São Paulo, domingo, 07 de fevereiro de 2010

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Crise da dívida é o 1º grande teste do euro

Dificuldades enfrentadas por Grécia, Portugal, Espanha, Irlanda e Itália põem à prova a união monetária, criada há 11 anos

O euro perdeu quase 6% de valor frente ao dólar; analistas veem risco para o sistema bancário caso um dos 16 países deixe o bloco

LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

O despertar do mercado para a crise da dívida na Grécia, em Portugal, na Espanha, na Irlanda e na Itália fez mais do que derrubar títulos desses países e balançar seus governos. O que está à prova é o euro e o conceito de moeda comum em si.
Economistas já se alinharam dos dois lados para examinar até que ponto é possível uma união monetária abarcando 16 países com finanças tão díspares. De consenso, o único que emergiu é que a turbulência atual é o maior teste da moeda em seus 11 anos. Em um mês, o euro perdeu caiu quase 6%.
As regras da União Europeia impõem o teto de 3% sobre o deficit público. O limite é sempre desrespeitado pelos mais ricos (na Alemanha, o deficit deve ir a 6,5%). Mas virtualmente não há dúvida do pulso do governo ou de sua solvência.
Já em quatro dos países em questão o deficit paira em 10% -12,7% na Grécia- e a credibilidade dos governos rareia. Sem margem para moldar a política monetária, nas mãos do Banco Central Europeu, é na capacidade de enxugar as contas que se ampara o dilema. Para voltar aos trilhos e dissipar a histeria do mercado, Atenas, Lisboa e Madri propuseram pacotes fiscais austeros, com cortes drásticos em seus Orçamentos.
O teste do euro mora exatamente no resultado dessas promessas e, sobretudo, na reação dos demais integrantes do bloco caso elas fracassem.
Embora as economias mais fracas tenham recebido injeções de dinheiro, Maastricht veta operações-resgate da UE. Caso um desses governos se mostre inábil, empréstimos e crédito teriam de vir de um governo específico ou do Fundo Monetário Internacional.
Eliminar pela raiz o problema não está em questão. Maastricht não permite a expulsão de um país da zona do euro.
A escolha de deixar a união monetária caberia ao próprio governo -e, como defende relatório do banco suíço UBS, a possibilidade é quase nula se levado em conta que os correntistas poderiam sacar depósitos em euro antes da mudança.
Boa parte dos analistas defende que, em último caso, os vizinhos acorreriam. Mas a operação não deixa de ser delicada, pois exigiria dos governos capital político alto para explicar aos contribuintes por que estão pagando a conta do vizinho perdulário -fantasma que ronda o euro desde 1999.
Ademais, será preciso certificar de que o saco tem fundo, sob pena de criar uma bola de neve que ponha abaixo a união monetária. "Nada iria incentivar mais os gastos despudorados do que a consciência de que outros países estarão lá para intervir", diz a revista "Economist", que chama a Grécia de "não-merecedora" citando vários problemas de governança.
A outra opção, o FMI, pode ser mais prática na visão dos economistas, por se tratar de um organismo bem estabelecidos e um chicote poderoso para colocar Atenas na linha. Mas é vista pelos países do euro como um atestado de que não deram conta de resolver os próprios problemas. Com a cotação geopolítica em baixa, moral não é um fator a desprezar.
Outra questão por responder recai nos estímulos fiscais adotados durante a fase aguda da crise. "A recuperação da Europa é a mais anêmica, e tem de lidar com a retirada dos estímulos, o que reduzirá seu crescimento", escreve Sebastian Mallaby, diretor do centro de estudos geoeconômicos do Council on Foreign Relations. "Mesmo sem retirá-los, só a falta de confiança nos governos por conta dos deficit já vai minar o crescimento. Logo, a Europa não tem opção senão apertar o Orçamento dessas economias."
Mallaby lembra que o consumo será afetado -a taxa de poupança europeia já voltou a subir. "Isso é ruim para o crescimento em qualquer lugar. A resposta pode ser o BCE agir mais agressivamente e rever o plano de retirar os estímulos."


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