que dita
as regras para a adesão ao euro,
limita as dimensões dos deficit
estatais. O seu objetivo era prevenir o tipo de problema agora
encontrado. Mas ele não oferecia mecanismos de sanção.
A união política não curaria
os problemas econômicos subjacentes, mas tornaria mais fácil a um governo europeu solicitar assistência para as áreas
em crise e implementar leis
continentais, ainda que estas
fossem impopulares.
Mesmo assim, surgiriam
problemas. Nos EUA, há certos
Estados que enfrentam sérios
problemas financeiros. A Califórnia responde por proporção
maior da economia norte-americana do que a Grécia com relação à da União Europeia, mas,
mesmo que houvesse uma moratória estadual, isso não criaria uma crise nacional.
O mundo já tentou obter estabilidade cambial internacional em muitas ocasiões. O padrão-ouro foi uma delas, mas
envolvia reter moedas nacionais separadas cujo valor ante o
ouro poderia ser ajustado. Alguns economistas acreditam
que as taxas de câmbio artificialmente altas foram uma das
causas da Grande Depressão.
O que poderia ser diferente
na atual zona do euro é que os
aspectos legais do sistema não
preveem possibilidade de afastamento. Caso um país optasse
por abandonar o euro, haveria
sérias questões a resolver. Qual
seria a nova taxa de câmbio?
Como seriam tratadas as dívidas denominadas em euro existentes, quer as nacionais quer
as pessoais ou empresariais?
Se fosse necessário pagá-las
em euros, isso representaria
novo choque para a economia
que deixasse o sistema. Se, por
outro lado, um país declarasse
que a dívida seria paga com base em outra taxa de câmbio, de
modo que uma dívida de 100
passasse a poder ser paga em
moeda local, cujo novo valor
seria inferior a 100, a situação pareceria absurdamente
injusta para os credores.
Não existe garantia de que
medidas extremas como essas
venham a ser necessárias, agora ou no futuro. A Europa pode
bem sobreviver aos trancos,
com vagas promessas de mudança.
Mas as previsões otimistas de que os países europeus, diante da impossibilidade de desvalorizar suas moedas, liberalizariam suas economias, para torná-las mais competitivas, provaram-se falsas.
Se o problema do euro virar
crise, porém, 2010 pode se
transformar no ano das fugas
cambiais. Os Estados Unidos e
a Europa estão ambos demonstrando mais irritação diante da
recusa chinesa em permitir valorização do yuan diante do dólar, uma política que torna ainda mais competitiva a economia chinesa.
Os ajustes cambiais não são
panaceia. Desvalorizações
competitivas eram comuns durante a depressão e em nada
ajudaram a economia mundial.
Mas alguma flexibilidade é necessária quando as circunstâncias econômicas mudam. Em
algumas porções críticas da
economia mundial, essa flexibilidade hoje não existe.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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