São Paulo, sábado, 06 de maio de 2006

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TENSÃO ENTRE VIZINHOS

Apesar do tom diplomático conciliador, Planalto decidiu que só aceita reajuste se Bolívia compensar Petrobras

País exigirá mudança em contratos de gás

VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Apesar do discurso mais suave do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo brasileiro já decidiu que não aceitará aumento no preço do gás boliviano se não forem alteradas regras no contrato entre os dois países para compensar a Petrobras. Um exemplo: redução no prazo do contrato, que hoje vai até 2019.
Caso a Bolívia tente algum tipo de aumento unilateral, sem acordo entre as partes, a Petrobras já está orientada a simplesmente fazer o pagamento de acordo com o preço estabelecido no contrato em vigor atualmente.
Outro ponto dado como definido pelo governo brasileiro é que a Petrobras realmente suspendeu qualquer plano de investir na Bolívia e somente retomará algum tipo de investimento no país vizinho se tiver garantia de "retorno".
Segundo a Folha apurou, Lula, ao dizer que a estatal pode continuar investindo na Bolívia desde que tenha retorno, disse de forma "diplomática" o que o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, informou em entrevista na quinta. Na ocasião, ele anunciou a suspensão dos investimentos.
A expectativa do governo é que as negociações durem entre três a cinco meses. Enquanto isso, o Brasil não aceitará pagar a mais pelo gás nem a redução do volume enviado para o país.

Importação de GNL
Na avaliação de técnicos do governo, o aumento do gás pretendido pela Bolívia não é aceitável -passar dos atuais US$ 3,80 para algo entre US$ 5,80 e US$ 6,80 por milhão de BTU (British Termal Unit, medida de energia). Caso o país vizinho insista na sua proposta, o Brasil cogita importar Gás Natural Liquefeito (GNL) de outros países. A Petrobras teria de fazer investimentos para ter condições de, ao receber o gás liquefeito, transformá-lo novamente em gás natural para ser utilizado no setor industrial e veicular.
A importação de GNL seria uma forma de, em primeiro lugar, pressionar a Bolívia a aceitar uma proposta que atenda aos interesses brasileiros. E, em segundo lugar, caso a Bolívia não recue, realmente buscar o gás necessário ao país de outros fornecedores.
Para especialistas, a crise com a Bolívia pode ser uma boa oportunidade para o Brasil investir em GNL e criar mais uma alternativa energética. "O GNL é completamente viável e vem sendo usado em larga escala para geração de energia em outros países", diz Xisto Vieira Filho, presidente da Associação Brasileira de Geradoras Termelétricas e ex-secretário de Energia do Ministério de Minas e Energia (2000-2001).
Segundo Vieira Filho, o GNL poderia ser importado de países como Trinidad e Tobago, Argélia, Malásia, Qatar, Nigéria, Austrália ou Japão e chegaria ao Brasil por um preço entre US$ 5 e US$ 7 o milhão de BTU. Seria necessário, no entanto, que fosse construída estação regaseificadora para transformar o líquido novamente em gás. "O ideal seria construir essa infra-estrutura em um porto da região Nordeste." O investimento custaria entre US$ 300 milhões e US$ 400 milhões.
O Planalto continua acreditando que a Bolívia não terá alternativa senão aceitar negociar o preço com o Brasil, e não impor um aumento simplesmente. A tranqüilidade vem do fato de que o país vizinho não tem outro mercado.
Enquanto negocia com a Bolívia, o Ministério de Minas e Energia já orientou a Petrobras a acelerar seus projetos para exploração do gás natural em reservas brasileiras, como as de Santos e Espírito Santo. Lula não concorda com as críticas de que seu governo foi pego desprevenido pela crise boliviana. Ele lembra que a Petrobras já estava avisada de que deveria acelerar investimentos na área, como a construção de termelétrica bicombustível, e não só a gás.


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