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CUSTO BRASIL
Desarticulação política trava projeto de parcelamento de dívidas tributárias e previdenciárias, vital para legislação
Nova lei de falências estréia sob dúvidas
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Empresas e credores represam
pedidos de concordatas e falências à espera da nova lei destinada
a essas operações, que estréia nesta quinta-feira envolta em dúvidas quanto à sua aplicação. O
principal nó está justamente na
maior inovação da lei -a recuperação judicial, substituta da concordata.
A desarticulação política do governo e a crise gerada por denúncias de corrupção mantêm parado, na Câmara dos Deputados,
um projeto sem o qual a recuperação judicial pode se tornar inócua na prática. O texto, ainda por
cima, é tido como equivocado por
especialistas.
De autoria do líder do governo
no Congresso, senador Fernando
Bezerra (PTB-RN), o projeto permite que empresas em recuperação parcelem o pagamento de
suas dívidas tributárias e previdenciárias. Sem isso, avalia-se, a
grande maioria das empresas não
conseguirá apresentar as certidões negativas de débito exigidas
pela Lei de Falências.
"Posso garantir que isso inviabiliza de 80% a 90% das recuperações judiciais", diz o advogado Ricardo Tosto. "Quando uma empresa está em dificuldades, a primeira coisa que ela pára de pagar
é imposto", argumenta.
Para um dos advogados mais
atuantes na área, Thomas Felsberg, na situação atual "as empresas vão acabar pedindo recuperação judicial somente para aproveitar o prazo de 180 dias sem execuções de dívidas, entrando em
falência depois".
O objetivo da recuperação judicial, como o nome indica, é evitar
que empresas viáveis, mas em dificuldades momentâneas, caminhem para a falência, com perda
de investimentos e empregos
-como acontece hoje na maioria
das concordatas.
Para isso, a nova lei estabelece
que a empresa e seus credores
aprovem, em seis meses, um plano de recuperação, com possibilidade de venda de bens e alongamento das dívidas. Faltam, porém, as dívidas com o poder público, costumeiramente as mais
importantes.
Mobilização
Não por acaso, o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) quer
iniciar uma mobilização emergencial dos deputados para votar
o projeto de Bezerra, já aprovado
pelo Senado. Na Câmara, nem sequer está nomeada a comissão
que examinará o texto. Mas os
problemas podem ser ainda
maiores.
Analistas vêem pelo menos dois
equívocos no projeto: o prazo
máximo de seis anos para o parcelamento de dívidas (sete para
pequenas e microempresas), considerado insuficiente, e a pena de
falência para empresas que não
apresentarem as certidões negativas de débito.
As regras foram impostas pela
Receita Federal, para a qual prazos mais elásticos poderiam tornar vantajosa a sonegação.
Estuda-se, no momento, um
prazo máximo de dez anos, mas,
nesse caso, o projeto teria de ir
novamente ao Senado para nova
votação.
Outra possibilidade seria editar
uma medida provisória, o que
permitiria a entrada em vigor
imediata das novas regras. Nesse
caso, porém, o Planalto correria o
risco de aprofundar seu desgaste
com o Congresso, que reclama do
excesso de MPs.
Represamento
Essa não é a única incerteza em
torno da Lei de Falências, sancionada pelo presidente Luiz Inácio
Lula da Silva em fevereiro deste
ano.
O Banco Central, por exemplo,
não sabe se poderá requerer a falência do Banco Santos, hoje sob
liqüidação, pela nova legislação
-considerada ambígua em relação às instituições financeiras.
As inovações previstas, no entanto, são aprovadas por credores
e empresas.
No primeiro quadrimestre do
ano, mesmo com a desaceleração
da economia, os requerimentos
de falências e concordatas caíram
cerca de 35% (veja quadro ao lado) em relação ao mesmo período
do ano passado, num sinal de que
credores e devedores esperam a
entrada em vigor da nova legislação.
Pelos dados da Serasa, empresa
de análise de crédito, foram 3.117
pedidos de falências e 133 de concordatas. Nos primeiros quatro
meses de 2004, os números eram
de 4.728 e 206, respectivamente.
Os números atuais também são
inferiores aos do resto do ano passado, quando a economia teve
crescimento de 4,9%.
Alta prevista
O mercado espera uma alta do
número de requerimentos a partir deste mês, em dimensões ainda imprevisíveis. "Diante do represamento que tivemos, creio
que será um número significativo", avalia Felsberg.
Laura Bumachar, do escritório
Barbosa, Müssnich e Aragão,
também aposta no crescimento,
mas pondera que ele "não será
uma enxurrada" e se concentrará,
a princípio, nas falências. Na recuperação judicial, um instrumento totalmente novo, a imprevisibilidade das decisões judiciais
tende a frear os pedidos.
"Os empresários mais conservadores vão aguardar que outros
ingressem primeiro na recuperação judicial, para a qual ainda não
há jurisprudência [consensos a
partir de decisões judiciais reiteradas]", argumenta Bumachar.
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