São Paulo, domingo, 7 de fevereiro de 1999

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MERCADO TENSO
Papéis das empresas exportadoras são premiados, enquanto os das companhias endividadas são punidos
Real fraco muda as apostas na Bolsa

RICARDO GRINBAUM
da Reportagem Local

O mercado financeiro já definiu suas apostas para o ano de 1999. Com a desvalorização do real, ganham principalmente as empresas exportadoras ou que têm o preço de seus produtos fixados em dólar. Os maiores perdedores são os que têm dívidas em moeda norte-americana ou dependem muito do mercado interno.
Pode-se tirar essa conclusão a partir de um estudo feito pela consultoria Economática. A Economática mapeou os resultados das ações mais negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo, de 12 de janeiro, véspera da desvalorização do real, a 4 de fevereiro.
Das 68 empresas analisadas, 19 apresentaram valorização em dólar. Ou seja, o preço das ações subiu o suficiente para compensar as perdas com a desvalorização do real e ainda apresentar ganhos levando-se em conta o valor fixado em moeda norte-americana.
Alguns ganhos foram bastante expressivos: as ações da empresa produtora de papel e celulose do grupo Votorantim (VCP) subiram 45,68% em menos de um mês. Se o preço da empresa fosse calculado pelos papéis que negocia na Bolsa, o valor da VCP teria saltado de US$ 341,6 milhões para US$ 497,7 milhões desde o dia 12 de janeiro.
A maioria das empresas negociadas na Bolsa, porém, perdeu valor. Das 68 ações analisadas, 49 caíram. A maior perda foi registrada nas ações da Cerj, a Companhia Elétrica do Rio de Janeiro, que desvalorizaram 53,46%. O preço da empresa na Bolsa caiu de US$ 421 milhões para US$ 196 milhões.

Pânico
Há uma lógica por trás das movimentações do mercado financeiro. Os investidores estão premiando as empresas que terão aumento de receita com a desvalorização porque exportam ou porque o preço de seus produtos é vendido no mercado interno, mas com preço fixado em dólar.
Entre as 19 empresas que se valorizaram, sete vendem minério, aço ou papel e celulose. Outras oito são companhias de telecomunicações, mas, nesse caso, a valorização ocorreu como resultado do pânico no mercado financeiro.
"O medo do calote nos investimentos em renda fixa levou muitos investidores a aplicar em ações, principalmente nas de telecomunicações, que são muito negociadas", diz Mauro Cunha, analista da administradora de recursos Investidor Profissional.
Entre as empresas que sofreram maior desvalorização, a maioria tem dívida em dólares e a receita fixada em reais. Ou seja: terão de arrecadar mais reais para honrar seus débitos em dólar, num ano de pesada retração econômica.
Nos cálculos de Tomas Awad, do banco Patente, a Light tinha US$ 1,3 bilhão em dívidas sem proteção, ou seja, com contratos que garantissem o direito de compra de dólares na antiga cotação. A desvalorização trouxe um acréscimo de R$ 500 milhões na dívida da empresa, cujos papéis caíram 40,58% desde 12 de janeiro.
Um estudo do banco Patrimônio mostra o peso da oscilação do real nas vendas e na dívida das empresas. Uma das empresas mais claramente beneficiadas pela desvalorização é a Aracruz.
De acordo com o levantamento, 93,3% dos ganhos da Aracruz são cotados em dólar e, portanto, devem aumentar. Em contrapartida, apenas 5% dos custos de produção da empresa são em moeda norte-americana.
A conta poderia ser ainda mais favorável para a siderúrgica de Tubarão (CST), que tem 97% de sua receita em dólar. Mas 40% de seus custos de produção também acompanham a cotação do dólar. "O desempenho das empresas vai depender do impacto da desvalorização. Quem depende apenas de receita em reais vai sofrer mais porque haverá retração na economia", diz Victor Moraes, diretor do banco Patrimônio.



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