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OPINIÃO ECONÔMICA
Escolha a sua inflação
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O Brasil sofreu muito com a
inflação nos últimos tempos.
Por causa dessa neurose coletiva,
acabou transformando-se na pátria dos índices de inflação. Construímos uma parafernália estatística sofisticada para medir e
acompanhar a inflação. Herdamos desse período índices que
medem a cada semana a evolução dos preços no varejo, como o
da Fipe, em São Paulo, e, mais recentemente, o IPC-S, da FGV do
Rio; temos índices de preços que
são calculados de dez em dez dias,
como o IGP-M da Fundação Getúlio Vargas; temos também, como nos países mais normais, os
índices mensais de preços no atacado e varejo.
Essa estrutura estatística funcionou muito bem durante o período da hiperinflação inercial.
Mas a volta de uma inflação civilizada, a partir de 1999, obrigou-nos a buscar formas diferentes de
mensurar a variação de preços.
Com índices mensais abaixo de
1%, é muito importante separar
os efeitos aleatórios que ocorrem
sobre os preços do que se pode
chamar de uma inflação estrutural. Alem disso, é preciso dar um
tratamento correto aos preços que
têm regras contratuais de reajuste
periódico ou que seguem o calendário civil.
Dou alguns exemplos recentes
para facilitar a compreensão do
leitor. Um aumento de preço
aleatório que nos atingiu foi o dos
derivados de petróleo, em razão
da Guerra do Iraque; já o aumento das tarifas telefônicas, que
ocorrerá em julho, é um caso
exemplar de correção de preços
definido por regras contratuais;
finalmente, o reajuste das mensalidades escolares serve para ilustrar a prática de aumento de preços em função do calendário civil.
Em uma situação de normalidade é preciso, portanto, medir de
forma correta os aumentos de
preços que ocorrem por algum desequilíbrio entre oferta e procura
de bens e separá-los daqueles que
ocorrem por um desequilíbrio de
oferta fora do controle dos agentes econômicos ou por regras estabelecidas externamente ao mercado. Isso é novidade para nós, e
somente a partir de 2000, com a
implantação do sistema de metas
de inflação, é que começamos a
tratar essa questão.
O Banco Central decidiu então,
sem uma reflexão mais profunda
e uma discussão mais ampla com
a chamada sociedade civil, implantar um modelo matemático
sofisticado para fazer essa separação e chegar ao que se chama de
núcleo da inflação. Deixou de lado, certamente por considerá-la
tosca, a metodologia já usada pela grande maioria das economias
desenvolvidas para enfrentar esse
mesmo problema. Nesses países o
núcleo da inflação é obtido simplesmente excluindo-se os aumentos de preços de produtos que
sofrem influências externas incontroláveis. É o caso dos produtos agrícolas e dos derivados de
petróleo, principalmente.
Essa nova medida de inflação
-chamada de núcleo por exclusão- é utilizada pela maioria
dos países para orientar a política
monetária. No Brasil, o nosso sofisticado e matemático Banco
Central usa o mesmo conceito de
núcleo de inflação, mas prefere
trabalhar com o método chamado de médias aparadas para calculá-la.
Apesar do pouco tempo que temos para avaliar essas duas formas de cálculo do núcleo da inflação, já é possível perceber que elas
apresentam resultados conflitantes nos últimos 12 meses. Em 2002,
principalmente no segundo semestre, quando o choque da explosão da taxa de câmbio provocou uma realimentação da inflação, o núcleo calculado pela metodologia do Banco Central andou atrás do núcleo calculado pela metodologia tradicional. Em
outras palavras, a ação de nossa
autoridade monetária era débil
para o quadro real da inflação.
Nos meses recentes o comportamento tem sido o oposto: a inflação medida pelo critério do núcleo por exclusão está caindo, enquanto os números que o BC utiliza para suas tomadas de decisão
mostram uma inflação que não
cai. Portanto as taxas de juros são
superiores às necessárias ao combate à inflação. Não é por outra
razão que a economia real está
derretendo.
Pelo núcleo calculado por exclusão, a inflação mensal média, entre janeiro e março, foi de 1,17%, o
que corresponde a uma taxa
anual de 15%. Em abril esse núcleo caiu para 0,81% (10,2% em 12
meses) e chegou a 0,68% (8,5%
em 12 meses) em maio. A expectativa do mercado é que em junho
ele fique em 0,40%, ou seja, menos de 5% ao ano. Não precisa ser
um economista matemático para
enxergar uma clara e forte redução de queda!
Já os números que saem do modelo do Banco Central são completamente diferentes. Eles mostram que o tal núcleo por média
aparada está estabilizado no período janeiro a maio em 1,13% ao
mês, ou seja, uma taxa anual de
quase 15% ao ano. Daí o discurso
de inércia inflacionária que tem
sido explicitado pelos seus diretores.
Peço ao leitor que defina qual
das duas metodologias é a mais
certa!
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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