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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Brasil se aproxima de modelo econômico darwinista
GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas
Darwinismo e capitalismo sempre tiveram algo em comum. Isso
fica mais evidente nos momentos
de crise. Mas o darwinismo econômico adquire hoje requintes de
mistificação, pois os países mais
pobres e periféricos estão sendo levados a adotar modelos econômicos cruéis por uma elite global que,
nas horas vagas, teoriza sobre a
"terceira via" (caso do presidente
Clinton).
Darwinismo é deixar o sistema
econômico operar livremente, esperando que ocorra uma seleção
natural dos indivíduos, empresas,
classes sociais, moedas e países
mais fortes ou com maior capacidade de adaptação.
Houve momentos, desde o século 19, em que se tentou evitar ou
compensar essa tendência ao darwinismo. A rigor, sempre se procurou uma "terceira via" (caminho intermediário entre o liberalismo total e o controle máximo
por meio do Estado).
No atual momento, o darwinismo liberal ganha terreno exatamente onde está em jogo a soberania dos Estados: a moeda. Enquanto não houver mudanças no sistema financeiro internacional, valerá o império dos mais fortes.
Esse é o tema de Ethan B. Kapstein num artigo publicado na última edição do "World Policy Journal" ("A Global Third Way, Social
Justice and the World Economy").
O exemplo mais cristalino de
crueldade globalizante vem do século 19: o padrão ouro.
O sistema era uma camisa-de-ferro que reduzia a quase zero a
possibilidade de os governos adotarem políticas econômicas consideradas irresponsáveis pelos banqueiros da city londrina. Mas, ao
mesmo tempo, tornava igualmente impossíveis políticas sociais capazes de ao menos minimizar o sofrimento de trabalhadores e excluídos em geral.
Nos termos de Kapstein, o mecanismo econômico do padrão ouro
era "simples e cruel".
Quando os países ficavam com
suas contas externas desequilibradas, não tinham escolha senão cobrir seus compromissos externos
com suas reservas em ouro. A "exportação" de ouro exigia uma elevação das taxas de juros no país
afetado (com menos reservas, o
país tinha de entrar numa dieta,
pois não teria como importar
mais). A taxa de câmbio, por definição, ficava estável.
Os juros mais altos poderiam até
estimular alguns investidores a depositar seus recursos no país, ajudando assim a recuperar as reservas. O efeito combinado da atração
de reservas e da redução de importações conduziria o país, em tese,
de volta ao equilíbrio em suas contas externas.
Os efeitos desse modelo sobre as
empresas e trabalhadores de cada
país eram terríveis. O desemprego
tornava-se crônico, enquanto os
economistas afirmavam que tudo
não passava de um aperto temporário. No longo prazo, alcançado
novamente o equilíbrio, viria a
prosperidade.
Sem redes de proteção social,
tornaram-se clássicas as cenas de
fome em massa e movimentos revolucionários de todas as estirpes e
inclinações. Kapstein cita o ministro das Finanças da Rússia que declarava, em meio à fome dos anos
1890: "temos de exportar trigo,
ainda que estejamos mortos".
Poucas décadas depois, a República de Weimar, na Alemanha, sucumbiu às pressões financeiras externas em meio a uma ameaçadora
recessão interna. Nesse caso, o
oportunista que levou a melhor
chamava-se Adolf Hitler. Talvez
não seja por acaso que ele tenha
apenas reafirmado uma alucinada
variante da ideologia de sobrevivência dos mais fortes.
Curiosamente, depois da guerra
houve acordo em torno da criação
de uma instituição cuja missão seria evitar ajustes tão cruéis, o FMI.
Mas, com o tempo, os seus empréstimos de emergência passaram a incluir receitas de política
econômica muito semelhantes
àquelas que supostamente funcionavam sob o padrão ouro.
Kapstein lembra que a prioridade agora deveria ser a imposição
de disciplina aos capitais altamente móveis que circulam pelo mundo, de preferência obrigando-os a
pagar mais impostos para financiar a criação de novas redes de
proteção social. O FMI, por enquanto, faz exatamente o oposto:
impõe disciplina e aumento de impostos aos países desequilibrados,
enquanto o cassino darwinista
continua operando a todo o vapor.
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