São Paulo, segunda-feira, 07 de janeiro de 2008

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Pequeno investidor ousa mais na Bolsa

Especialistas alertam que operações arriscadas costumam dar prejuízo para o pequeno investidor em épocas de crise

Com ganho na Bolsa, pequenos investidores tomam coragem para se arriscar com derivativos e ações de segunda linha

Luiz Carlos Murauskas/Folha Imagem
Recém-formado em economia, Freddy Stenzel ganhou dinheiro ao optar por opções da Petrobras


TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Animados com os ganhos de 91,4% e de 79,71% em 2007 só com as ações PN (sem direito a voto) da Vale e da Petrobras, respectivamente, os papéis mais populares do mercado acionário brasileiro, uma elite de pequenos investidores do varejo da Bolsa, muitos ainda estudantes e jovens profissionais, ganha confiança para vôos mais ousados e arriscados.
Alguns foram estudar análise de empresas e decidiram investir em ações de segunda linha -papéis de companhias pouco negociadas, mas de grande potencial. Os mais ousados começaram a fazer "day trade" (comprar e vender no mesmo dia), "flippar" (entrar em IPO e vender na estréia), negociar opções de ações, índices futuros e derivativos, papéis que não são um ativo em si -ação, título de dívida, imóvel, carro ou boi- mas um contrato derivado (por isso, um derivativo) que isola só o risco de uma dessas aplicações.
Por exemplo, só o risco de não chover num determinado mês, o que determinaria necessariamente um aumento nos preços da soja ou do suco de laranja. Ou a possibilidade de a ação da Petrobras disparar por conta de uma crise política, que eleve o preço do petróleo.
A quem interessa investir nesses contratos? A uma engarrafadora de suco de laranja que não pode expor seu negócio às chuvas ao redor do mundo. A uma refinaria de petróleo que se comprometeu a vender milhões de litros de gasolina a um determinado preço fixo, mesmo que o petróleo duplique. E também a investidores que assumam o risco de que eventos como esse não aconteçam pelo menos até a próxima semana.

Riscos elevados
"É complicado mesmo, mas quem leva a sério [o estudo desses papéis] pode ganhar dinheiro. Só que a maioria perde. Para acertar todas as vezes, tem de ter muita sorte. Tenho alunos que são até melhores do que os profissionais. Então, cria essa sensação de que é possível viver dessa forma. Aplicar na Bolsa não pode substituir o trabalho. Se é bom, gosta e se interessa, então vai trabalhar com isso", disse Ricardo Almeida, professor do Ibmec-SP.
No caso das opções, o investidor paga um prêmio para poder comprar (opção de compra) ou vender (opção de venda) uma ação a um determinado preço. Esse prêmio -o valor do papel que reflete esse direito- é negociado na Bolsa como uma ação, só que com preço inferior. O problema é que ele oscila muito mais do que uma ação.
O bancário Freddy Stenzel, que acaba de se formar em economia, começou a negociar opções no ano passado, após mais de três anos de ganhos apenas com ações de empresas conhecidas no "homebroker" (sistema de negociação via internet).
Stenzel conta que deu sorte negociando opções de Petrobras, no início de novembro, quando a empresa anunciou a descoberta do megacampo de Tupy, na bacia de Santos, e seus papéis PN saltaram de R$ 79,25 para R$ 90,89 em três dias.
Sem saber do megacampo, Stenzel tinha em mãos opções de compra de Petrobras a R$ 80 quando as ações ainda estavam na faixa de R$ 70. Quando as ações dispararam, comprar a opção de compra a R$ 80 passou a ser um dos melhores negócios do ano. Resultado: o preço da opção saltou de R$ 0,24, no dia 7 de novembro, para até R$ 13, no dia 9 -alta de até 5.316% em apenas dois dias. "Vendi antes do pico, mas ganhei mais de 800%. Foi sorte, porque também já perdi um pouco com opções", disse.
Apenas no dia 9, a opção de compra de Petrobras a R$ 80 abriu a R$ 12,01, bateu em R$ 13 e desceu à mínima de R$ 3, encerrando o dia em R$ 5. Ou seja, a pessoa que comprou a R$ 13 e vendeu a R$ 3 perdeu 76,92%.
"Foi um tiroteio! Muita gente ganhou com opções de Petrobras, mas muitas perderam muito", disse Luiz Rogé, economista da CMA Consultoria.
Mentor intelectual dos "calouros" no mundo das opções, o médico Mauricio Hissa, conhecido como Bastter, conta que já perdeu e ganhou muito dinheiro com opções de ações. Para Bastter, o principal erro dos iniciantes é ir com muita sede ao mercado. "Alguns iniciantes têm muita sorte no início e acabam dando um passo maior do que as pernas. A dica é operar com baixos volumes", disse.
O médico praticamente deixou de clinicar para se dedicar ao mercado financeiro. Hoje, administra o site Bastter.com, para ensinar opções e educação financeira. Autor de "Investindo em Opções", da coleção Expomoney, Bastter afirma que com o irmão "quebrou a cara" na primeira vez em que investiu em opções. "Acreditávamos que iríamos vencer o jogo. Durante algum tempo acertamos, mas depois devolvemos tudo e muito mais. E lá se foi parte do meu capital. Foi aí que decidi que teria de aprender direito esse negócio de opções. As opções têm a capacidade incrível de envolver sua vida com um monstro. O indivíduo acha que está operando opções, mas são as opções que estão operando a vida dele", disse Bastter.
Almeida, do Ibmec-SP, conta que vários de seus alunos "complementam a mesada" dos pais negociando ações pela internet. "Estou preocupado com esta geração que nunca viu uma crise na Bolsa. Quem tem 19 anos hoje, como meus alunos, nunca pegou uma crise séria. Na época bolha da internet [em 2001], eles tinham 13 anos. A Bolsa sobe há cinco anos, o que é inédito. Dificilmente isso perdurará indefinidamente."


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